Rússia se une à China e critica acordo nuclear dos EUA com a Coreia do Sul

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O governo da Rússia uniu-se ao da China e criticou duramente o acordo nuclear anunciado nesta semana entre os EUA e a Coreia do Sul que mira conter militarmente a ditadura de Kim Jong-un no Norte.

Pyongyang é aliada de Moscou e Pequim, fiadoras do norte comunista na guerra contra o sul capitalista apoiado por Washington na península, que a deixou dividida num armistício que nunca virou pacto de paz.

“Esse desenvolvimento é desestabilizador em sua natureza e terá sérias consequências negativas para a segurança regional, impactando a estabilidade global”, afirmou em nota a chancelaria russa.

Para a pasta, o acordo “não traz nada além de uma escalada de tensões” e pode provocar “uma corrida armamentista” na região. Na quarta (26), o presidente Joe Biden e seu colega sul-coreano, Yoon Suk-yeol, anunciaram uma expansão da aliança militar que prevê a instalação de um grupo conjunto para decidir o emprego de armas nucleares contra a Coreia do Norte em caso de ataque por parte da ditadura.

O tom de ambos foi francamente belicista, com o americano prometendo “o fim do regime” caso Kim use bombas atômicas contra o Sul. Yoon, por sua vez, disse que não há mais espaço para “boa vontade”.

Também nesta sexta-feira, Pyongyang quebrou o silêncio. Kim Yo-jong, irmã do ditador norte-coreano que atua como uma espécie de porta-voz de declarações do tipo, afirmou que o acordo entre Washington e Seul vai piorar a insegurança na península coreana.

Ela acrescentou que seu país está convencido de que deve ampliar a “dissuasão de guerra nuclear”. Há ainda o temor de que Pyongyang pretenda fazer uma ação mais chamativa, com um ensaio ousado de mísseis ou mesmo um teste nuclear —o país já explodiu seis artefatos, sempre com potência e sofisticação crescente, de 2006 a 2017.

O acordo prevê mais cooperação tecnológica —a Coreia do Sul é um dos principais produtores de chips avançados do mundo, ao lado do líder Taiwan. Os EUA não posicionarão armas nucleares táticas em solo sul-coreano, como ocorreu na Guerra Fria, e Seul prometeu não buscar desenvolver a bomba.

A primeira sinalização pública do acordo será o envio em breve a um porto sul-coreano de 1 dos 14 submarinos da classe Ohio americana, a perna marinha da tríade de ataque nuclear de Washington.

Uma embarcação dessa não é vista na Coreia do Sul há 40 anos, justamente para não melindrar chineses e norte-coreanos. O submarino, que tem propulsão nuclear, pode levar até 20 mísseis Trident 2, e é capaz de transportar até 14 ogivas atômicas.

Na quinta (27), foi a vez de a China protestar contra o pacto, em termos semelhantes aos dos russos. Numa demonstração de como a questão coreana se inseriu de vez no contexto da Guerra Fria 2.0 entre Washington e Pequim, que já abarca a Ucrânia, foram os atores principais que fizeram as queixas até aqui.

Desde que a aproximação com os EUA fracassou após três encontros entre Kim e Donald Trump, em 2018 e 2019, o isolamento da Coreia do Norte preocupa aliados ocidentais. Depois de um período de relativa calma, ao lidar com a pandemia de Covid-19, o país iniciou uma campanha agressiva de testes de mísseis.

Neste mês, lançou pela primeira vez um míssil intercontinental com combustível sólido —o que o faz ser mais rapidamente acionável, dado que não precisa ser abastecido. Kim também visitou um laboratório com novos tipos de alegadas bombas miniaturizadas, adequadas para serem instaladas em mísseis.

O Japão está particularmente incomodado, dado que os mísseis sobrevoam a ilha de Hokkaido, no norte do arquipélago. O país já mudou sua filosofia pacifista e entrou em modo militarista com novas prioridades e maior gasto com defesa e agora aproxima-se mais da antiga rival Coreia do Sul para, em conjunto com os EUA, fazer frente às ameaças percebidas.

Esse sistema de alianças é evidenciado também pelo Quad, grupo que une EUA, Índia, Japão e Austrália, e pelo Aukus, pacto militar entre americanos, australianos e britânicos. Pequim, por sua vez, tem escalado a cooperação bélica com Moscou, e os países agem em conjunto em patrulhas aéreas e navais no Pacífico.

IGOR GIELOW / Folhapress

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