SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O aposentado Hamilton Parise Filho, 63, trata de um tumor cerebral desde fevereiro de 2022, quando teve recidiva da doença. Já passou por cirurgia, radioterapia e atualmente faz sessões de quimioterapia.
A comerciante Iracema Gianzantti, 59, também enfrenta uma recidiva do câncer, um tumor de mama diagnosticado no fim do ano passado. Após a mastectomia, trata-se agora com quimioterapia. Estão previstas mais duas sessões e, depois, radioterapia e imunoterapia.
Ambos foram surpreendidos no início do mês com a notícia de que a clínica oncológica onde se tratam, o CCC (Centro Oncológico de Combate ao Câncer), de São Paulo, seria descredenciada pela SulAmérica a partir deste sábado (17).
“É um tratamento delicado, ele está fragilizado, vem passando por várias internações para tratar problemas pulmonares e renais decorrentes da queda da imunidade. A clínica tem todo o histórico, o oncologista fica na linha de frente a cada uma dessas internações, tem vínculo. Não faz o menor sentido interromper isso agora”, diz Sarita, mulher de Parise Filho.
Iracema também está indignada e temorosa. “Pagamos quase R$ 12 mil de plano de saúde [para ela, o marido e dois filhos]. Sou cliente desde os meus 19 anos e a seguradora nem entrou em contato com a gente. Eu liguei lá, confirmei e me indicaram [outras clínicas]. É desumano, os pacientes estão todos desesperados.”
Na mensagem enviadas aos pacientes, a clínica comunica que, após quase 30 anos como centro oncológico referenciado, foi “descredenciado de maneira unilateral pela SulAmérica”. Informa que, devido a isso, o tratamento seria coberto pelo plano até o dia 17 de junho. Também pede aos pacientes que entrem em contato com a operadora para mais informações.
Foi o que Parise Filho, Iracema e outros quase 150 pacientes fizeram. Em ligações gravadas ao SAC (Serviço de Atendimento do Cliente) da SulAmérica, eles reivindicam manter o tratamento oncológico na clínica até o término dele. As atendentes explicam que isso não é possível e que a seguradora está no seu direito de fazer o descredenciamento.
Nos últimos dias, alguns pacientes receberam telefonemas da operadora sugerindo outros locais onde eles poderiam dar continuidade ao tratamento oncológico. “Não aceitei. Estou tendo complicações que ainda estão sendo investigadas. Como vou parar isso e recomeçar em um lugar desconhecido?”, questiona.
Os pacientes também registraram queixas na ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) e organizam agora uma ação coletiva contra a operadora.
Procurada pela Folha, a SulAmérica declarou que “o ajuste no credenciamento para tratamentos oncológicos é válido apenas para novas solicitações e que os pacientes com atendimentos em andamento permanecem inalterados”.
Disse ainda que “qualquer informação contrária está equivocada”. Afirmou ainda que a seguradora entrará em contato com todos os pacientes em tratamento para esclarecer possíveis dúvidas e reforçar que todo o atendimento já iniciado continuará na clínica de origem. “Para a SulAmérica, a saúde e o bem-estar do beneficiário é uma prioridade”, informou.
Também em nota a ANS diz que prestadores não hospitalares, no caso clínicas, consultórios e laboratórios, só podem ser descredenciados se forem substituídos por outros equivalentes.
“Não há necessidade de autorização, nem de comunicação à ANS, mas a operadora deve comunicar aos beneficiários através do seu site e da Central de Atendimento, com 30 dias de antecedência, e manter a informação disponível para consultas por 180 dias.”
A ANS diz ainda que não pode interferir na relação contratual entre a operadora e seus prestadores e que, no caso de tratamentos em andamento, o beneficiário deverá escolher outro prestador que ofereça o mesmo serviço.
As reclamações sobre descredenciamento de prestadores de serviços por parte das operadoras dispararam na agência nos últimos anos.
Foram 918 queixas em 2020, 1.917 em 2021 e 3.818 em 2022. No caso específico da SulAmérica, foram 16, 57 e 521 reclamações, respectivamente. Entre janeiro e maio deste ano, foram registradas no geral 643 queixas, das quais 105 eram referentes à SulAmérica.
De acordo com o advogado Rafael Robba, especialista em direito à saúde do escritório Vilhena Silva Advogados, em outras situações semelhantes de doenças graves, em que clínicas e hospitais foram descredenciados, as decisões judiciais têm sido favoráveis aos pacientes no sentido de garantir que eles permanecem no mesmo local onde iniciaram o tratamento.
CLÁUDIA COLLUCCI / Folhapress