Heródoto Barbeiro fala sobre a guerra de Canudos, e o que resta desse momento na história

      A fazenda é improdutiva. A terra está abandonada em um imenso latifúndio. Na região, camponeses estão em busca de terra para plantar e viver do que colherem na agricultura familiar. Pai, mãe e filhos almejam uma propriedade para que possam plantar e viver. Contudo, os grupos oligárquicos rurais são organizados, têm influência no governo da República e não admitem a invasão da fazenda fantasma. É um exemplo perigoso, argumenta o cacique político local, uma vez que outras invasões podem acontecer até mesmo em fazendas produtivas. O mal tem que ser cortado pela raiz. É necessária uma pronta intervenção do governo federal para garantir o direito à propriedade, estabelecido na Constituição da República. Há um clima de luta de classes no interior. De um lado, os latifundiários; do outro, os sem-terra. Uma preocupação a mais para o governo federal.

               Os camponeses se espalham na região. Um número cada vez maior se aglomera no acampamento. Vivem do que e como podem. Esperam uma mudança na situação organizada pelo governo da República. Na falta de víveres, invadem propriedades de criação de gado, roubam animais para alimentação e transporte de novos habitantes. A gritaria dos grandes proprietários é cada vez mais intensa, especialmente na câmara dos deputados, onde a bancada de ruralistas detém o controle do Poder Legislativo. Sem o apoio dela, os projetos de interesse do governo não têm nenhuma chance de avançar, por isso o Executivo se vê emparedado pela pressão dos parlamentares. Estes estão diariamente na mídia da capital do Brasil com alertas que se não houver um breque no movimento camponês, o interior vai virar um mar de sangue. Proprietários armam guardas particulares para expulsar os invasores, mas não é suficiente. Tem que haver uma intervenção federal, dizem os representantes da agricultura no Congresso Nacional.

               O governo estadual não tem força militar capaz de dispersar os camponeses acampados. Escaramuças ocorrem no interior da Bahia. Pelo menos 20 mil pessoas se juntam no povoado às margens do rio Vaza Barris. Muitos armados. Canudos é a sede do movimento campesino comandado pelo beato Antonio Conselheiro. Não é um líder revolucionário. Considera-se um predestinado para impedir que a República sobreviva. Ela representa o anticristo. A arregimentação do povo é feita – procissões, festas religiosas e promessas de uma vida melhor no céu. Conselheiro prega a restauração da Monarquia derrubada por um golpe de estado dos militares com o apoio dos civis do Sudeste. A Igreja perde fiéis para Conselheiro. Junta-se à oligarquia na pressão por uma imediata dispersão dos famintos acumulados em uma pequena comunidade. O presidente Prudente de Morais, ele mesmo representante dos ruralistas, concorda em enviar o exército contra os miseráveis. Inicia-se uma tragédia retratada por Euclides da Cunha que registra: “Depois do massacre e da degola, sobrou uma única trincheira com um velho, dois homens feitos e uma criança”.

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