SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) -A medida de autorregulação anunciada nesta terça-feira (30) pela Febraban (Federação Brasileira de Bancos), que tem como propósito checar se frigoríficos compraram gado proveniente de áreas desmatadas, reflete a preocupação do setor com as questões climáticas que envolvem o país, afirma a entidade.
Para o diretor de sustentabilidade da Febraban, Amaury Oliva, o desmatamento está entre os principais desafios.
Pela perspectiva dos bancos, o financiamento de atividades associadas ao desmatamento pode ampliar riscos de crédito, reputacionais e operacionais. Nos últimos anos, atores econômicos globais criticaram o desmatamento na Amazônia.
Segundo dados do Mapbiomas citados pela federação dos bancos, o desmatamento e a degradação dos solos representam aproximadamente 45% das emissões de gases de efeito estufa do Brasil, sendo que cerca de 95% deste desmatamento ocorre de forma ilegal.
De acordo com a federação, 21 instituições financeiras já aderiram à autorregulação, e o número de adesões logo deve aumentar.
O protocolo foi aprovado pelo Conselho de Autorregulação da Febraban (Federação Brasileira de Bancos), formado por representantes de oito bancos -Itaú Unibanco, Banco do Brasil, Banco Votorantim, BMG, Bradesco, Caixa Econômica Federal, Daycoval e Santander.
A notícia foi antecipada, nesta segunda-feira (29), pelo jornal O Estado de S. Paulo.
Para estar de acordo com as novas regras, aprovadas em março, os bancos participantes terão de solicitar que frigoríficos da área em questão implementem um sistema de rastreabilidade e monitoramento. Isso permitirá comprovar se o estabelecimento não adquiriu gado associado ao desmatamento ilegal de fornecedores diretos e indiretos.
Os negócios envolvidos terão até dezembro de 2025 para se adequar. “Os bancos que aderem à autorregulação se comprometem, de forma voluntária, a seguir padrões ainda mais elevados de conduta e são periodicamente supervisionados, podendo sofrer punição em caso de descumprimento”, diz comunicado da entidade.
O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) recentemente teve seu nome aprovado pela governança da Febraban para ingressar no seu quadro de associados e, neste momento, está em processo de consolidação de sua adesão aos fóruns técnicos da entidade.
O banco de desenvolvimento vai ingressar na autorregulação socioambiental da Febraban, bem como irá aderir aos protocolos de gerenciamento do risco de desmatamento ilegal na cadeia de carne no país.
“O BNDES tem ações importantes voltadas ao gerenciamento do risco social, ambiental e climático, inclusive na cadeia de carnes desde 2009, bem como no direcionamento de investimentos para atividades que tenham impacto positivo na sociedade e no meio ambiente”, diz nota divulgada pela Febraban.
O diretor da federação dos bancos acrescenta que a agenda de sustentabilidade não é nova dentro do setor financeiro, que ao longo dos últimos anos já tem adotado medidas de aprimoramento dos controles ambientais para concessão de crédito.
Em julho de 2020, os três maiores bancos privados do Brasil -Santander, Itaú e Bradesco- lançaram o Plano Amazônia, iniciativa que pretende conter o desmatamento no bioma e contribuir com o desenvolvimento sustentável da região.
As instituições financeiras também já precisavam cumprir alguns requisitos legais na hora de conceder crédito a produtores rurais e empresas do agro. O Banco Central, por exemplo, tem resoluções que criam impedimentos para pessoas com irregularidades ambientais e empreendimentos que sobreponham terras indígenas, unidades de conservação ou comunidades quilombolas.
Oliva diz também que o desenvolvimento de práticas sustentáveis dentro do setor financeiro é um “trabalho de evolução permanente”, que tende a se espraiar para outras frentes que também causam impactos ambientais, como mineração e petróleo, mas que ainda não há um cronograma definido a respeito.
“Essa é uma agenda que é convergente e envolve todo o setor bancário, os clientes, o governo. Todos querem um ambiente mais sustentável, direcionando recursos e esforços para ter uma economia cada vez mais verde”, afirma o diretor da Febraban.
ASSOCIAÇÃO DAS EXPORTADORAS DE CARNE COBRA MAIOR ENGAJAMENTO DO SETOR FINANCEIRO NO COMBATE AO DESMATAMENTO
Em nota, a Abiec (Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes) disse que apoia todas as iniciativas que aumentem os padrões de sustentabilidade em todos os elos da cadeia da pecuária brasileira.
De acordo com a associação, seus membros utilizam ferramentas avançadas, como imagens de satélite e inteligência artificial, que permitem monitorar diariamente dezenas de milhares de fornecedores para garantir que estão de acordo com as mais avançadas políticas ambientais, atendendo às exigências de clientes e consumidores.
“Nós assumimos nossas responsabilidades, mas não aceitamos que outros setores terceirizem as suas responsabilidades para os frigoríficos”, assinalou a Abiec, que disse considerar fundamental a atuação do poder público e a participação de diferentes segmentos do setor privado, incluindo o setor financeiro, no esforço de combate a crimes ambientais como desmatamento ilegal.
“Por isso é importante não só que os bancos exijam de seus clientes que implementem sistemas de monitoramento e rastreabilidade, mas que as áreas de compliance e due diligence das instituições financeiras adotem em relação a todos os seus correntistas, inclusive proprietários rurais, os mesmos critérios socioambientais já implementados pela indústria de processamento de carne bovina, e não apenas para concessão de crédito”, destacou a associação do setor de carnes.
Segundo a Abiec, já são aproximadamente 20 mil fornecedores bloqueados por inconformidades socioambientais. “Os frigoríficos cortam relações comerciais com estes fornecedores, mas é possível que eles continuem tendo relações comerciais com o setor financeiro.”
A associação disse ainda que está disposta a cooperar com a Febraban para a melhoria contínua do setor e para oferecer sua expertise no desenvolvimento de critérios adicionais que regulem todo relacionamento dos bancos com proprietários de terras desmatadas ilegalmente, invasores de terras públicas e de territórios indígenas.
APÓS EMPOLGAÇÃO INICIAL, INVESTIDOR ESTRANGEIRO ACOMPANHA COM ATENÇÃO POLÍTICA AMBIENTA DO GOVERNO LULA
Nos últimos dias, gerou embate interno dentro do governo a intenção da Petrobras de explorar petróleo na região da Foz do Amazonas, iniciativa criticada pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e que acendeu um alerta entre grandes investidores estrangeiros.
A vitória do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tinha sido recebida com certo alívio pelo capital privado internacional, pela expectativa de uma mudança de condução em relação aos últimos anos da gestão de Jair Bolsonaro (PL).
A gestora nórdica Nordea Asset Management, por exemplo, retirou em novembro do ano passado os bonds (títulos de renda fixa) do Brasil de sua lista interna de restrições após promessas de Lula de proteger a floresta amazônica.
“Após promessas positivas do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva depois de sua vitória eleitoral no domingo, o veto da Nordea aos títulos do governo brasileiro foi suspenso, com efeito imediato”, disse a Nordea em comunicado à época.
Em entrevista à Folha de S.Paulo em novembro de 2022, Thede Rüst, gestor responsável pela área de títulos de dívidas de mercados emergentes da Nordea Asset Management, afirmou que o histórico do presidente Lula deu conforto à gestora para a decisão de suspender a restrição de investimento relacionada aos títulos do governo brasileiro.
Um caminho que pode ajudar o governo federal a financiar os programas sociais, apontou Rüst, pode se dar por meio da emissão de títulos verdes.
Segundo o gestor, a partir de 2023, o mercado global estará muito mais receptivo a comprar títulos emitidos pelo governo brasileiro que venham acompanhados de metas de sustentabilidade, algo que ele entende que provavelmente seria muito difícil de acontecer sob o governo Bolsonaro, frente à falta de credibilidade da gestão ambiental no país.
Em um cenário de preocupação crescente nas economias desenvolvidas com a sustentabilidade, o Parlamento Europeu, que cria as leis que serão aplicadas pelos 27 países da União Europeia (UE), aprovou em abril uma norma que proíbe a venda no continente de produtos oriundos de desmatamento em florestas.
Não se trata apenas da madeira derrubada. Qualquer cultura que utilize local onde houve desmatamento ilegal, como na Amazônia, sofrerá sanções de compra pelos países da UE.
BB LEILOA IMÓVEIS COM POSSIBILIDADE DE PAGAMENTO EM CRÉDITOS DE CARBONO
Dentro dos esforços do setor bancário para estimular atividades sustentáveis, o BB (Banco do Brasil) anunciou nesta segunda-feira (29) o lançamento do primeiro edital de leilão de imóveis rurais com possibilidade de pagamento parcial ou integralmente em créditos de carbono.
A fase para lances já está aberta, e a sessão de disputa será online, às 14h do dia 7 de junho.
São seis imóveis -localizados em Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná e Santa Catarina-, com descontos de até 55% em relação ao valor de mercado. Os interessados, pessoas físicas ou jurídicas, devem se cadastrar no site da leiloeira oficial do BB, www.lancenoleilao.com.br, com até 24 horas de antecedência da disputa.
A compra pode ocorrer 100% online, com pagamento em moeda corrente; moeda corrente e certificados de crédito de carbono; ou integralmente em créditos de carbono. Esses serão aceitos no valor unitário máximo de R$ 88,27 em ambas as possibilidades.
Os créditos de carbono devem ser gerados conforme padrões e termos reconhecidos pelo mercado regulado ou pelo mercado voluntário, como o Verified Carbon Standard.
“Agora, os bens rurais passam a contar com a nova modalidade de pagamento, que visa a fomentar o mercado de créditos de carbono como forma de apoiar o desenvolvimento sustentável do país”, assinalou o BB em comunicado.
LUCAS BOMBANA / Folhapress