RIBEIRÃO PRETO, SP (FOLHAPRESS) – Já acostumado a enfrentar trânsito carregado para chegar à Agrishow (Feira Internacional de Tecnologia Agrícola em Ação), o engenheiro agrônomo Carlos Eduardo Gulian saiu de casa neste ano com o objetivo de chegar à fazenda que abriga a feira em Ribeirão Preto (a 313 km de São Paulo) às 8h30 da última segunda-feira (1º). Só conseguiu entrar no espaço depois das 11h.
Ele não foi o único a enfrentar problemas relacionados à feira agrícola, a principal em tecnologia para o setor na América Latina. Moradores de condomínios na região da Agrishow, funcionários que usam o Anel Viário da cidade para chegar ao trabalho e frequentadores de bares, restaurantes e motéis viveram uma semana de caos no rico município do interior paulista.
A avaliação da organização e da prefeitura, porém, é de que a cidade ganha muito economicamente com a Agrishow e que os benefícios são muito maiores que os problemas.
A organização anunciou que os negócios alcançaram R$ 13,29 bilhões na edição deste ano, recorde na história da feira realizada desde 1994 na cidade.
A organização do evento, após as fortes reclamações de expositores e visitantes em 2022, quando a feira foi retomada após um hiato de dois anos devido à pandemia de Covid-19, implantou uma série de mudanças com o objetivo de facilitar o acesso dos visitantes ao local, no km 321 da rodovia Antônio Duarte Nogueira. Mas não resolveu.
O horário de abertura dos portões foi alterado de 8h para 9h, para que o fluxo de veículos que se dirigia ao evento não se misturasse com o tráfego normal registrado diariamente no local.
Também houve mudanças no estacionamento, dividido em cinco cores para separar visitantes, expositores e prestadores de serviço, e a adoção da possibilidade de pagar o estacionamento de forma antecipada, para agilizar a entrada.
“É difícil, tudo que é feito não resolve o caos no trânsito. Daqui a pouco as pessoas vão começar a chegar na madrugada”, disse Gulian.
Nem mesmo o prefeito de Ribeirão, Antônio Duarte Nogueira Junior (PSDB), escapou. Nesta sexta (5), ele afirmou que demorou duas horas e 40 minutos para percorrer um trecho de menos de 3 quilômetros na segunda.
“Todos nós, e a cidade também, temos um desafio para a próxima Agrishow […] No primeiro dia, que foi o de maior público da feira, nós tivemos nos estacionamentos da Agrishow mais automóveis do que automóveis estiveram no domingo da última Fórmula 1 em Interlagos. Então vejam a dinâmica e a pressão da presença de veículos que a Agrishow imprimiu”, disse o prefeito.
No aeroporto Leite Lopes, o principal da região, houve um aumento de 307% no total de pousos e decolagens desde a última semana, com a aproximação da feira agrícola.
Nos bares e restaurantes, houve crescimento de 24% nos negócios, segundo dados da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) anunciados pela prefeitura, e a rede hoteleira não só da cidade, mas também de municípios vizinhos, teve 100% de ocupação.
Isso apesar de cobrar R$ 3.000 a diária por pessoa de um quarto num hotel que normalmente custa de R$ 200 a R$ 250 e de muitas vezes exigir a reserva de pacotes para os cinco dias da feira. A alta procura fez também com que motéis de Ribeirão fossem utilizados como hotéis -com isso, o público habitual desse tipo de estabelecimento enfrentou dificuldades entre domingo (30) e esta sexta.
Se a espera para chegar à feira foi muito grande, quem mora na região também enfrentou dificuldades para deixar ou chegar aos oito condomínios no entorno da feira.
“[Precisamos] Melhorar os acessos para nossos expositores e clientes, que é o que sustenta a feira. Se não fizermos isso, as pessoas estão fadadas a não vir mais aqui”, disse o novo presidente da Agrishow, João Carlos Marchesan.
Com o público também recorde, de 195 mil visitantes, a Agrishow teve ainda problemas com a higiene dos banheiros espalhados pela fazenda. Às tradicionais filas em banheiros femininos se somaram filas de até 15 minutos sob o sol de mais de 30º C para a utilização de sanitários masculinos.
Marchesan afirmou que vai ampliar o total de banheiros na Agrishow de 2024, que acontecerá entre 29 de abril e 3 de maio.
SINAL DO CÉU
Presidente de honra da Agrishow, o empresário Maurilio Biagi Filho defendeu a movimentação econômica gerada pela feira agrícola, que para ele é “tudo que não está computado”.
“Só de helicópteros, fiz um cálculo rápido aqui, nós temos um movimento de R$ 1 bilhão, movimento econômico que não está contabilizado em lugar nenhum. Só das pessoas que pegam voos para casa de amigos, que vão para a casa de não sei o que. Você tem um movimento econômico na feira de R$ 500 milhões num raio de 120 quilômetros daqui. Esse é um dado muito importante, uma observação minha, da vida inteira, que observo isso.”
O uso de helicópteros provocou também uma notícia fúnebre relacionada à feira: um deles, que voava em direção à Agrishow, caiu no final da tarde desta quarta-feira (3) em São Carlos (232 km de SP). Segundo os bombeiros, duas pessoas que estavam na aeronave morreram.
A Agrishow gerou mais de 5.000 empregos temporários para montagem e desmontagem de estandes, motoristas, bufês e serviços de limpeza, entre outros.
O QUE FAZER
Nogueira disse que serão necessários ajustes na cidade e que é preciso um trabalho coletivo, já que há variáveis que fogem da alçada da prefeitura e envolvem concessionária de rodovias, Artesp, DER e Secretaria da Agricultura paulista, por exemplo.
“Precisamos fazer essa investida positiva, com soluções construtivas, para a gente ter menos gargalos na feira do ano que vem. Não que não vai ter, claro que vai ter, mas precisamos minimizar esses impactos, tanto na entrada quanto na saída”, disse o prefeito.
MARCELO TOLEDO / Folhapress