BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Ampliar a capacidade de investimento de estados e municípios dentro da agenda de desenvolvimento socioambiental. Essa é a proposta da nova linha de crédito para entes da federação, lançada pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Estão reservados R$ 30 bilhões para essa finalidade, explica Tereza Campello, que comanda a Diretoria Socioambiental do banco.
Essa modalidade de financiamento a estados e municípios estava suspensa desde 2018.
Dentro do novo escopo se encaixam projetos de mobilidade urbana, saneamento, recursos hídricos, segurança pública, saúde, educação e conectividade. A lista inclui ainda propostas para recuperação do patrimônio histórico e de áreas afetadas por eventos climáticos extremos, como enchentes e deslizamentos.
Compra de ônibus elétrico, obras para proteção de encostas e instalação de painéis solares para a geração de energia distribuída são alguns exemplos práticos de projetos que se enquadram.
“Nossa área atua para gerar emprego e crescimento econômico, alinhados com políticas socioambientais que contribuam para a redução de desigualdades, recuperação e ampliação da infraestrutura física no país, promoção da agenda verde, além do combate aos efeitos das mudanças climáticas”, afirma Campello.
Ela diz que o BNDES trabalhou para conseguir taxas e prazos mais competitivos. O banco também oferece assistência para o cliente do setor público organizar o seu projeto e capacitá-lo para ter acesso ao recurso. Em contrapartida, o interessado precisa ter espaço fiscal para se endividar.
Análise do banco de fomento, a partir de dados da Secretaria do Tesouro Nacional e do Conselho Monetário Nacional, aponta que estados têm limite fiscal, para o restante de 2023, da ordem R$ 40 bilhões no total, e os municípios, de R$ 8,2 bilhões.
Segundo Campello, a retomada do investimento é uma prioridade do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e o banco está alinhado a essa diretriz.
“O investimento público despencou nos últimos anos, mas o Brasil não vai voltar a crescer se não voltar a investir, e entendemos que todo investimento é importante -o do governo federal, o do setor privado, e também de estados e municípios”, afirma ela.
“O BNDES perdeu relevância como agência de fomento nos últimos seis anos, praticamente desapareceu nessa área, e agora estamos retomando esse papel com estados e municípios.”
Ela reforça que a proposta do banco é que esse crédito direcionado a investimentos possa alinhar estados e municípios ao programa nacional do governo federal, que ainda não foi lançado.
“O programa federal ainda não tem nome definido, pode ser PAC 3, novo programa de investimentos, mas nós estamos aqui adiantando o serviço para que os estados e municípios possam se preparar, organizar projetos, começar a conversar com o banco”, diz Campello. “O balcão está aberto para quem quiser nos procurar, estamos prontos para atendê-los.”
A coordenadora da área de Gestão Pública do banco do banco, Paula Barbosa, explica que dado o porte dos projetos listados, a linha de crédito é mais apropriada para municípios de maior porte, e que a instituição tem outras alternativas para municípios menores.
O economista José Roberto Afonso qualificou como “excelente” a iniciativa do BNDES. Hoje, destaca ele, esse tipo de recurso é oferecido no Brasil por agências estrangeiras, especialmente o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento).
“O BNDES é um tradicional financiador de investimentos em modernização de gestão e em infraestrutura, que tende a passar por estados. A inadimplência sempre foi muito baixa”, diz ele.
O economista lembra que o investimento público federal mergulhou em anos recentes. Em 2021, por exemplo, foi de apenas 0,26 pontos do PIB (Produto Interno Bruto), uma das menores taxas da série histórica iniciada em 1947.
Segundo Afonso, cerca de 73% dos investimentos feitos por governos, de 2011 a 2021, foram realizados por esses entes, sendo 36% por estados, e 36% por municípios. Isoladamente, na média, cada um deles investiu mais que a União.
Em 2021, os investimentos dos diferentes níveis de governo caíram a um dos menores patamares da história, 1,3% do PIB (Produto Interno Bruto). Subiu para 2% em 2022, mas puxado por estados (0,9%) e municípios (0,8%), com a União mantendo a mesma participação (0,3%) desde 2019.
“Estados e municípios obedecem fielmente a LRF [Lei de Responsabilidade Fiscal], ao contrário do governo federal”, diz ele
“Os estados hoje devem cerca de metade do que deviam quando a lei foi editada, e as prefeituras podem fechar este ano com mais dinheiro em caixa do que em dívida. Em tese, tendem a investir cada vez mais.”
O BNDES retoma o crédito a investimentos de estados e municípios no momento de retração dos financiamentos de forma geral, e aumento de taxas de juros, dentro do ciclo de aperto monetário promovido pelo BC (Banco Central) para combater a inflação.
Os dados até abril mostram queda de 17,5% nas concessões de crédito no mês, com reduções em várias modalidades. A iniciativa do banco, no entanto, não estaria em conflito com a política monetária, na avaliação de Nicola Tingas, economista-chefe da Acrefi (Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento).
Segundo ele, agentes de fomento como o BNDES tem importante papel na política do desenvolvimento de longo prazo e na transição de ciclo econômico, como o que o Brasil vive no momento.
“Portanto, a ação de redução da inflação e proteção do poder aquisitivo da moeda por parte do Banco Central não necessariamente conflita com a política pública de apoio ao segmento de empresas e famílias”, afirma Tingas.
“Crédito do setor público para o setor público, por sua vez, é uma questão de qualidade e sustentabilidade da gestão de finanças públicas. E o limite está em saber a adequação e a direção, a cada momento do ciclo econômico, pelos públicos entre si e em correlação positiva em relação aos agentes privados.”
CONDIÇÕES FINANCEIRAS DO CRÉDITO AO INVESTIMENTO DE ESTADOS E MUNICÍPIOS
**Valor mínimo do financiamento direto** R$ 20 milhões
**Participação do BNDES** Conforme a linha, mas normalmente até 90% do investimento
**Custo financeiro** TLP, Taxa de Longo Prazo com variação mensal; em maio é IPCA + 5,93% ao ano
**Taxa bancária** 0,9% a 1,3%
**Taxa de risco** 0,25% a 1,7% (a depender do rating) / 0,1% (com garantia da União)
**Prazos** 12 a 36 meses de carência / 12 a 24 anos de amortização
ALEXA SALOMÃO / Folhapress