BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) – Tão logo o Banco Central da Argentina publicou nas redes sociais que a nota de 2.000 pesos entrou em circulação nesta segunda (22), os memes começaram a pipocar. “Essa aqui é a que a gente precisa”, escreveu um internauta acima de uma foto da nova cédula acrescida de um zero, ou seja, 20 mil pesos.
Agora, o bilhete de valor mais alto do país equivale a cerca de R$ 20 ou US$ 4 na cotação paralela “blue”, que rege o dia a dia dos argentinos. Isso representa o dobro da maior nota atual, de mil pesos, o que ameniza -mas não resolve- o problema de quem tem que andar com bolos de dinheiro nos bolsos.
Desde o início do ano passado, a inflação não para de crescer na nação vizinha, o que faz a moeda “derreter” e se desvalorizar rapidamente nas mãos. Em abril, o índice bateu mais um recorde, chegando a 109% no acumulado dos últimos 12 meses, o maior número em quase 32 anos.
O lançamento da nota era aguardado desde fevereiro, quando o Banco Central anunciou a criação do bilhete. Tanto moradores quanto turistas, no geral, usam dinheiro vivo no cotidiano, o que gera problemas de segurança e também dor de cabeça logística para empresas e bancos.
Estima-se que quase metade das transações comerciais no país ainda seja realizada “en efectivo”. As notas de mil pesos são as mais cobiçadas e representam 77% da circulação monetária no país, o dobro de quatro anos atrás, segundo cálculos do economista Nicolas Gadano, que foi gerente geral do BC argentino.
Pressionada por diversos setores, como a Fecoba (Federação de Comércio e Indústria da Cidade de Buenos Aires), o Banco Central, que é controlado pelo governo peronista de Alberto Fernández, cedeu e começou a fabricar as cédulas. A ideia é que elas ficassem prontas apenas em junho, mas melhorias na produção encurtaram o prazo.
“À medida que o processo de digitalização dos pagamentos avança, essa cédula de maior valor vai permitir uma melhora no funcionamento dos caixas eletrônicos e, ao mesmo tempo, uma otimização das transferências de dinheiro”, escreveu a instituição financeira em comunicado. Estipula-se também sobre a confecção de bilhetes de 5.000, o que não está confirmado.
A nova nota cinza rosada será distribuída progressivamente pelos bancos em todo o país, segundo o BC, que ressaltou medidas de segurança como uma marca d’água e uma tinta que muda de cor com efeito dinâmico tridimensional, além de um leve relevo perceptível ao tato por pessoas cegas.
O desenho da cédula é uma homenagem ao desenvolvimento da saúde pública, da ciência e da medicina na Argentina, trazendo os rostos da primeira médica, Cecilia Grierson (1859-1934), e do primeiro ministro da Saúde do país, Ramón Carrillo (1906-1956).
A nação vizinha vive mergulhada em instabilidade econômica há décadas. Em 40 anos de democracia, completados neste ano, o país atravessou nove grandes crises, conservando hoje o mesmo PIB per capita daquela época.
Agora, passa por mais um agravamento da situação a poucos meses da eleição presidencial, em outubro, com aumento da pobreza, previsão de recessão, queda de receitas, falta de dólares e inflação em aceleração -só no mês passado, o índice geral foi de 8,4%, o dobro do registrado em todo o último ano no Brasil (4,2%).
Diante da conjuntura, o ministro da Economia Sergio Massa, pré-candidato pelo kirchnerismo, vem anunciando sucessivos pacotes para tentar conter os impactos sociais e estabilizar o valor do peso. Há uma semana, aumentou a taxa de juros pela terceira vez em um mês, para 97% ao ano, interveio no mercado de câmbio e ampliou benefícios sociais.
JÚLIA BARBON / Folhapress