O crescimento dos casos de fraude contra planos de saúde, especialmente por meio de pedidos irregulares de reembolso, tem levado grandes empresas a abrirem investigações internas para identificar e demitir funcionários que burlam as regras do benefício.
Nos últimos meses, a empresa de infraestrutura CCR demitiu mais de cem profissionais após uma investigação que apontou um custo adicional para a companhia acima de R$ 12 milhões em cinco anos pelo uso indevido do plano com práticas como a divisão do valor de reembolso por procedimentos não realizados, superfaturados ou desnecessários com clínicas de fachada.
Situação semelhante aconteceu no Itaú, que demitiu 80 profissionais após detectar má conduta dos trabalhadores em pedidos de reembolso. Os dois casos repercutiram no mercado, estimulando outros empregadores a estudar as demissões como forma de combater as fraudes.
Segundo Raquel Reis, CEO da SulAmérica, a reação das empresas contratantes acontece no momento em que o próprio mercado de planos de saúde investe em esforços para tentar conter o avanço dos golpes.
Ela afirma, por exemplo, que a partir de julho o aplicativo da empresa vai passar a exigir biometria facial do usuário, na tentativa de impedir o uso irregular por terceiros.
No ano passado, a Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde) lançou um manual de combate a fraudes, e a FenaSaúde (federação do setor) levou denúncia ao Ministério Público de São Paulo sobre esquemas envolvendo R$ 40 milhões em reembolsos fraudulentos.
“Estamos sendo muito vocais nesse tema. Tivemos um grande aumento de equipe. Fizemos contratação de pessoas e escritórios de advocacia para fazer sindicância e intensificar a quantidade de abertura de queixa-crime e processos judiciais”, diz Reis.
Cassio Ide Alves, superintendente-médico da Abramge, afirma que o setor vem percebendo uma escalada das fraudes desde o início da pandemia, impulsionada por brechas favorecidas pela digitalização e propagandas de esquemas em redes sociais.
Segundo Alves, a empresa contratante acende o sinal de alerta quando descobre uma elevação fora do comum no custo previsto pelo cálculo atuarial. Com esse crescimento distorcido dos sinistros, a companhia pode pagar um valor extra, além do encarecimento do reajuste na renovação do contrato.
“A empresa tem meios de verificar os dados. A fraude costuma deixar rastros. Às vezes, aparece um pedido de reembolso para uma consulta que foi cadastrada no dia em que o funcionário estava viajando a trabalho”, afirma Alves.
Vera Valente, diretora-executiva da FenaSaúde, diz que tem reuniões marcadas com representantes da indústria e profissionais responsáveis pelas áreas de recursos humanos de diversos setores para levar informações sobre o tema.
“O custo do que é feito irregularmente por um funcionário onera a empresa e pode gerar consequências como as demissões, que agora estão acontecendo, mas também pode levar o empregador a rever o benefício e reduzir a categoria do plano”, diz Valente.
O advogado Luís Mendes, sócio do Pinheiro Neto e especialista em direito trabalhista, afirma que uma fraude cometida pelo profissional no plano provoca quebra de confiança, que é considerada falta grave.
“Caberá à empresa dosar, se vai aplicar uma pena pequena, uma advertência, uma suspensão ou uma rescisão do contrato por justa causa”, diz.
Além da dispensa por justa causa, o funcionário pode ter de responder criminalmente pelo ato e devolver o dinheiro desviado, segundo Domingos Fortunato, sócio do Mattos Filho, também na área trabalhista.
Ele ressalva que a demissão por justa causa requer cuidados do empregador, com uma investigação estruturada que confirme e dê suporte à medida.
JOANA CUNHA / Folhapress