Galípolo divide mercado, que vê perfil técnico, mas indicação política

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A confirmação nesta segunda (8) de que o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo, será o indicado do governo para a diretoria de Política Monetária do Banco Central (BC) dividiu analistas do mercado financeiro.

Apesar de ser visto como um nome técnico com bom trânsito no governo, parte do mercado avalia que a indicação é um sinal de interferência política na autoridade monetária.

Além disso, há consenso de que a nomeação do secretário é um primeiro passo em direção a um Copom (Comitê de Política Monetária), responsável pela definição da taxa básica de juros, mais brando no combate à inflação. Analistas, no entanto, se dividem sobre o tempo e a intensidade dessa transição.

O atual patamar de juros mantido pelo BC vem sendo alvo de críticas pelo governo, que pede ao Copom uma redução da Selic. Ao anunciar a indicação, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou no entanto que o secretário não é filiado ao PT e que não vai representar o pensamento do partido no colegiado.

“Por mais técnico que Galípolo seja, a leitura do mercado é de que há um viés do governo para tentar forçar a redução de juros. A decisão parece ser muito mais política do que técnica”, diz Rodrigo Marcatti, economista da Vedha Investimentos.

“A indicação contraria a opinião do mercado do que poderia ser melhor para o Banco Central”, afirma.

Ele lembra, porém, que a nomeação de Galípolo para a diretoria não tem o poder de mudar imediatamente as decisões sobre os juros, que têm sido tomadas por ampla maioria no colegiado do Copom.

Denilson Alencastro, economista-chefe da Geral Asset, afirma dar o benefício da dúvida a Haddad e a Galípolo. “Agora é acompanhar se teremos ou não algum tipo de influência política no BC. Quero acreditar que não; o BC presidido pelo Roberto Campos Neto tem sido bastante técnico, e a tendência é isso seguir”, disse ele, citando o histórico de Galípolo no mercado financeiro como um fator positivo.

O atual secretário-executivo da Fazenda foi presidente do Banco Fator de 2017 a 2021 e já esteve em campo oposto ao PT. O economista atuou na modelagem das vendas das duas estatais, a Cesp e a Cedae, ocorridas sob protesto de petistas.

O analista Flávio Conde, da Levante Investimentos, considera positiva a indicação, destacando que o economista poderia defender outro ponto de vista para a definição de juros no Brasil.

“Achei a indicação coerente e responsável. Galípolo tem bom trânsito com todo o governo e poderia contribuir nas discussões sobre o rumo da política monetária já na próxima reunião. Ele deve levar uma visão diferente da atual, que é muito rígida, inflexível e centrada em levar a inflação à meta”, diz Conde.

Nesse sentido, Rodrigo Marcatti afirma que a indicação de Galípolo pode servir para apaziguar a troca de farpas entre o BC e o governo.

“A participação de Galípolo na diretoria pode fazer com que Haddad fique mais alinhado ao BC, diminuindo os ataques entre o governo e a autoridade monetária e, com isso, fazendo com que os discursos fiquem mais uníssonos”, diz ele.

Além de ter confirmado o nome de Galípolo, Haddad disse que Ailton de Aquino Santos, servidor de carreira do BC, será indicado para a diretoria de Fiscalização do órgão. Ambas as indicações ainda serão analisadas pelo Senado.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ainda terá neste ano mais duas vagas para indicar ao BC, para as diretorias de Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta e de Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos Corporativos.

Desta forma, para muitos economistas, a nomeação de Galípolo é apenas uma etapa de uma mudança mais ampla e lenta no viés de política monetária da diretoria do BC.

“Não acho que o Galípolo vai muito para esse lado ideológico e tem noção de que não se pode simplesmente baixar a taxa de juros nesse momento. Mas, embora a maioria do Copom ainda esteja com uma cabeça mais cautelosa, até o final do ano o governo tem mais nomes que vai anunciar. E, se governo quer uma maioria no Copom, é porque o governo quer outra cara para o Copom”, disse Rafael Pacheco, economista da Guide Investimentos.

Alguns economistas se mostram mais pessimistas, interpretando a confirmação de Galípolo como uma interferência política direta no Banco Central, que é autônomo, e prevendo mudanças mais imediatas na forma de conduzir a taxa de juros.

“Acho que a indicação dele vai na linha de não ter um Banco Central tão independente na prática nos próximos anos; isso que a gente está vendo agora, que é realmente o Banco Central independente, deve sumir”, disse Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos, que faz parte da ala do mercado que vê Galípolo como o provável próximo presidente do BC.

Alexandre Schwartsman, economista e ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central do Brasil, comparou a possível intenção do governo de que Galípolo seja o sucessor de Campos Neto à trajetória de ascensão do ex-presidente do BC Alexandre Tombini dentro da autarquia. Tombini ocupou a chefia da instituição durante a gestão da então presidente Dilma Rousseff, de janeiro de 2011 a meados de 2016.

“Se a história servir de guia, tal indicação revela a intenção do governo de colocar no BC um presidente subserviente, alguém que, como Tombini, está preparado para conduzir a política monetária para outros objetivos que não a meta de inflação”, disse Schwartsman, que foi diretor durante o primeiro governo Lula.

Nesta segunda, o dólar subiu e voltou ao patamar de R$ 5,00, acelerando ganhos após a confirmação da indicação de Galípolo. A Bolsa, por sua vez, teve alta puxada por empresas do setor de commodities, como Petrobras e Vale.

MARCELO AZEVEDO E LUANA MARIA BENEDITO / Folhapress

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