Gravação mostra como minoritário organizou conselho da Eletrobras

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A gestora 3G Radar é um minoritário da Eletrobras com 1,3% do capital total. A posição é irrelevante no que se refere ao poder de decisão. Tem 0,05% das ações ordinárias (com direito a voto). Destaca-se no acesso aos resultados, com 10,88% das ações preferenciais, que têm prioridade para receber dividendos.

Gravação de uma reunião interna, obitda pela Folha, deixa clara a habilidade da gestora para ocupar posições no conselho de administração, que define a diretoria e traça estratégias. Qualquer acionista ou grupo de acionistas pode sugerir uma chapa para ser avaliada em assembleia. O que chama a atenção no caso é que dos 9 conselheiros, 3 contaram que foram convidados para o posto por um acionista da 3G Radar, o sócio fundador da gestora Pedro Batista de Lima Filho, que também se tornou conselheiro após a privatização, indicado pelos preferencialistas.

Em nota, a 3G Radar afirma que “todas as indicações para a composição da diretoria da Eletrobras foram feitas em comum acordo entre os conselheiros de administração, como mandam as práticas de governança da companhia”.

A gestora foi fundada em 2013 por Batista e Mario Cunha Campos. Batista havia feito carreira nos bancos Pactual e UBS, além de ter participado da criação da gestora Vinci Partners. No novo empreendimento eles tinham como sócio a 3G Capital Partners, do trio de empresários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira.

O formulário de referência mais recente da 3G Radar, de 2022, destaca que no seu bloco de controle estão Batista, Campos e 3G Capital. Em nota à Folha, a área de relações com investidores da Radar informou ter 15 sócios, e o 3G Capital é um minoritário.

O trio deixou de ser sócio da 3G Capital em junho do ano passado, mas permanece entre os investidores, segundo assessorias dos empresários.

Batista é conhecido e respeitado como um analista de energia técnico, que foi além dos números. Aprendeu como as empresas funcionam. É estudioso dedicado. Amigos contam que é do tipo que vai à praia e leva para ler alguma nova normativa da Aneel.

A avaliação é que por ter um pé no mercado financeiro e outro no setor de energia, ele sabe o que os investidores querem da Eletrobras. É apontado como um conselheiro “planilheiro” porque quer entender até a vírgula de cada decisão.

Faz pressão por resultado.

Em Brasília, é apontado como ator atuante na privatização desde que o governo de Michel Temer (MDB) começou a avaliar a venda da estatal. A 3G Radar produziu análises e projeções sobre o tema.

“A 3G completa dez anos em 2023, e somos há dez anos acionistas da Eletrobras. Foi uma das primeiras ações que a gente comprou, e em 2013 era um momento complicadíssimo da Eletrobras”, disse na reunião reproduzida na gravação.

“Mas a gente tinha um visão muito clara do valor da companhia, sabia dos

problemas e dos riscos. E por que a gente sabia disso?

Desde 1997, eu descobri que não tem como a gente entender o setor elétrico sem entender a Eletrobras, dada a relevância dessa empresa [..] Eu estudei Eletrobras desde 1997 e só fui investir em 2013.”

A reunião ocorreu em 26 de janeiro e foi convocada para apresentar os conselheiros aos gestores e dar um norte sobre os rumos da reestruturação após a privatização.

O conselheiro e consultor Vicente Falconi, por exemplo, comentou que teve experiência em muitos conselhos, e o trabalho era mais instigante onde encontrava problemas para resolver. Para ilustrar o ponto de vista, fez uma analogia entre a cervejaria Ambev e a Eletrobras pós-privatização.

“Eu fiquei no conselho da Brahma, e depois, no da Ambev, durante 25 anos. Então, eu peguei o conselho da Brahma lá no começo, e era um conselho, assim, muito parecido com o nosso atual.”

“Eram três banqueiros que compraram uma empresa de bebidas, embora não entendessem nada, e começamos a organizar a empresa, a colocar algumas pessoas para dentro. Então, a ênfase, nos primeiros anos daquele conselho, era resolver problema. Problemas grandes da empresa. Mesma coisa aqui hoje.”

Falconi disse que já havia se retirado da companhia. Teve mandato como conselheiro de abril de 2019 a abril de 2021, e renunciou em 2020. Porém, disse que Batista o chamou.

“Na verdade eu já tinha saído do jogo, sabe? Para mim, tinha terminado. Eu pendurei a chuteira. Estava no vestiário”, disse ele. “Mas apareceu o Pedro lá. ‘Falconi, vamos voltar para o jogo aí. Joga mais uns dez minutos aqui’.”

Felipe Vilela Dias, no conselho desde abril de 2019, também atribui a Batista o seu ingresso na Eletrobras.

Depois de dez anos na gestora Squadra Investimentos, queria novos desafios. Narrou a saída estressante como conselheiro em outra companhia e como veio o convite para a Eletrobras.

“Eu já era amigo do Pedro, convivemos no mercado. E ele falou: ‘Pô cara, você está saindo de uma roubada, mas vou de te botar em outra. ‘Queria te indicar como representante dos preferencialistas, mas você vai para o comitê de auditoria, que é um negócio pesado’. Comitê de auditoria é sempre pesado”, disse Dias.

O presidente do Conselho, Ivan Monteiro, contou que só vira Batista uma vez na vida, mas que recebeu um telefonema dele no dia em que a capitalização havia sido aprovada. Monteiro fez carreira no Banco do Brasil e foi presidente da Petrobras. Na área de energia elétrica, passou pelos conselhos da CPFL e Light. Agendaram conversar para a noite.

“A gente foi jantar. Ele é o autor da frase. ‘Queria te convidar para um projeto nos próximos dez anos.’ Adorei. Eu definitivamente não sou velocista. Sou maratonista. A conversa foi extremamente agradável. Ele mencionou alguns nomes. Ali a gente começou a arquitetar o sequestro do Wilson”, disse Monteiro.

Wilson Ferreira Jr. havia sido presidente da mesma Eletrobras de 2016 a 2021 e estava na Vibra. Voltou à companhia em setembro de 2022.

A 3G Radar também indicou Elvira Baracuhy Presta. Ela entrou no conselho em 2018 como representante dos minoritários. Agora, é vice-presidente executiva financeira e de relações com investidores.

Dias antes de a capitalização ser aprovada no Senado, em 17 de junho de 2022, um grupo de investidores na Eletrobras, do qual Batista fazia parte, foi recebido pelo então ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida. O encontro foi registrado na agenda oficial. O grupo levou a lista com os executivos da chapa proposta para compor o novo conselho. A relação também foi apresentada no Ministério da Economia.

Em 5 de agosto de 2022, a Assembleia Geral Extraordinária dos Acionistas aprovou e elegeu a chapa, que tem trabalhado intensamente.

Já realizou 39 reuniões.

Um dos desafios é lidar com a Ação Direta de Inconstitucionalidade apresentada pela Advocacia-geral da União no Supremo Tribunal Federal. O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) faz questão de que a União volte a ter poder de voto proporcional à sua participação na companhia.

A assessoria de imprensa da Eletrobras disse em nota que a reunião em 26 de janeiro ocorreu em modelo híbrido e foi acompanhada por 230 gestores dentro da total transparência que faz parte dos princípios da companhia.

Destacou ainda que os nomes indicados para o conselho de administração preencheram os requisitos previstos no Estatuto Social e no Regulamento de Indicações, foram avaliados pelo Comitê de Pessoas, Elegibilidade, Sucessão e Remuneração.

Por fim, foram eleitos em Assembleia Geral de Acionistas.

A nota lembra que Eletrobras é gerida pelo modelo “corporation”, ou seja, não há acionistas controladores do capital.

ALEXA SALOMÃO / Folhapress

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