Herdeiro da Pierre Cardin mira o espaço para inventar as novas roupas do futuro

SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) – Se depender da Pierre Cardin, a roupa do futuro será confeccionada de tecidos que podem ser vestidos na Terra ou na Lua. A pesquisa de novos materiais é onde se centra a energia de Rodrigo Basilicati-Cardin, sobrinho de Pierre -estilista pioneiro do prêt-à-porter, morto em 2020-, e herdeiro do comando da grife que leva seu sobrenome.

“Os últimos dez anos da minha vida com meu tio foram de um diálogo contínuo. A pesquisa de novos materiais é uma ideia minha mas quem sugeriu foi meu tio. Quero encontrar tecidos que podem ser usados em qualquer temperatura”, ele afirma, em entrevista num hotel em São Paulo, acrescentando que fez uma parceria com a agência espacial europeia, a ESA, para o desenvolvimento de têxteis.

Basilicati-Cardin, de 52 anos, segue agora a trilha aberta pelo tio. Nas décadas de 1960 e 1970, Pierre Cardin ficou conhecido como o estilista da era do espaço, com seu vestuário feminino e masculino influenciado por formas geométricas e fabricado em materiais inusitados, como papel alumínio e vinil.

Naquela época, em que a exploração espacial era associada à ideia de futuro, a Nasa comissionou Pierre Cardin para desenvolver sua versão de um conjunto para astronautas. “As roupas que eu prefiro são aquelas que eu criei para uma vida que ainda não existe, o mundo de amanhã”, disse o estilista, no que se tornou um de seus lemas.

Enquanto olha para a Lua em busca de inspiração, o novo diretor da marca vê o futuro com os jovens talentos. Basilicati-Cardin está no Brasil para a etapa final de um concurso que vai dar a um estudante de moda a chance de estagiar na sede da maison, em Paris. Designers em início de carreira do México, dos Estados Unidos e da Coreia do Sul já foram escolhidos.

Além disso, a maison apresenta em São Paulo, na terça-feira (9), um desfile que mistura peças da sua última coleção, mostrada em março na semana de moda de outono e inverno de Paris, com outras exibidas no desfile comemorativo do centenário de Pierre Cardin, em julho do ano passado, em Veneza.

As novas peças foram desenhadas pela equipe da casa depois da morte de Cardin, seguindo o legado do estilista. No desfile de Paris, a inspiração veio dos arquivos da marca dos anos 1970. Na passarela se viram vestidos em roxo, rosa e verde com recortes geométricos e aplicações de círculos pretos, um casaco de pele sintética laranja com cones dourados no peito, e ternos masculinos com botões prateados. Tudo produzido com materiais reaproveitados do estoque da empresa.

É o próprio Basilicati-Cardin que, usando sua formação em piano clássico e design de interiores e sua experiência de décadas trabalhando ao lado do tio, aprova as novas peças e decide o que vai ser produzido.

“Delicada é a tradução do desenho até a realidade. Como temos uma influência muito forte da arquitetura, acontece de a gente precisar de técnicas na fabricação que vem mais do design do que da alfaiataria, porque são roupas estruturadas”, diz.

A reutilização de tecidos, o desenvolvimento de materiais ecológicos e a economia de água na fabricação de roupas estão norteando as novas coleções da marca. Os 20 profissionais do ateliê em Paris criam cerca de 1.000 peças por ano e, por mais que eles tenham o pensamento ecologicamente responsável em mente, Basilicati-Cardin diz que é difícil replicar isto nos 60 países nos quais a grife está presente por meio de licenciamentos, com produções locais.

No Brasil, a etiqueta comercializa a linha masculina. São jaquetas, camisas, polos e calças em tons sóbrios, sem estampas ou com padronagens clássicas como xadrez, nada ousado. A moda feminina só é vendida na Itália, na França e na China. Isto porque era o próprio Pierre Cardin que desenhava as roupas para mulheres em Paris e, atento a cada detalhe, hesitava em passar seu conhecimento para terceiros ao redor do mundo, que poderiam desfigurar os códigos da marca, conta o sobrinho.

Há planos para desenvolver uma linha feminina junto a designers brasileiros e lançá-la por aqui, mas isto não é para já e só deve acontecer quando a marca chegar em peças que tenham uma influência local sem perder a assinatura da Pierre Cardin, definida pelo sobrinho como “haut prêt-à-por·ter”, algo como uma alta costura mais acessível -embora não exatamente barata.

JOÃO PERASSOLO / Folhapress

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