FOLHAPRESS – O novo disco do Foo Fighters é inteiramente dedicado ao luto da banda pela morte de Taylor Hawkins. Já dava para imaginar que esse seria o teor das novas composições do frontman Dave Grohl após o trágico incidente com o baterista na Colômbia, durante uma turnê internacional da banda, em março do ano passado.
Justifica também o título do álbum, “But Here We Are”, algo como “Mas Aqui Estamos” em português, que aponta para a continuidade da banda, apesar de tudo. Mas a vida pregou mais uma peça em Grohl, o que deixa as letras do disco ainda mais doloridas: o vocalista perdeu a mãe duas semanas após o falecimento do baterista.
Das dez faixas de “But Here We Are”, quatro já haviam sido liberadas como singles previamente: “Rescued”, “Under You”, “Show Me How” e “The Teacher”. “Rescued” abre o álbum com toda a energia instrumental da banda e seu jeito particular de compor rock, unindo hardcore e punk.
Na letra, o vocalista parece buscar uma conexão com alguém que não pode respondê-lo e no refrão intercala a pergunta “isto está acontecendo agora?” com a resposta “isto está acontecendo agora”. O resgate que busca, explicitado no título, é para sair da escuridão e poder dançar sob as luzes –um direito que todos merecem, inclusive reis e rainhas.
“Under You” traz imagens mais visíveis da relação entre Grohl e Hawkings, além de explicitar o desamparo que o primeiro sente. Por isso mesmo, talvez ela seja uma das letras mais tristes do álbum, especialmente nos versos em que é a relação íntima entre os músicos que está colocada, em tradução livre: “Alguém disse que nunca mais verei seu rosto novamente/ Uma parte de mim não consegue acreditar que isso seja verdade/ Fotos nossas compartilhando músicas e cigarros/ É assim que sempre vou lembrar de você”. Mas Grohl ainda consegue expressar o sentimento mais universal do luto ao cantar que tem dias que acha que já superou, mas logo percebe que não é possível superar uma perda.
Em termos formais, as estruturas das músicas de “But Here We Are” não trazem nenhuma novidade em relação à sonoridade e estilo do Foo Fighters. A maior surpresa nesse trabalho é que eles soam mais com o que lançaram nos anos de 1990, quando a banda começou. Ou seja, um quase retorno às raízes do grunge, soando mais crua e com vocais mais rasgados.
Talvez porque Grohl iniciou o projeto logo após a dissolução do Nirvana, com a morte de Kurt Cobain. Cumprindo a missão musical e de vida que impôs para si, Grohl, desde quando fundou o Foo Fighters e reuniu, definitivamente, os músicos que hoje fazem parte da banda, tenta manter a chama do rock acesa, ainda que sem grandes mudanças.
Um ponto fora da curva no disco é “The Teacher” e seus dez minutos de duração. Igualmente dolorida, nela o luto parece se referir mais à perda da mãe. Em um vídeo lançado no YouTube com colagem de inúmeras imagens e efeitos, aparecem trechos de vídeos em VHS de crianças e adolescentes que, creio, sejam do próprio Grohl. Dentre as imagens, vemos também o Rio
Ganges e o ritual de cremação que acontece em suas margens. A catarse vem no final, em que o último verso, de apenas uma palavra, é cantado de maneira gritada: “Goodbye” (“Adeus”). E, no vídeo, salta rapidamente uma imagem de Grohl com Virginia.
O vocal quase gutural também marca o refrão da faixa-título, “But Here We Are”, que contrasta com as demais partes, em que a voz parece estar um passo atrás do andamento da música. Enquanto em “Hearing Voices” a formulação do luto é total e diz respeito a ambas as perdas. Sua estrutura musical é mais circular e é uma canção à qual a versão acústica cai perfeitamente, o que é demonstrado, inclusive, nos segundos finais, em que sobram apenas Grohl e sua guitarra.
Um dos grandes destaques do álbum é “Show Me How”, em que Dave Grohl canta em dueto com sua filha mais velha, Violet, que já se apresentou nos palcos com o pai algumas vezes. Violet tem uma voz doce e calma, o que pode ter influenciado no fato de que a música tem uma pegada mais leve nas guitarras e traz aspectos do dream pop.
O Foo Fighters é, há tempos, uma banda que direciona suas produções para funcionar no modelo de show de estádio, para grandes públicos. As músicas que não se encaixam nesse quesito, são, geralmente, esquecidas. No entanto, em “But Here We Are”, todas as músicas poderiam fazer parte de um grande espetáculo em memória de Hawkings. Nos shows mais recentes, a banda só apresentou os singles lançados previamente, evitando dar spoilers aos fãs. Mas não dá para saber como farão de agora em diante.
Caso façam um show em que toquem o disco novo na íntegra, ele terminará de maneira não menos triste do que começa, com a acústica e sussurrada “Rest”, que formula a única ideia que pode confortar um coração devastado pela perda, a de que a pessoa amada pode, agora, descansar em paz.
BUT HERE WE ARE
Quando: Lançamento na sexta (2) nas plataformas de streaming
Autoria: Foo Fighters
Gravadora: Roswell/RCA
Avaliação: Bom
PÉROLA MATHIAS / Folhapress