Jantares excêntricos no antigo prédio da Telesp atraem novos públicos ao centro de SP

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Uma grande mesa posta dentro de um túnel em obras, sobre uma ponte desativada, ou em meio às quinquilharias esquecidas em um prédio abandonado. Em tempos de eventos secretos e escondidos, é difícil não aguçar a curiosidade ao ver os registros dos rolês promovidos pelo produtor cultural Kauê Fuoco.

Idealizador do Kura, uma “incubadora de experiências ressignificativas de reintegração”, ele promove shows, jantares e festas em lugares inusitados que, nem de longe, seriam ideais para receber esse tipo de evento. Cada temporada das experiências tem um enredo próprio e acontece em um local diferente, e depois nunca mais -efemeridade que atiça ainda mais o interesse de quem quer fugir da mesmice da cena paulistana.

A temporada atual, “Pizza & Jazz”, começou em abril, quando Kauê foi convidado a ocupar o antigo prédio da Telesp, no centro de São Paulo. Abandonado há mais de uma década, o prédio foi adquirido pela incorporadora Metaforma que, incentivada pelo programa Requalifica Centro, pretende transformá-lo em um condomínio residencial de alto padrão, com 282 apartamentos.

Seguindo o exemplo das melhores arquiteturas do centro, o térreo do Basílio 177 será vivo e permeável: um food hall chamado Ramal conectará as ruas Sete de Abril à sua paralela, Basílio da Gama, com filiais das melhores opções gastronômicas da cidade.

Enquanto as obras não começam, Fuoco, já bastante experiente em transformar lugares abandonados em rolês excêntricos, é o responsável por reconstruir as relações do prédio com o seu entorno -que a incorporadora prefere chamar de “centro criativo de São Paulo”. O termo faz referência aos inúmeros negócios criativos instalados na vizinhança, como os ateliês artísticos do Edifício Califórnia, as lojas e estúdios da Galeria Metrópole e os espaços culturais que circundam o Edifício Copan, como o Pivô e a Verve Galeria.

“Meu pai era dono de casa de show e eu estudei produção cultural, então o que eu sempre soube fazer eram eventos, que eu passei a considerar como minhas artes”, explica Kauê, relembrando as primeiras experiências que montou. “Eu não queria lucrar ou me divertir, mas fazer uma experiência artística com começo, meio e fim, e que provocasse uma reflexão sobre a nossa relação com a cidade e com os lugares.”

Para trazer as pessoas novamente para dentro do prédio, Kauê primeiro transferiu para lá o seu ateliê, que mais parece um laboratório do Dexter pós-apocalíptico, cheio de materiais esquecidos dentro do prédio e que estavam fadados a ir para o lixo.

Depois, com os mesmos materiais, que incluem um piano velho, monitores de tubo, mesas feitas com painéis de senhas e até as gigantescas centrais telefônicas da Telesp, montou ali uma exposição de artes plásticas e visuais chamada “Irrealidades Invisíveis” e também um grande salão de restaurante. Numa atmosfera meio kitsch, meio burlesca, é lá que acontecem as noites de Pizza e Jazz.

A “jornada” da experiência começa pela Rua Basílio da Gama, sem saída, onde um pequeno hall decorado com antigas centrais telefônicas recebe os visitantes. Logo uma voz grossa e teatral de um cicerone convida para subir dois lances de uma estreita escadinha que leva ao andar de cima.

Lá, o anfitrião conta a história do prédio, convida para uma visita ao ateliê e explica como tudo funciona: o rodízio de pizza está incluso no valor do ingresso (R$ 180), as bebidas são à parte (R$ 45 a taça de vinho) e as mesas são compartilhadas, sem lugares marcados. Quem quiser, pode vestir o avental e preparar suas próprias pizzas -sob a supervisão de um pizzaiolo, é claro.

Quem não quiser botar a mão na massa pode só se sentar e ser servido enquanto joga conversa fora e curte o animado jazz de Adriano Grineberg, habitué da programação do Blue Note, na avenida Paulista. Mas como explica Fuoco, parte da graça da experiência está justamente na participação de público.

“A ideia é que as pessoas participem não como espectadores, mas como protagonistas. Isso significa ir a fim de fazer coisas e interagir”, explica o produtor. “Por isso que os jantares são diferentes a cada noite. Se o público participa, é uma coisa; se são mais tímidos, é outro evento.”

Embora pagar para ajudar a preparar o próprio jantar em um ambiente decadente possa parecer uma cilada, poder ir além do simples sentar e comer, e até servir os amigos em um espaço que parece outra realidade tem seu valor. Não à toa, os ingressos se esgotam rapidamente, trazendo ao mal cuidado centro de São Paulo até mesmo as patricinhas dos chiquetosos e bem-acabados restaurantes dos Jardins e da Vila Olímpia.

KURA – PIZZA&JAZZ

Quando qui. a sáb., das 20h às 2h, até 16/6

Onde Rua Basílio da Gama, 177, República, região central

Preço R$180

Link: https://www.instagram.com/kura.te/

Instagram https://www.instagram.com/kura.te/Ingressos

ingresse.com/kurapizzajazz

GABRIEL JUSTO / Folhapress

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