‘Macbeth’ se perde entre o tom solene e o diálogo com o tempo presente

FOLHAPRESS – Há um forte interesse atual por “Macbeth”, com diversas adaptações para teatro e também para cinema – para citar duas: a diretora brasileira Christiane Jatahy, em 2021, misturou a tragédia de Shakespeare ao livro “A queda do céu”, de Davi Kopenawa, no espetáculo “Antes que o céu caia”, que tem circulado pela Europa; e Joel Cohen adaptou para cinema, também em 2021, uma versão de “Macbeth” protagonizada por Denzel Washington e a atriz três vezes vencedora do Oscar, Frances MacDormand.

A tragédia de Shakespeare sobre um regicídio e sobre a tomada violenta do poder após a profecia de três bruxas parece encontrar diversos pontos de conexão com os regimes autoritários da atualidade, com o obscurantismo religioso ou com a cobiça sanguinária e destrutiva pelo poder.

A montagem paulistana do grupo Eco Teatral, contudo, propõe uma conciliação difícil de ser realizada. Ao mesmo tempo em que nota as reverberações contemporâneas da tragédia escrita nos primeiros anos do século XVII, também não quer se afastar demasiadamente do clássico e de seu ambiente medieval e palaciano.

Nesta empreitada paradoxal, ambos os desejos ficam comprometidos. As conexões com a atualidade são rarefeitas e passageiras: personagens trocam mensagens por celular, outros fumam e há algumas referências desencontradas aos debates atuais de gênero e de raça.

O saldo final é uma atualização incompleta, que insere elementos contemporâneos pontuais no andamento da tragédia, mas não consegue fazer com que ela realmente salte sobre o tempo presente.

Por outro lado, a montagem propõe uma aproximação problemática ao material original. A leitura da obra de Shakespeare, como acontece muito frequentemente, é marcada aqui por uma visão romântica e idealista do teatro elisabetano, com pouca atenção para as suas características populares, como os personagens e situações marginais ou o movimento dúplice que faz com que as tragédias de Shakespeare sejam, num só tempo, profundamente líricas e obscenamente cômicas.

Desde o século 19, boa parte das leituras, adaptações e montagens das tragédias do velho bardo seguem colocando a ênfase num tipo de grandiloquência profunda, com interpretações psicológicas e afetadas -um estilo que não duraria nem cinco minutos no ambiente caótico da cena elisabetana.

Na versão do grupo Eco Teatral, o resultado é um conjunto de longos e penosos monólogos sobre os estados de espírito das personagens; uma leitura excessivamente literária do clássico teatral, que faz com que os atores fiquem mais preocupados com seus textos do que com as interações.

Do mesmo modo, a encenação de Thiago Franco Balieiro se dedica a criar um ambiente sombrio, com efeitos de luz e som, mas tem pouca atenção para o mecanismo teatral objetivo e concreto das situações shakespearianas.

Trata-se, contudo, de um grupo jovem, com visível comprometimento e empenho no trabalho de criação. Ao que tudo indica, é uma companhia interessada em atuar em espaços experimentais e com condições para enfrentar o clássico com maior destemor e mais liberdade autoral, sem deixar de lado a curiosidade histórica pela fascinante estrutura teatral da tragédia elisabetana.

MACBETH

Avaliação Regular

Quando Até 8 de maio; Sáb. e seg. às 20h; dom., às 18h

Onde Teatro de Contêiner – r. dos Gusmões, 43, São Paulo

Preço De R$ 20 a R$ 40Classificação 16 anos

Autoria William Shakespeare

Elenco Arthur Alfaia, Camila Ferrazzano, Chrystian Roque, Eduarda Kortmann, Emmanuelle Barcelos, Giovanna Barros, José Lucas Bello, Marco Canonici, Marcelo Villas Boas e Thiago Franco Balieiro

Direção Thiago Franco Balieiro

PAULO BIO TOLEDO / Folhapress

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