RECIFE, PE (FOLHAPRESS) – De olho na reeleição em 2024, o prefeito do Recife, João Campos (PSB), tem feito uma guinada à esquerda na sua forma de governar e de agir politicamente na capital pernambucana.
Aliado do presidente Lula (PT), João Campos busca penetração maior no eleitorado petista da cidade para deixar para trás os entreveros gerados em 2020 na disputa acirrada contra o PT no Recife.
Durante a campanha eleitoral, ainda como candidato, João Campos fez diversas críticas ao PT e citou escândalos de corrupção com envolvimento da legenda. Ele venceu a prima de segundo grau, a ex-deputada federal Marília Arraes, que concorreu pelo PT e atualmente está no Solidariedade.
Na ocasião, João Campos prometeu que não daria cargos para petistas na prefeitura durante o mandato.
Em março de 2022, porém, o prefeito nomeou dois integrantes indicados pelo PT para secretarias da gestão municipal. A alegação, desde então, é que o movimento replica a aliança nacional formalizada em 2022 com a chapa de Lula e Geraldo Alckmin (PSB) para a disputa presidencial.
O acerto com o PT, inclusive, foi o ponto-chave para João Campos avançar em articulações com outros partidos, como União Brasil e PSD.
Como contrapartida, o PT espera ocupar a vaga de vice na chapa de João Campos em 2024. A atual vice-prefeita, Isabella de Roldão (PDT), tem chances reduzidas de disputar a reeleição com João.
O objetivo dos petistas é valorizar o partido ao ocupar a vice de João. A tendência é que, pela primeira vez desde a redemocratização, o PT, que governou a cidade entre 2001 e 2012, não lance candidatura própria.
Por outro lado, o PT vive sob incerteza se João Campos quer um petista como seu vice. Isso porque há possibilidade de o prefeito ser candidato a governador em 2026, o que levaria o vice a assumir o comando do Recife.
A relação entre PT e PSB é nutrida por momentos de unidade e tensão desde 2012. Foram dois rompimentos desde então e uma campanha recheada de ataques, a de 2020. Por isso, os dois partidos se veem sob desconfiança localmente, ainda que em momentos de convivência pacífica e divisão de espaços de poder.
Na parte programática, João Campos também tem buscado adaptações na forma de atuação para acenar ao eleitorado mais à esquerda da cidade.
Eleito após derrotar o PT, João Campos adotou um discurso mais afastado da esquerda no primeiro ano de governo municipal. Entre as ações que desagradaram o segmento está a reforma da previdência dos servidores públicos, feita em 2021 após aprovação da Câmara.
Outro discurso em que o prefeito investiu e é um tabu para parte da esquerda são as concessões à iniciativa privada. A gestão de João Campos tornou pública, ainda em 2021, a intenção de entregar a gestão de seis parques da cidade à iniciativa privada.
Petistas ouvidos sob reserva pela Folha dizem que o partido espera que o prefeito do Recife não avance nesse tipo de agenda, para não gerar eventuais ruídos na relação entre os dois partidos.
O PT atualmente tem três vereadores, que atuam neste ano na base aliada de João Campos. Uma das parlamentares petistas, a vereadora Liana Cirne, inclusive é cotada para ser indicada pelo PT como vice do prefeito na disputa de 2024.
Para acenar ao eleitorado lulista, João Campos tem feito gestos ao público desde a campanha eleitoral, quando subiu em palanques ao lado do então candidato Lula no Recife e também no interior.
Na administração, o prefeito teve audiências com movimentos sociais e sindicatos ligados ao PT após o partido ocupar duas secretarias na máquina municipal.
A retribuição política também é feita pelo governo federal. Neste ano, João Campos já foi convidado pelo governo Lula para uma reunião de um grupo restrito de prefeitos no Palácio do Planalto e foi um dos que teve o microfone livre para discursar.
Em abril, Lula assinou um termo para autorizar a operação de crédito de R$ 2 bilhões do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) para o Recife. O governo federal é o garantidor do empréstimo, que teve aprovação do Senado.
O volume de recursos é tido nos bastidores da prefeitura como determinante para elevar a popularidade do prefeito. O montante será destinado predominantemente a áreas de risco em morros.
As chuvas que deixaram 128 mortos no Grande Recife em maio de 2022 desgastaram os gestores públicos locais, entre eles João Campos. O objetivo do prefeito é usar o empréstimo bilionário como um ponto de virada.
O encontro para selar o empréstimo no Palácio do Planalto foi alardeado por João Campos nas redes sociais.
No PT, a percepção predominante é que João Campos faz acenos a Lula e ao PT por cálculo eleitoral e político. A legenda avalia que o prefeito quer ser reeleito no primeiro turno em 2024 e mira a eleição do Governo de Pernambuco em 2026, que já tem como candidata natural à reeleição a governadora Raquel Lyra (PSDB), sua adversária.
Já no PSB, a leitura é a de que a aproximação é natural diante da chapa Lula-Alckmin. A interlocutores, João Campos diz que, apesar das rusgas anteriores com o PT, os dois partidos têm mais convergências que divergências e enfatiza que jamais fez críticas duras a Lula, com quem seu pai, o ex-governador Eduardo Campos (1965-2014) tinha boa relação.
“Na dinâmica da política, João fez os movimentos locais de acordo com o cenário nacional. Na eleição de 2020 para 2022, ocorreram muitas mudanças no cenário local e nacional e, naturalmente, no Recife, houve consequências disso”, diz o líder do governo, o vereador Samuel Salazar (MDB).
O prefeito também emplacou o superintendente da Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba) em Pernambuco em indicação conjunta com o deputado federal Silvio Costa Filho (Republicanos) no governo Lula. No acordo, o PT indicou a chefia da companhia em Petrolina, no sertão pernambucano.
JOSÉ MATHEUS SANTOS / Folhapress