BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) concluíram na noite desta segunda-feira (24) o julgamento da primeira leva de denunciados de participação nos ataques golpistas de 8 de janeiro. Eles tornaram réus cem acusados de serem executores e autores intelectuais dos atos.
Sete ministros seguiram o entendimento do relator, Alexandre de Moraes, pelo recebimento das denúncias contra todos os suspeitos. O julgamento do mérito das acusações, que vai condenar ou absolver os acusados, ainda não tem data definida.
Os dois indicados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) na corte, ministros Kassio Nunes Marques e André Mendonça, divergiram parcialmente de Moraes e defenderam que apenas as denúncias dos supostos executores dos atos deveriam ser acolhidas no caso de Kassio, mesmo assim com uma série de ressalvas.
Votaram com Moraes os outros ministros: Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Edson Fachin, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Rosa Weber.
A primeira leva de denúncias do 8 de janeiro é formada por 50 pessoas investigadas no inquérito dos executores e outras 50 na ação dos instigadores e autores intelectuais.
Kassio e Mendonça apresentaram seus votos nos dois inquéritos em análise horas antes do fim do prazo do julgamento no plenário virtual, que se encerrou na noite desta segunda.
A primeira divergência dos dois é em relação ao foro do julgamento. Ambos consideram que a ação deveria ser analisada pela Justiça Federal do Distrito Federal, não pelo STF.
No caso de a competência do Supremo ser reconhecida, como foi pela maioria dos ministros, eles argumentam que não há elementos para acolher as denúncias sobre os acusados de serem instigadores e autores intelectuais dos ataques
Em relação aos instigadores e autores intelectuais, Kassio argumentou que o grupo é formado pelos manifestantes que estavam no QG do Exército em Brasília e “lá permaneceram, não havendo quaisquer elementos a apontar que tivessem participado, sob qualquer forma, dos atos de vandalismo ocorridos na praça dos Três Poderes”.
“Com as mais respeitosas vênias, de tudo quanto foi exposto, entendo que não se pode caracterizar a justa causa para instauração da ação penal lastreada no simples fato de alguém estar acampado ou ‘nas imediações do Quartel-General do Exército’ em Brasília, sem que se demonstre e individualize sequer uma conduta criminosa atribuída aos denunciados”, escreveu o magistrado.
Sobre os acusados de serem executores dos ataques, Kassio apresentou uma série de ressalvas.
Além de defender que a competência do caso não é do STF, ele disse que apenas parte dos crimes imputados deveria ser reconhecida: no caso, “dano qualificado pela violência e grave ameaça, com emprego de substância inflamável, contra o patrimônio da União e com considerável prejuízo para a vítima”; “abolição violenta do Estado democrático de Direito”; e “deterioração de patrimônio tombado”.
Nesse sentido, o ministro também disse que não deveriam ser reconhecidas as denúncias pelos crimes de “associação criminosa armada” e “golpe de Estado”.
Em palestra em São Paulo nesta segunda-feira, Mendonça já havia indicado que poderia divergir da maioria. Ele chegou a afirmar que enfrentava um “dilema ao julgar se tornaria réus o grupo de detidos em frente ao Comando do Exército no dia seguinte aos atos.
Disse que era preciso distinguir a situação desse grupo daquele das 50 pessoas que foram presas por envolvimento direto nos atos de depredação na praça dos Três Poderes.
O magistrado também afirmou ainda que não cederia a pressões e lembrou o julgamento do ex-deputado Daniel Silveira, acusado de ofender ministros do Supremo.
Mendonça, no entanto, votou pelo recebimento da denúncia contra os supostos executores em relação a todos os crimes imputados.
“Aqui [no inquérito dos executores], as prisões se deram em meio a atos de violência, depredação, enfrentamento, medo, corre-corre. De outro lado, as prisões do dia posterior se deram em contexto completamente diverso”, escreveu o ministro em seu voto.
O Supremo analisou nos últimos dias primeira leva de julgamentos das 1.390 pessoas denunciadas pela PGR (Procuradoria-Geral da República) por participarem dos ataques. O julgamento começou a ser feito no plenário virtual da corte na terça (18).
Relator da investigação, Moraes sustentou a existência de justa causa para a abertura de ação penal de todos os acusados.
A pedido do ministro, a presidente do Supremo, Rosa Weber, já pautou a análise de um segundo pacote de denúncias da PGR. Esão sendo analisados 200 casos em julgamento que começou nesta terça-feira (25) e também terá o prazo de uma semana.
Em seu voto, o ministro relator afirmou que parte dos denunciados, segundo apontou a Procuradoria, integrava o núcleo responsável pela execução dos atentados materiais contra as sedes dos três Poderes.
Segundo Moraes, outros associaram-se, por intermédio de uma estável e permanente estrutura montada em frente ao Quartel General do Exército Brasileiro, “aos desideratos criminosos dos outros coautores, no intuito de modificar abruptamente o regime vigente”.
Ainda conforme o voto, havia o interesse de insuflar as Forças Armadas e a população à tomada do poder e à subversão da ordem política e social, gerando, ainda, animosidades entre os militares e as instituições republicanas.
Moraes reiterou não haver dúvidas sobre a competência do STF para analisar as denúncias e, caso sejam recebidas, para processar e julgar a ação penal.
CONSTANÇA REZENDE E RICARDO DELLA COLETTA / Folhapress