SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Do seu apartamento em Londres, Jayda G só falta pedir desculpas ao Brasil. A primeira vez da DJ canadense no país foi em 2018, como um dos nomes que recheavam o já repleto cartaz do festival Dekmantel.
Sua segunda vez, porém, não será neste mês de abril –agora como atração principal do festival Gop Tun, em São Paulo. Jayda esteve no país no ano passado. À paisana, em outra missão, passou longe de baladas.
“Não fui para tocar. Espero que meus fãs no Brasil não fiquem bravos comigo”, diz, rindo. A tarefa no país lhe era tão cara quanto sua devoção às pistas, lugar que a DJ de house vem dominando cada vez mais nos últimos anos. Vestindo o chapéu de bióloga –sua formação–, a Jayda especialista em meio ambiente esteve no país para filmar um documentário sobre poluição e natureza.
“É um filme sobre ecossistemas que são muito bons em capturar carbono da atmosfera e levá-los para o solo, como os mangues, então era óbvio que eu tinha de ir ao Brasil”, conta, lembrando que também deu um jeito de trazer música para o foco das lentes.
“Eu encontrei com Seu Jorge e o entrevistei sobre este tema, porque ele é um ativista importante, e no fim ele tocou uma música para a gente. Ali tive de dar o meu melhor para me manter calma!”
Quando agita freneticamente as mãos, emulando a calma que virou nervosismo no encontro com o ídolo, Jayda lembra a DJ que é. Suas performances de repertório esmerado e vigorosa energia, em que dança como se fosse parte da pista, a alçaram ao topo da house music atual, estampando capas de revistas especializadas e cartazes com seu nome em letras garrafais.
É um feito. Nas últimas décadas, a house music se agigantou em correntes comerciais que ganharam força em festivais pirotécnicos e clubes sofisticados. Jayda, na contramão, retomou o protagonismo das mulheres negras no gênero como não se via desde figuras como Loleatta Holloway e Crystal Waters.
A canadense é hoje parte dessa linhagem ao lado de nomes como a norte-americana Honey Dijon e a brasileira Valentina Luz, mulheres negras que perpetuam a essência do house entre tradição e modernidade.
“Estamos apenas reclamando nosso gênero porque, no fim das contas, pessoas negras e a comunidade LGBTQIA+ é que deram origem a essa música”, diz a artista. “A house music surgiu para que as pessoas pudessem se expressar, serem elas mesmas, se sentirem seguras. É um tipo de música que fala comigo e me faz querer dançar.”
Essa retomada ganhou um empurrão quando Beyoncé lançou seu último álbum, “Renaissance”, no ano passado. O disco é uma ode à cultura de pista noventista embebido no house de Chicago, seu espírito de redenção e curtição.
Sem cair para quem vê apenas uma popstar surfando no momento ou para a ala da base de fãs, Jayda colhe os frutos. “Lembro que quando Beyoncé lançou esse disco, Oprah escreveu sobre outras produtoras negras de house e eu estava na lista”, diz. “Estou me beneficiando dessa chegada do house ao mainstream. Na última vez em que estive no Brasil, era mais underground.”
No ano seguinte à sua primeira vinda ao país, em 2019, Jayda lançou seu primeiro álbum, “Significant Changes”, algo como mudanças significativas. “Esse disco é quase uma homenagem ao meu mestrado, porque o título dele foi o termo mais utilizado por mim na tese.”
Essa era uma das referências que poderia trazer à pista uma jovem bióloga criada numa pequena cidade canadense. “Não tinha baladas na minha cidade e mesmo Vancouver tem uma cena pequena”, conta.
De lá para cá, Jayda foi nomeada ao Grammy com a faixa “Both of Us”, gravou com Dua Lipa, entrou para o rol dos DJs que dão a volta ao mundo no circuito dos principais clubes da música eletrônica e recebeu convite para elencar a histórica série de discos DJ-Kicks –uma referência para ela mesmo durante a adolescência.
O próximo grande passo de Jayda é lançar o segundo álbum. “Guy” será uma viagem íntima à sua própria criação. “Meu pai faleceu quando eu tinha dez anos, e ele esteve doente por muito tempo, então gravou a si mesmo falando sobre sua vida durante onze horas”, lembra. “Esta é a base deste disco, um projeto em que cada música é uma mensagem a partir do que meu pai diz ou das observações que fiz com esses vídeos.”
Para o álbum, Jayda contou com uma equipe maior e fez aulas de canto. A ajuda veio a calhar não só pela complexidade do trabalho, diz ela, mas porque suas atividades como ambientalista cobram seu tempo.
“O Brasil tem um papel importante no ecossistema global, ainda mais com todo o desmatamento que tem acontecido, mas acredito que as coisas estão mudando desde as eleições do ano passado,” afirma, sem esconder seu espanto com a geografia paulistana. “Era tanto concreto, mas também tanta vegetação tomando conta de tudo, que parecia que eu estava no futuro.”
GOP TUN FESTIVAL
Quando: Neste sábado, dia 22, às 14h
Onde: Complexo Canindé – r. Comendador Nestor Pereira, 75
Preço: R$ 170
Classificação: 18 anos
Ingressos: https://www.ingresse.com/goptunfestival2023
FELIPE MAIA / Folhapress