Em uma vitória para as plataformas de redes sociais, a Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu a favor do Twitter e do Google em processos que argumentavam que as companhias deveriam ser responsabilizadas por incentivar o terrorismo ao abrigarem conteúdos pró-Estado Islâmico.
A expectativa era que uma decisão contrária às redes abriria um precedente para permitir que as empresas fossem processadas por conteúdos publicados por usuários. Isso poderia mudar a internet no mundo todo, uma vez que essas companhias têm sede nos Estados Unidos.
Críticos argumentavam que seria uma violação à liberdade de expressão, enquanto especialistas do outro lado afirmavam que as redes não poderiam ser blindadas de responsabilização por abrigarem discurso de ódio e conteúdo violento e extremista, além de empurrarem usuários para a radicalização por meio de recomendações de algoritmos.
Nas decisões desta quinta-feira (18), porém, a Suprema Corte decidiu não abordar o artigo de lei que protege as plataformas por conteúdo de usuários e tratou apenas do incentivo ao terrorismo nos casos analisados. Assim, manteve-se a proteção legal às companhias.
O caso contra o Twitter envolvia um ataque a uma boate em Istambul, na Turquia, na madrugada de 1 de janeiro de 2017. O tiroteio, promovido por um partidário do grupo terrorista Estado Islâmico, matou 39 pessoas. A família de uma das vítimas, Nawras Alassa processou o Twitter e outras empresas sob a acusação de que violaram a Lei Antiterrorismo, argumentando que o Estado Islâmico havia usado as redes como plataformas para recrutar militantes.
Em decisão unânime nesta quinta, a Suprema Corte afirmou que a família de Alassaf não conseguiu provar que “os réus ajudaram e incentivaram o Estado Islâmico a realizar o ataque”, como estabelece a lei.
“Conforme alegado pelos demandantes, os réus criaram plataformas virtuais e conscientemente falharam em fazer ‘o suficiente’ para remover usuários ligados ao Estado Islâmico e conteúdo relacionado ao Estado Islâmico -de centenas de milhões de usuários em todo o mundo e um imenso oceano de conteúdo- de suas plataformas. No entanto, os demandantes falharam em mostrar que os réus forneceram intencionalmente qualquer ajuda substancial ao ataque de Reina [nome da boate em Istambul] ou participaram conscientemente do ataque de Reina -muito menos que os réus ajudaram o Estado Islâmico de forma tão difundida e sistêmica a ponto de torná-los responsáveis por todos os ataques do Estado Islâmico”.
Em outro caso, Google Vs. González, a família de Nohemi Gonzalez, uma estudante de intercâmbio americana que morreu nos ataques do Estado Islâmico em Paris em novembro de 2015, argumentava que o YouTube deveria ser responsabilizado por promover conteúdo do grupo terrorista.
Além da Lei Antiterrorismo, o processo questionava a Seção 230 da Lei de Decência das Comunicações, artigo da legislação federal de 1996 que protege as plataformas de ações na Justiça por conteúdos postados pelos usuários.
Na decisão desta quinta, a Suprema Corte, de forma também unânime, afirmou que não abordaria o artigo, esquivando-se assim da mudança que, segundo especialistas, poderia mudar o mercado das redes sociais no mundo todo. Em breve decisão desta quinta, o tribunal americano retornou o caso do Google a instâncias inferiores e afirmou que ele deveria ser analisado “à luz da decisão do Twitter”.
“Continuaremos nosso trabalho para proteger a liberdade de expressão online , combater conteúdo prejudicial e apoiar empresas e criadores que se beneficiam da Internet”, disse Halimah DeLaine Prado, conselheira geral do Google, em comunicado.
Com isso, nada muda por ora na discussão americana, que também está em pauta no Brasil. Deve entrar na pauta da Câmara em Brasília nos próximos dias o PL 2630, conhecido como PL das Fake News, que obriga que as empresas atuem contra conteúdos que incentivem terrorismo e crimes de ódio. As empresas podem ser punidas mesmo antes ordem judicial se descumprirem de forma generalizada o dever de mitigar e combater conteúdo ilegal.
Atualmente, vigora no Brasil o Marco Civil da Internet, de 2014, que estabelece que empresas só podem ser punidas civilmente por conteúdo de terceiros se não removerem após ordem judicial, a não ser nos casos de nudez não consentida ou violação de propriedade intelectual.
THIAGO AMÂNCIO / Folhapress