‘The Idol’, do criador de ‘Euphoria’, leva overdose de fama à fórmula de sexo

CANNES, FRANÇA (FOLHAPRESS) – Delineado pelo rubro intenso dos lençóis, o corpo de Lily-Rose Depp vai se revelando aos poucos na abertura da série “The Idol”, coberto apenas por uma fina lingerie. Sexy, confusa, divertida, vai gritando o fotógrafo, causando mudanças na feição da atriz.

Até que os seios saem do corselet. Não pode, diz o coordenador de intimidade, ali para garantir que o corpo da protagonista seja respeitado. Mas ninguém, nem ela, liga. Sexo vende, eles sabem, e os criadores de “The Idol” também devem saber.

Não há pudor no retrato que a série faz do showbiz, e os seios de Depp são uma amostra bastante inocente do que está por vir. Não demora muito para o público ver a protagonista se masturbar, ser penetrada com um gelo, ser asfixiada por um lenço e ter o rosto coberto por sêmen.

Com “Euphoria”, acreditou-se, Sam Levinson havia alcançado o limite da pornografia permitida numa série de prestígio de um estúdio como a HBO. Mas “The Idol” vai despudoradamente além e conseguiu sair do Festival de Cannes, na semana passada, com o título de obra mais escandalosa da edição.

Criada por Levinson, Reza Fahim e The Weeknd, cantor que quer abandonar a persona que criou para si e reivindicar o nome real, Abel Tesfaye, “The Idol” estreia neste domingo (4) cercado de olhares curiosos, que querem entender o porquê de a HBO ter divulgado que este era um projeto concebido por mentes doentias e deturpadas.

Para além do teor sexual dos episódios, a produção chamou ainda mais a atenção ao se ver numa polêmica com a revista americana Rolling Stone, que publicou que seu set de filmagem era um ambiente tóxico e misógino, faces da indústria de entretenimento nas quais a trama quer justamente dar um tapa.

Ler os roteiros era como consumir pornô de tortura, teria dito uma fonte anônima à publicação, que também afirmou que a saída da diretora Amy Seimetz, que deu um chacoalhão criativo no projeto, teria ocorrido porque Tesfaye achava que ela estava abraçando uma perspectiva demasiadamente feminina.

“Nós nos divertimos muito fazendo essa série. Foi criativamente desafiadora da melhor forma possível. O Sam e o Abel valorizavam minhas opiniões sempre, deixando tudo muito colaborativo. Eu não poderia ter pedido por uma experiência melhor”, disse Depp em sua passagem por Cannes, no quarto de um dos vários hotéis de luxo da Riviera Francesa, rejeitando a polêmica.

Curiosamente, ela e o pai estiveram na mesma edição do festival, cada um com as suas controvérsias. Ela, a da própria série, mal avaliada pelos críticos presentes. Ele, com “Jeanne du Barry”, primeiro filme depois do julgamento contra a ex-mulher Amber Heard, com quem tinha um relacionamento tão tóxico quanto o retratado em “The Idol”. A atriz, no entanto, se limita a dizer que está orgulhosa do pai, se esquivando da questão.

Em “The Idol”, Tesfaye é Tedros, o dono de uma boate frequentada pela nata de Los Angeles. Depp é Jocelyn, diva pop à la Britney Spears que exala sexo e acumula problemas pessoais, que se agravam quando os dois engatam um romance.

A série começa com a artista se preparando para voltar aos palcos, depois de cancelar uma turnê e enfrentar problemas de saúde mental devido à morte prematura da mãe. Mas ela ainda não está bem, apesar da insistência de sua equipe, formada por Hank Azaria como seu empresário, Jane Adams como a executiva de sua gravadora, Troye Sivan como seu diretor artístico e Jennie Kim como sua dançarina.

É um elenco diverso, que reúne atores e cantores de diferentes contextos -Troye é ele mesmo um ícone do pop LGBTQIA+ e Jennie é do grupo de k-pop Blackpink. Além deles, também estão em cena Da’Vine Joy Randolph, Suzanna Son, Moses Sumney, Dan Levy, Eli Roth, Hari Nef e Anne Heche, morta em agosto.

“Houve muita troca, nós sempre mostrávamos nossa música uns para os outros. Foi incrível ver tanta gente sem medo de tentar algo novo, e muitos de nós, músicos, estávamos nesse barco. É parte do que faz a série especial”, diz Troye, que como Jocelyn começou a carreira ainda criança, como um Wolverine infantil na franquia “X-Men”.

Esse aparente senso de comunidade dos bastidores da série não aparece nos bastidores da gravação de um clipe musical da diva ficcional. Com os pés cobertos de sangue e uma profusão de lágrimas escorrendo pelas bochechas, Jocelyn é obrigada a repetir uma coreografia complexa até que sua equipe tenha o take ideal para o vídeo.

As luzes neon ao redor e a maquiagem cintilante amenizam para os olhos estrangeiros a pressão da indústria fonográfica retratada na trama, que inclui ainda visitas surpresa de representantes de empresas por trás da carreira da princesinha do pop e amizades movidas a interesse.

O que está ruim pode ficar pior. E isso acontece quando Jocelyn vai a uma boate e conhece Tedros. Ela é fisgada pela imagem enigmática do sujeito, com quem engata um relacionamento bastante tóxico. A partir daí, “The Idol” vira um emaranhado de ambições e delírios de grandeza que vão afundando cada vez mais a protagonista.

É graças ao encontro dos dois que “The Idol” mergulha num erotismo bastante gráfico, com direto até a canção original entrecortada por gemidos de prazer. Há quem diga que a série reforça justamente aquilo que gostaria de atacar, ao pôr a personagem de Depp nua e em situações vexatórias.

Na coletiva de imprensa em Cannes, Levinson falou sobre sua vontade de atacar o que chamou de “pornificação” da cultura. A ideia era capturar quão nocivo é ter jovens expostos à hipersexualização, o que pode soar estranho.

Jane Adams, que interpreta a executiva poderosa que se contrapõe à fragilidade de Jocelyn, não vê problema em ter tanto teor sexual nos episódios. Nós não devemos subestimar os impactos da pornografia, diz a atriz, mas esta é uma série para adultos. “Nos anos 1990 ninguém nem se questionava se algo era sensual demais. Estávamos fazendo filmes e pronto. Agora todo mundo está raivoso com tudo.”

Lily-Rose Depp faz coro na defesa de “The Idol”. “Nós sempre soubemos que faríamos algo provocativo, é parte do motivo de eu ter aceitado esse papel. É muito intencional, porque aquilo é mostrado para entendermos quem a Jocelyn é. A série está muito ciente disso, porque precisa justamente adentrar o ambiente complicado e sombrio da própria indústria.”

THE IDOL

Quando Estreia neste domingo (4), na HBO Max

Classificação 18 anos

Elenco Lily-Rose Depp, Troye Sivan e Jennie Kim

Produção EUA, 2023

Criação Sam Levinson, Reza Fahim e The Weeknd

LEONARDO SANCHEZ / Folhapress

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