RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Já está virando quase uma agradável rotina. Desde 2011, Rene Silva vem acumulando prêmios e homenagens de veículos de mídia do Brasil e do mundo pelo seu trabalho no jornal (e ONG) Voz das Comunidades. O reconhecimento da vez vem da revista americana “Time”, que nesta terça-feira (23) o incluiu na lista mundial dos “Next Generation Leaders” [Líderes da Nova Geração].
O rol de homenageados inclui a influenciadora americana Drew Afualo, 27 -brava combatente da misoginia que tem como arma sua conta no Tik Tok, onde tem 8 milhões de seguidores-, a ativista ambiental Sage Lenier, 24, o DJ e produtor musical argentino Bizarrap, entre outros jovens adultos que fazem a roda girar, num total de dez nomes.
A reportagem inclui um vídeo de pouco mais de três minutos em que Rene fala sobre sonhos, conquistas e aspirações e é apontado como “um dos mais proeminentes ativistas e jornalistas negros do Brasil”. Segundo a “Time”, seu poder de influência teria efeitos até sobre as eleições presidenciais. “Ele ajudou Lula a vencer”, destaca o texto.
Rene, 29, sabe porque está neste grupo. “Acho que me tornei uma liderança porque acabei inspirando e motivando outras pessoas. E também pelo olhar. O meu trabalho é fazer com que as pessoas de fora da favela saibam que a nossa realidade vai muito além do tráfico de drogas, mortes, violência e de tudo de ruim que sempre é mostrado”, diz à reportagem.
Ele também tem consciência da potência do trabalho que vem desenvolvendo não só como fonte de notícias, mas como ONG. Da importância de resgatar a autoestima dos moradores do Complexo do Alemão -agora até um pouco mais glamourizado pelo CPX impresso no boné que deu ao presidente Lula e à primeira-dama Janja. Rene ainda fez as honras da casa quando a comitiva do então candidato foi ao Complexo, no ano passado.
Era para Rene que pessoas desesperadas ligavam, no auge da pandemia, pedindo ajuda quando, sem emprego, viam a despensa vazia. O jornalista mexeu seus pauzinhos e conseguiu, com empresas parceiras, distribuir fraldas, roupas, bujões de gás, sandálias, vidros de álcool gel e mais de 130 000 refeições nos meses mais críticos de 2020.
A verdade é que, quando é para ajudar, ele não tem cerimônia: passa a mão no telefone e pede ajuda a amigos influentes, como Luciano Huck e Fabio Porchat. Os dois não cansam de elogiar essa “cara de pau do bem” do jornalista e influenciador. E sempre colaboram de alguma forma.
A admirável trajetória de Rene começou em 2005, quando tinha 11 anos, e criou o jornalzinho Voz das Comunidades, um turning point no jornalismo comunitário. Em seu início, relatava problemas e propunha soluções para o seu bairro e para o colégio onde estudava, no Morro do Adeus, uma das 13 comunidades que compõem o Complexo.
O projeto ganhou visibilidade internacional cinco anos depois, quando Rene, então com 17 anos, fez uma cobertura em tempo real da cinematográfica intervenção militar no Alemão, onde mora desde que nasceu. Um furaço, como se diz no jargão jornalístico.
De lá para cá, fez participações em programas de TV, palestras no TEDx, para executivos de multinacionais e gigantes da tecnologia, congressos no Brasil e no exterior. Não parou de acumular prêmios, entre eles da Forbes e do britânico The Guardian. Em 2018, foi incluído na lista de afrodescendentes mais influentes do mundo numa seleção chancelada pela ONU.
Tudo isso está documentado numa pastinha guardada por dona Nanci, 69 anos, avó de Rene. Ela já tem duas apostilas grandes com as notícias publicadas sobre o neto mundo afora. “Ela arquiva todas as reportagens em que eu já saí na vida, recorta com cuidado e guarda com o maior carinho”, conta. Já o avô, seu Luiz Claudio, 63, demonstra seu orgulho de forma mais expansiva, digamos assim.
Técnico de refrigeração autônomo, ele tem uma clientela endinheirada e, quando puxam papo sobre a família, tira a maior onda, no melhor dos sentidos. “Estou aqui trabalhando para o senhor, meu neto mora na favela mas olha como são as coisas: ele está na lista dos homens mais influentes do mundo”, não perde a oportunidade de dizer. E quem faria diferente?
CLEO GUIMARÃES / Folhapress