65 anos sem Assis Valente, o compositor de ‘Brasil Pandeiro’

Há exatos 65 anos, o Brasil perdia um de seus grandes compositores: o baiano Assis Valente se suicidou no dia 06 de março de 1958, aos 46 anos de idade. Assis estava endividado e já havia tentado o suicídio outras duas vezes. O artista é autor de grandes clássicos da música brasileira, como Brasil Pandeiro, Cai Cai Balão e a natalina Boas Festas.

Além de compositor, Assis Valente também era desenhista e especialista em prótese dentária | Foto: Museu da Imagem e do Som/Divulgação

Assis Valente

Também desenhista e especialista em prótese dentária, na década de 1930, Assis Valente compôs os seus primeiros sambas, bastante incentivado pelo também compositor e cantor Heitor dos Prazeres.

Seu primeiro sucesso, ainda de 1932, foi Tem Francesa no Morro, cantado por Aracy Cortes, uma crítica bem-humorada da mania de se falar francês no Rio de Janeiro.

Com a grande popularização das marchinhas de Carnaval, ele inaugurou  no país – em 1933 – a composição de músicas para outras datas festivas, como:

  • A música junina Cai, Cai, Balão (primeira música tipicamente junina gravada na história, em 1933, por Aurora Miranda, irmã de Carmen Miranda, e Francisco Alves);
  • e também o clássico natalino Boas Festas (gravado no mesmo ano, por Carlos Galhardo), abrindo portas para que outros compositores se dedicassem a esse tipo de composição.

Boas Festas

A marchinha Boas Festas é uma das mais famosas músicas natalinas nacionais. Nela, Assis Valente fala sobre um natal que é realidade para muitos brasileiros: solitário e muito desigual. A letra foi escrita como fruto de sua própria experiência:

“Eu pensei que todo mundo / Fosse filho de Papai Noel / Bem assim felicidade / Eu pensei que fosse uma Brincadeira de papel”.

Depois a canção foi regravada por diversos nomes da MPB, como:

  • Noite Ilustrada;
  • Vanusa;
  • Emilinha Borba;
  • Ivan Lins;
  • Zeca Baleiro;
  • Maria Bethânia;
  • e Simone.

Seu trabalho foi um dos mais profícuos da música popular brasileira e consta que Assis Valente chegava a compor quase uma canção por dia – muitas delas vendidas a baixos preços para outros, que então figuravam como autores das canções.

Foto autografada de Assis Valente (1957) | Foto: Arquivo Ricardo Kondrat

Brasil Pandeiro

Foi autor, também, de peças para o teatro de revista, como Rei Momo na Guerra, de 1943, em parceria com Freire Júnior.

Muitas de suas composições alcançaram o sucesso nas vozes de grandes intérpretes da época, como – principalmente Carmen Miranda – mas também:

  • Orlando Silva;
  • Aracy de Almeida;
  • Carlos Galhardo;
  • Moreira da Silva;
  • Almirante;
  • e muitos outros. 

Após sua morte, caiu em esquecimento, para ser finalmente redescoberto nos anos 1960, e seguiu sendo regravado nas vozes de grandes intérpretes da MPB, como:

  • Chico Buarque;
  • Maria Bethânia;
  • Novos Baianos;
  • Elis Regina;
  • Adriana Calcanhoto;
  • Ná Ozzetti;
  • Luciano Mello, etc.

Assis é responsável – nada mais, nada menos – do que pelo grande hino Brasil Pandeiro, samba-exaltação eternizado pelos Novos Baianos em 1972 e que tanto nos representa como povo e como país: 

Chegou a hora

Dessa gente bronzeada mostrar seu valor

Eu fui à Penha

Fui pedir à Padroeira para me ajudar

Salve o Morro do Vintém

Pendura a saia, eu quero ver

Eu quero ver o tio Sam

Tocar pandeiro para o mundo sambar

O Tio Sam está querendo conhecer

A nossa batucada

Anda dizendo que o molho da baiana

Melhorou seu prato

Vai entrar no cuscuz, acarajé e abará

Na Casa Branca já dançou

A batucada de Ioiô, Iaiá

Brasil, esquentai vossos pandeiros

Iluminai os terreiros

Que nós queremos sambar

Há quem sambe diferente noutras terras

Outra gente, um batuque de matar

Batucada, reúne vossos valores

Pastorinhas e cantores

Expressão que não tem par, ó meu Brasil

Ele compôs a canção em 1940, especialmente para Carmen Miranda interpretar – pois acreditava que não havia ninguém melhor para exaltar o samba e o povo brasileiro, além ter uma admiração e uma paixão muito grande pela Pequena Notável, como Carmen era conhecida.

Recém chegada dos Estados Unidos, a artista já havia gravado várias canções de Valente, mas não gostou muito de Brasil Pandeiro e a recusou, deixando o autor bastante chateado.

O falecimento de Assis Valente

Então, a canção foi gravada pelo conjunto vocal e instrumental de samba e marchinha de carnaval, Anjos do Inferno, no ano seguinte, e fez bastante sucesso.

Mas, o auge mesmo ela atingiu quando foi gravada – por sugestão do “mentor” João Gilberto – pelos Novos Baianos, em 1972, no antológico disco Acabou Chorare. Infelizmente, Assis não viveu para ver isso.

Em sua terceira tentativa de suicídio, todas por conta de dívidas, Assis Valente veio a óbito depois de ingerir formicida. Deixou um bilhete no bolso, em que pedia para que o amigo compositor, Ary Barroso, pagasse seus dois aluguéis atrasados e finalizava dizendo:

“Vou parar de escrever, pois estou chorando de saudade de todos, e de tudo.”.

E você deixou saudade e muito orgulho de sua obra em um Brasil inteiro. Viva, Assis Valente, grande compositor da nossa música popular brasileira!

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