A importância de Johnny Alf para a MPB

Se não tivesse nos deixado em março de 2010, aos 80 anos, em decorrência de um câncer de próstata, o cantor, compositor e pianista carioca Johnny Alf estaria completando 94 anos neste 19 de maio. Nesta matéria, entenda a importância do artista para a MPB.

Johnny Alf é colocado pelo jornalista Ruy Castro como “o verdadeiro pai da bossa nova” | Foto: Arquivo Nacional

Johnny Alf

Johnny Alf teve uma importância imensa para a história da música popular brasileira, sendo colocado pelo jornalista, escritor e biógrafo Ruy Castro – por exemplo – como “o verdadeiro pai da bossa nova”, tendo influenciado nomes como João Gilberto, Tom Jobim e Luiz Bonfá.

Seu nome verdadeiro era Alfredo José da Silva e ele começou seus estudos de piano aos nove anos de idade, com uma amiga da família para a qual sua mãe trabalhava como empregada doméstica. O pai, cabo do exército, morreu quando ele tinha apenas três aninhos.

Após o início na música erudita, Johnny Alf começou a se interessar pela música popular, principalmente trilhas sonoras do cinema norte-americano e por compositores como George Gershwin e Cole Porter.

Aos 14 anos, formou um conjunto musical com seus amigos de Vila Isabel. Depois, entrou para o Instituto Brasil-Estados Unidos (IBEU), no centro do Rio de Janeiro.

Johnny Alf ao piano | Foto: Reprodução

Foi uma amiga norte-americana que sugeriu o nome de Johnny Alf: “Johnny” por ser um nome popular nos Estados Unidos, e “Alf” que era seu apelido na escola.

Em 1949, o artista entrou para o Sinatra-Farney Fan Club, voltado para a música do estadunidense Frank Sinatra e do brasileiro Dick Farney. E

m 1952, Dick Farney e Nora Ney contratam Johnny como pianista da nova Cantina do César, de propriedade do radialista César de Alencar, iniciando assim a carreira profissional.

Foi ali que a música de Alf começou a florescer e seu som desenvolveu uma modernidade impressionante. Ele costumava se apresentar por horas e horas, e os ouvintes imploravam para que não parasse de tocar.

As primeiras composições

Quando começou a enveredar para a música popular e a tocar em bares e boates, Johnny Alf deixou de receber o apoio dos empregadores da sua mãe.

Em 1953, suas primeiras composições entraram para o álbum de estreia de uma atriz e Rainha do Rádio, que estava se lançando como cantora, Mary Gonçalves.

Foram quatro canções:

  • Podem Falar;
  • Estamos Só;
  • O Que é Amar;
  • e Escuta.

No mesmo ano, foi gravado seu primeiro disco em 78 rpm, com a canção Falsete, de sua autoria, e De Cigarro em Cigarro (de Luís Bonfá)

Durante os anos 50, Johnny Alf se apresentava em diversas boates do Rio de Janeiro – como o famoso Beco das Garrafas e o Little Club– ousando misturar em seu processo criativo referências da música clássica e popular, estrangeira e nacional.

A fonte de sua inspiração se encontra na música de Chopin, Debussy, Nat King Cole, Stan Kenton e nos notáveis brasileiros Custódio Mesquita e Francisco Alves. Sua música atraiu os ouvidos ditos mais intelectualizados para os piano bars do bairro de Copacabana.

“Rapaz de Bem”, de Johnny Alf, foi precursora da Bossa Nova

Antônio Carlos Jobim e João Gilberto – dois dos nomes mais famosos da bossa nova – estavam entre os fiéis frequentadores que ficaram surpresos com músicas como Rapaz de Bem, uma das primeiras composições profissionais de Alf, que – com a melodia linear, o jeito suave de cantar, uma série de escalas pouco convencionais e uma dissociação rítmica de bateria e baixo – foi, com certeza, a canção precursora da bossa nova, inspirando os aqueles dois jovens músicos que seriam os futuros representantes do movimento.

Em 1955, Johnny Alf foi se apresentar por um tempo em São Paulo, com a promessa de ganhar melhor, e – em 1962 – voltou ao Rio de Janeiro, se apresentando no Bottle’s Bar, junto com:

  • o conjunto musical Tamba Trio;
  • Sérgio Mendes;
  • Luís Carlos Vinhas;
  • e Sylvia Telles. 

Tornou-se professor de música no Conservatório Meireles, de São Paulo, e participou do III Festival da Música Popular Brasileira, em 1967, da TV Record, de São Paulo, com a canção Eu e a Brisa, tendo como intérprete a cantora Márcia.

A canção foi desclassificada, porém tornou-se um dos maiores sucessos da carreira de Johnny Alf, ao lado de:

  • Rapaz de Bem;
  • Céu e Mar;
  • e Ilusão à Toa.

Em seis décadas de carreira, Johnny Alf compôs mais de oitenta canções, foi gravado por nomes como Caetano Veloso e Chico Buarque e lançou mais de 10 álbuns, sendo o primeiro em 1961 e o último em 2006.

Embora Alf nunca tenha alcançado o estrelato, as lendas da bossa nova sempre o viram como uma referência musical. Jobim não apenas o chamava de “Genialf” (uma combinação de “gênio” e “Alf”), mas se sentiu tão inspirado por Rapaz de Bem, que compôs Desafinado, uma das músicas mais famosas da bossa nova.

Quando João Gilberto percebeu que as síncopes incomuns de Alf o lembravam da batida do tamborim, ele disse que finalmente encontrara o que estava procurando.

“O caso clássico do artista que não teve o reconhecimento à altura de seu talento.”

Em 2008, na mostra sobre os 50 anos da Bossa Nova, Alf teve um encontro virtual com nomes como Tom Jobim, Frank Sinatra, Ella Fitzgerald e Stan Getz, todos já falecidos. O artista tocava piano com as projeções dos colegas, para um filme que foi exibido ao longo do evento. 

Segundo o curador da mostra, Marcello Dantas, Johnny Alf – que era preto, de família pobre e gay (embora na época ele não falasse abertamente sobre isso, também não escondia de ninguém) – foi:

“o caso clássico do artista que não teve o reconhecimento à altura de seu talento.”. Principalmente na bossa nova, um ambiente branco e bastante elitista. Para Dantas,Alf foi um gênio e teve participação na história da nossa música”.  

Johnny Alf compôs mais de oitenta canções ao longo da carreira |  Foto: Divulgação

Alaíde Costa, a cantora favorita de Johnny Alf, disse que o racismo na bossa nova sempre foi velado, a ponto de pretos como ela e Alf nem perceberem que estavam enfrentando discriminação:

“Quando o movimento começou, eu já era profissional. Era convidada para os encontros porque podia ajudar o movimento de alguma maneira”, disse ela em uma entrevista.

“Mas, quando a bossa nova explodiu, senti que não era mais necessária”. 

Já passou da hora de reverenciamos nomes como Alaíde Costa e o aniversariante do dia, Johnny Alf!

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