Ontem, domingo (21), foi um dia histórico para o país porque milhares de pessoas se reuniram em todas as capitais do país, e também no Distrito Federal, para protestarem contra a PEC da Blindagem (conhecida popularmente como PEC da Bandidagem) e o projeto de anistia aos acusados pelos atos relacionados à tentativa de golpe de Estado. Entre os manifestantes destacaram-se três ícones vivos da nossa música: Chico Buarque, Caetano Veloso e Gilberto Gil — todos na casa dos 80 anos — puxando a mobilização com sua presença simbólica e inspiradora.
Apesar das altas temperaturas, no Rio de Janeiro, o ato político-cultural reuniu milhares de pessoas e contou com a participação de vários artistas de diferentes gerações (Lenine, Frejat, Marina Sena, Zé Ibarra, Djavan, Maria Gadu, Paulinho da Viola, Pretinho da Serrinha, Lucas Nunes entre outros). Mas foi a presença de Chico, Gil e Caetanoque fez desse ato um protesto não apenas simbólico mas também histórico. Os octogenários representam uma geração que viveu na pele os efeitos da ditadura militar e usou a música como instrumento de resistência, consciência e esperança.
Chico Buarque foi censurado inúmeras vezes, mas transformou cada corte em estímulo para criar obras ainda mais sofisticadas e alegóricas, como “Apesar de Você”, que virou hino contra o regime. Sua produção dramatizou as tensões sociais e políticas do país, sempre de forma poética e crítica, reafirmando a música como espaço de contestação.
Gilberto Gil, além de ser um dos maiores compositores do Brasil, foi preso, exilado e mais tarde tornou-se Ministro da Cultura. Sua trajetória é marcada pelo diálogo entre arte e política, e por um ativismo cultural que sempre defendeu a liberdade de expressão e o acesso democrático à cultura.
Caetano Veloso, também exilado durante a ditadura, construiu uma obra que questiona padrões, desafia dogmas e coloca a democracia como horizonte de criação e convivência. Seu ativismo público, seja em canções como “Podres Poderes” ou em discursos contundentes, fez dele uma das vozes mais consistentes na defesa da liberdade no Brasil.

No ato, Gilberto Gil ressaltou que o Brasil já viveu momentos semelhantes de ameaça às liberdades e que agora é hora de reafirmar a autonomia democrática. Caetano afirmou que “a democracia no Brasil resiste”, enquanto Chico Buarque voltou a mostrar que sua voz jamais se cala diante da injustiça.
A participação desses artistas octogenários vai além da nostalgia: representa uma continuidade histórica. Eles foram vozes de oposição, reflexão e cultura em momentos-chave do país — durante a ditadura, no exílio, em lutas pela justiça social — e seguem mantidos ativa a chama da cidadania. Suas presenças no ato comprovam que arte e engajamento continuam sendo forças vitais para a democracia brasileira. Eles não apenas testemunharam a história recente do país como foram protagonistas de uma luta constante por justiça social e democracia. Ontem, ao liderarem novamente milhares de vozes nas ruas, mostraram que sua missão não terminou: continuam a nos lembrar de que a música brasileira é, também, uma trincheira de resistência e esperança.
Enquanto o país vive um momento tenso de disputas políticas, a mobilização com respeito à memória, ao debate e à cultura oferece esperança. E é emocionante ver que nomes que mudaram a história da música popular brasileira seguem liderando, com dignidade, coragem e sensibilidade, protestos pela liberdade.



