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Eliane Potiguara: a escritora indígena que está mudando a literatura com sua voz ancestral

Nascida no Morro da Providência, no Rio de Janeiro, Eliane Potiguara transformou uma infância de silenciamento em uma trajetória literária revolucionária. Primeira mulher indígena a publicar um livro no Brasil, usa sua voz ancestral para questionar a história oficial, celebrar a cultura indígena e abrir caminho para novos autores originários.

Seu nome tornou-se sinônimo de resistência cultural e inovação na literatura brasileira, cativa leitores e inspira mudanças no cenário literário do país.

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Pioneira da literatura indígena no Brasil

Eliane Potiguara rompeu barreiras ao lançar, nos anos 1980, a cartilha “A Terra É a Mãe do Índio” (1989) – considerada a primeira obra literária publicada por uma mulher indígena no país. Até então, as vozes dos povos originários praticamente não tinham espaço na cena literária nacional. Curiosamente, Eliane só foi alfabetizada por volta dos sete anos de idade, quando passou a escrever as cartas que sua avó enviava a parentes dispersos após conflitos de terra.

Foi nesse exercício que descobriu o poder da palavra e começou a compreender suas raízes indígenas, que haviam sido ocultadas pela necessidade de sobrevivência em meio urbano.

Anos depois, em 2004, Potiguara lançaria “Metade Cara, Metade Máscara”, obra que consolidou seu nome como referência da literatura indígena contemporânea. Desde então, conquistou o respeito de leitores e estudiosos e mostrou que a literatura brasileira não estaria completa sem a perspectiva e a história dos povos originários.

Voz ancestral como ato de resistência

As obras de Eliane Potiguara têm como marca registrada a fusão entre arte e ativismo. Autora de dez livros publicados, preenche suas poesias e narrativas com a memória, os desafios e a resistência dos povos indígenas. A própria escritora define seus textos como “ecos dos sussurros das ancestrais, das avós, mães, tias que tiveram que calar para não serem mortas” durante séculos de opressão.

Seu compromisso declarado é difundir a criação literária entre mulheres indígenas, para que, cada vez mais, possam escrever e compartilhar suas próprias experiências. Esse empenho em cultivar novas vozes reflete-se em uma mudança maior: por muito tempo, o ensino e a cultura brasileiros ignoraram a visão indígena, alinhando-se apenas à narrativa do colonizador.

Hoje, graças a iniciativas e leis recentes, as histórias contadas por autores indígenas começam a entrar nas escolas e no mainstream, mexendo com o imaginário nacional e corrigindo lacunas históricas. Nesse contexto, a voz ancestral de Eliane Potiguara se destaca como força transformadora e lembra que contar a própria história pode ser um poderoso gesto de sobrevivência e identidade.

Ativismo e reconhecimento internacional

Paralelamente à sua produção literária, Eliane Potiguara construiu uma sólida trajetória de militância em prol dos povos originários e, em especial, das mulheres indígenas. Em 1988, fundou a Rede GRUMIN (Grupo Mulher Educação Indígena), primeira organização voltada à educação e ao fortalecimento de mulheres indígenas no Brasil.

No âmbito internacional, Potiguara fez história em 1990 ao tornar-se a primeira mulher indígena a apresentar uma petição na ONU, durante um congresso de povos indígenas nos EUA. Ela também integrou o comitê responsável pela elaboração da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas e contribuiu ativamente para que os direitos e a cultura dos povos originários fossem reconhecidos globalmente.

Seu trabalho rendeu diversos reconhecimentos. Potiguara foi uma das 52 mulheres brasileiras indicadas ao projeto “Mil Mulheres para o Prêmio Nobel da Paz”, iniciativa internacional que destacou lideranças femininas pela paz. Em 2014, recebeu do governo brasileiro a insígnia de Cavaleira da Ordem do Mérito Cultural, honraria concedida a personalidades que fomentam a cultura nacional. Anos depois, em 2021, tornou-se Doutora Honoris Causa pela UFRJ, sendo a primeira mulher indígena a receber tal título acadêmico no país.

E as homenagens não pararam por aí: em 2025, Potiguara foi agraciada pela segunda vez com a Ordem do Mérito Cultural, entregue pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o que reafirmou sua contribuição extraordinária à cultura brasileira.

Mais do que uma escritora

O impacto de Eliane Potiguara ultrapassa suas realizações pessoais. Desde a publicação de seu primeiro livro, multiplicou-se o número de escritores indígenas no Brasil, muitos conquistando destaque e até sucesso comercial. Potiguara foi uma desbravadora que abriu caminhos para essas vozes emergentes e provou que há público e espaço para as narrativas originárias.

Esse canal, fortalecido pela tecnologia e pela internet, permitiu que líderes, professores e pensadores indígenas divulgassem suas histórias e saberes diretamente, transformando o panorama da cultura nacional.

Hoje, obras de escritores indígenas estão entrando em escolas e ganhando prêmios, e temas antes negligenciados estão no centro de debates literários e acadêmicos.

Aos 74 anos, a autora segue inovando e desafiando limites. Recentemente, lançou novos trabalhos e chegou a candidatar-se a uma vaga na Academia Brasileira de Letras, o que, se alcançado, faria dela a primeira imortal indígena entre os membros da ABL.

Em um país construído sobre a diversidade, a trajetória de Eliane Potiguara demonstra que contar as próprias histórias pode, sim, influenciar os rumos de um povo. Sua jornada continua despertando curiosidade, admiradores e, sobretudo, esperança de um futuro onde todas as vozes do Brasil tenham seu lugar garantido na literatura.

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