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O poema de Mário de Andrade que virou música nas mãos de Martinho da Vila

Você sabia que um dos maiores sambistas da nossa história musicou um poema do grande escritor brasileiro Mário de Andrade?

É isso mesmo! O cantor, compositor e também escritor Martinho da Vila transformou em samba o trecho “A Serra do Rola-Moça”, que faz parte do grande poema “Noturno de Belo Horizonte“, que Mário de Andrade publicou em 1924, na revista “Klaxon” e reeditado no livro “Clã do Jabuti”, em 1927.

Vamos entender essa história!

A Serra do Rola-Moça

O escritor paulistano Mário de Andrade escreveu o poema “Noturno de Belo Horizonte” depois de uma viagem que fez à capital mineira, em 1924.

O poema descreve cenas noturnas da cidade, com ênfase na calma, silêncio e beleza da natureza que toma conta de BH à noite. Mário de Andrade faz referências à história e cultura de Minas Gerais, destacando aspectos como a arquitetura colonial, a exploração mineradora do passado e os esforços de modernização da época.

Nessa viagem, o escritor teria escutado a lenda popular que conta a origem do nome do Parque Estadual Serra do Rola-Moça, situado na Região Metropolitana de Belo Horizonte e uma das mais importantes áreas verdes do estado de Minas Gerais. 

Com 3.941,09 hectares de área, distribuídos nos municípios de Belo Horizonte, Brumadinho, Ibirité e Nova Lima, o Rola-Moça é o terceiro maior parque em área urbana do Brasil.

O parque foi criado em setembro de 1994 e é considerado uma área de proteção especial de mananciais, essenciais para o abastecimento de água da região. As demais áreas do parque são abertas para a prática do ciclismo e outros esportes, bem como caminhadas e atividades de educação ambiental. 

Apesar de muito belo, com uma natureza rica, exuberante e também muito importante para o povo mineiro, o parque também tem áreas de trilhas arriscadas.

A Serra do Rola-Moça | Imagem: Reprodução (Portal Minas Gerais)

A Lenda

O nome do parque se originou de uma lenda popular e foi imortalizado por Mário de Andrade no trecho do poema “A Serra do Rola-Moça”.

Diz a lenda que um casal apaixonado, após a cerimônia de seu casamento na vila, atravessou toda a serra cada qual no seu cavalo – para voltar para a sua casa, que ficava localizada do outro lado da montanha. 

No caminho, o cavalo em que a noiva estava montada pisou em falso no cascalho, escorregou e caiu no fundo do grotão. O noivo, desesperado, cravou a espora na sua montaria e se lançou atrás da moça ribanceira abaixo, também caindo no abismo. 

O casamento acabou em tragédia e a lenda foi imortalizada por Mário de Andrade em seu poema:

“A Serra do Rola-Moça

Não tinha esse nome não…

Eles eram do outro lado,

Vieram na vila casar.

E atravessaram a serra,

O noivo com a noiva dele

Cada qual no seu cavalo.

(…)

Ali, Fortuna inviolável!

O casco pisara em falso.

Dão noiva e cavalo um salto

Precipitados no abismo.

Nem o baque se escutou.

Faz um silêncio de morte,

Na altura tudo era paz …

Chicoteado o seu cavalo,

No vão do despenhadeiro

O noivo se despenhou.

E a Serra do Rola-Moça

Rola-Moça se chamou”

A música e o livro

Tempos depois, já nos anos 80, Martinho da Vila ajudou a divulgar ainda mais essa história e a obra de Mário de Andrade, quando musicou o poema, que ganhou uma versão com a cara do sambista, mas também com ares de toada. 

Martinho conta como chegou no poema “O Hermínio Bello de Carvalho [grande compositor e produtor musical brasileiro] fez o projeto de um disco com poemas do Mário de Andrade musicados por vários artistas. Ele me chamou e eu fiquei com esse poema que se chama ‘A Serra do Rola Moça’. Isso me inspirou de uma tal forma que eu não só coloquei música no poema como resolvi escrever um livro a partir dele. A Serra do Rola Moça é o pano de fundo para a história de uma família mineira. Minha intenção é essa, falar dessas famílias que ainda costumam se reunir aos domingos para almoçar”, 

Em 1983, quando o escritor completaria 90 anos, a canção do sambista – que mantém uma estreita relação com Minas Gerais – entrou para o álbum duplo “Mário de Andrade, trezentos, 350″.

Também participam do disco – lançado pela Funarte – também Camargo Guarnieri, Lenita Bruno e Teca Calazans.

Pouco depois, Martinho da Vila incluiu a canção em seu disco “Coração de Malandro”, de 1987 

O livro de Martinho, “A Serra do Rola-Moça” – foi lançado em 2009, por sua editora própria, a ZFM – e trata-se de um romance que tem como cenário o Parque Estadual mineiro.

Em 2020, o sambista lançou o álbum “Ópera Negra” e também incluiu a canção no repertório, como a participação de Renato Teixeira.

Sobre Mário de Andrade

Hoje seria aniversário de Mário de Andrade, que – além de escritor e poeta – foi romancista, contista, crítico literário, professor e pesquisador de manifestações musicais e excelente folclorista.

Nascido em 09 de outubro de 1893, em São Paulo. Mário de Andrade cresceu em um ambiente familiar simples, mas cercado de estímulo ao estudo e à cultura. 

Durante a juventude, foi um aluno disperso, com dificuldades em diversas matérias, mas logo revelou talento especial para a música e para o português. A partir da adolescência, mergulhou intensamente nos estudos, dedicando-se ao piano e à leitura com disciplina rigorosa.

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Mário de Andrade: um dos principais nomes do Modernismo. | Foto: Reprodução.

Em 1911 ingressou no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo, onde mais tarde se formaria em piano. A morte do pai, em 1917, coincidiu com a conclusão do curso e com a publicação de seu primeiro livro, “Há Uma Gota de Sangue em Cada Poema”, assinado sob o pseudônimo Mário Sobral. A obra denunciava os horrores da Primeira Guerra Mundial e já apontava para o olhar sensível e inquieto que marcaria toda sua trajetória.

Nessa época, Mário aproximou-se de Anita Malfatti e Oswald de Andrade, nomes fundamentais na formação do movimento modernista. 

Metódico e estudioso, tornou-se professor e catedrático de História da Música no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo, ao mesmo tempo em que escrevia artigos de crítica e dava aulas particulares. 

Sua atuação culminou, em 1922, na organização da Semana de Arte Moderna, evento que transformou definitivamente a cena cultural brasileira. 

Ao lado de Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral, Anita Malfatti e Menotti del Picchia, compôs o chamado “Grupo dos Cinco”, núcleo de artistas que rompeu com o academicismo e inaugurou uma nova estética baseada na liberdade de criação e na valorização da cultura nacional.

No mesmo ano, publicou “Paulicéia Desvairada”, o primeiro livro de poemas modernistas, no qual São Paulo surge como tema e personagem. A obra, marcada pela experimentação linguística e pela expressão subjetiva, afirmava uma poética urbana e brasileira.

Nos anos seguintes, Mário de Andrade seguiu aprofundando suas pesquisas sobre o Brasil, viajando por diversas regiões — do Amazonas ao Nordeste — para estudar manifestações culturais, festas populares, ritmos e lendas, o que reforçou sua vocação de folclorista e pesquisador.

Essas viagens inspiraram obras fundamentais, como “Clã do Jabuti” (1927) e o romance “Amar, Verbo Intransitivo” (1927), que abordava a hipocrisia da elite paulistana.

No ano seguinte, 1928, Mário publicaria sua obra-prima, “Macunaíma”, uma rapsódia que combina mitos indígenas, cultura popular e crítica social na criação do “herói sem nenhum caráter”, símbolo de um Brasil múltiplo e contraditório. 

O livro, considerado um marco do Modernismo, sintetiza seu projeto de construir uma identidade literária verdadeiramente nacional.

Durante os anos 1930, Mário de Andrade ampliou seu papel como gestor e articulador cultural. Entre 1935 e 1938, dirigiu o Departamento de Cultura de São Paulo, onde criou bibliotecas, promoveu ações de preservação e formulou o anteprojeto que originaria o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. 

Com o advento da ditadura de Getúlio Vargas, foi afastado e mudou-se para o Rio de Janeiro, onde lecionou Filosofia e História da Arte na Universidade do Distrito Federal e dirigiu o Instituto Nacional do Livro. Em 1940, retornou a São Paulo, retomando seu trabalho com o patrimônio histórico.

Nos seus últimos anos, Mário de Andrade viveu momentos de angústia diante dos rumos políticos do país e da Segunda Guerra Mundial. Mesmo assim, seguiu escrevendo e publicando. 

Em 1942, lançou “O Movimento Modernista”, texto em que revisita e critica sua própria geração, e iniciou a organização de suas “Obras Completas”

O escritor faleceu em fevereiro de 1945, aos 51 anos, vítima de um ataque cardíaco, deixando inacabado o livro “Contos Novos”, publicado postumamente.

Poeta, romancista, ensaísta, crítico, músico e folclorista, Mário de Andrade foi um dos intelectuais mais completos e decisivos da cultura brasileira. Defensor da arte como expressão da identidade nacional, construiu uma obra que une erudição e popularidade, rigor e liberdade, emoção e razão.

Em vida, definiu-se como “trezentos, sou trezentos e cinquenta”, uma multiplicidade que traduz a dimensão de sua contribuição à literatura e à cultura do Brasil moderno.

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