Congresso conquista protagonismo e governo Lula precisa se adaptar, diz Lira

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou nesta quarta-feira (24) que a aprovação do texto-base do novo arcabouço fiscal é resultado de um Congresso Nacional protagonista e que o governo precisa se adaptar à nova relação entre os Poderes.

Para Lira, a aprovação da regra que substitui o teto de gastos não deve ser entendida como resultado de uma base consistente do governo na Câmara, mas sim o entendimento de lideranças partidárias de que a proposta era importante para a retomada de investimentos no Brasil e não representava exclusivamente interesse da gestão Lula (PT).

“As condições de encaminhamento dessas votações são importantíssimas, e a gente entende que essas matérias que ainda estão em discussão terão uma discussão tranquila, transparente, lógico que com outro viés, porque as matérias de interesse mais do governo precisarão de uma articulação maior do governo para vencer no plenário a ainda dificuldade de não ter uma base consistente e sólida”, disse Lira em entrevista à GloboNews.

Lira afirmou que o Congresso tem dado sinais “educados e claros” ao governo de que o “mundo de 2002 não é o mundo de 2023” –anunciando que a forma como Lula governou seus dois primeiros mandatos é diferente da forma como se governa hoje.

“Lá atrás, não tinha lei de responsabilidade, teto de gastos, agência reguladora, internet, Banco Central independente, emenda impositiva, não havia um Congresso com tanto protagonismo”, disse Lira.

A aprovação do texto-base do novo arcabouço fiscal na terça-feira (23), por 372 votos contra 108, foi construída com o apoio do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Segundo Lira, a disposição do petista em negociar com lideranças partidárias deveria servir como exemplo para o restante do governo.

“É importante que o governo entenda que ele tem que participar do processo de discussão como participou o ministro Haddad, que teve uma participação muito importante, franca, tranquila e próxima do Congresso, o que ajudou muito na tramitação dessa matéria”, disse o presidente da Câmara.

A declaração do deputado alagoano contrapõe a atuação de Haddad às articulações feitas pelos ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais) e Rui Costa (Casa Civil). O primeiro tem sido criticado por conversar muito com parlamentares e entregar pouco, enquanto o segundo virou alvo, especialmente na discussão sobre o decreto do saneamento, por não se sensibilizar pelas demandas do Parlamento.

No Congresso, os dois foram considerados os principais culpados pela primeira derrota do governo na derrubada do decreto que alterava regras do Marco do Saneamento, no início do mês.

“Eu não posso responsabilizar ministro A ou B, isso é função interna do governo, mas o governo como um todo precisa se mirar no cumprimento dos acordos que faz com o Legislativo, na priorização do espaço dos parlamentares com respeito às funções de cada Poder. Sem isso, fica muito difícil para o governo conseguir implementar mudanças que o plenário entenda como interesse específico do governo, e não do país”, completou Lira na entrevista.

Para amenizar a relação, Lira reforçou que não gostaria de fazer críticas, mas fazer um “apontamento para um esforço coletivo para que se equilibrem as forças e governo possa tentar ao máximo conseguir a sua base”.

“[Formar a base do governo] não é a minha função. Minha função, como eu sempre coloquei, será a de ser um facilitador para as matérias importantes para o crescimento e desenvolvimento do nosso país, e a Câmara tem feito isso com bastante independência”, declarou.

Durante a entrevista, Lira ainda deu outros sinais ao governo. Em um deles, o presidente da Câmara disse que o andamento das comissões mistas que analisam três medidas provisórias editadas por Lula teve tramitação lenta e serão votadas sem que os plenários das duas Casas tenham tempo para aprofundar a discussão das matérias.

Ele se referia às MPs do Bolsa Família, do Minha Casa, Minha Vida e da reorganização da Esplanada dos Ministérios.

Segundo o parlamentar, sem acordo entre Câmara e Senado sobre como será a tramitação das MPs, o governo terá de se adaptar.

“Nós não chegamos a acordo sobre as medidas provisórias, o que vai forçar o lado bom da coisa: o governo vai ter de abrir mão desse instrumento para voltar a legislar por projeto de lei, nem que seja com urgência constitucional”, alertou.

Lira também disse que algumas áreas do governo precisam reforçar sua atuação no Congresso para abrir diálogo. O exemplo dado pelo presidente da Câmara foi o da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

A pasta da ambientalista tem sido alvo de desidratação no Congresso. O relator da MP que reorganiza a Esplanada incluiu em seu parecer uma série de mudanças que retiram órgãos do Ministério do Meio Ambiente e repassam para os ministérios do Planejamento, das Cidades e da Integração e Desenvolvimento Regional.

“As maiores modificações dizem respeito ao enfraquecimento [feito pelo governo Lula] do Ministério da Agricultura, num fortalecimento do Ministério do Meio Ambiente, que é um ministério com muito pouco apoio político dentro do Congresso –é importante que se frise. Você não pode viver desconectado da técnica da política, não funciona, está aí esse problema gravíssimo em relação a este embate entre Ibama e Petrobras a respeito da exploração de petróleo na costa da Região Norte e indo até o Nordeste”, afirmou Lira.

Marina Silva disse à Folha de S.Paulo na terça que as mudanças pretendidas pelo relator Isnaldo Bulhões (AL), líder do MDB na Câmara, têm em seu cerne a destruição da política ambiental promovida pelo governo Lula.

“Querem mudar a medida provisória da Esplanada para implementar o governo [Jair] Bolsonaro no governo Lula”, afirmou.

CÉZAR FEITOZA / Folhapress

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