SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em meio ao avanço de ações que tentam limitar o debate racial no sistema de ensino dos Estados Unidos, o país ganhou nesta terça-feira (25) uma tríade de monumentos nacionais em homenagem a Emmett Till, adolescente negro brutalmente assassinado em 1955. O caso virou símbolo da luta antirracista americana.
Com discurso crítico às chamadas guerras culturais encampadas pelos republicanos, o presidente Joe Biden assinou em Washington a medida que cria o Monumento Nacional Emmett Till e Mamie Till-Mobley -mãe do adolescente.
Monumentos nacionais são áreas protegidas pelo poder público e de alto valor simbólico -os EUA contam com mais de cem espaços do tipo. Para homenagear Emmett e sua mãe foram estabelecidos três espaços nos estados de Illinois e Mississippi. São eles: a igreja onde o funeral de Emmett foi realizado, o local onde seu corpo foi encontrado e o tribunal onde um júri absolveu seus assassinos.
Os locais passam a ser considerados propriedades federais e recebem cerca de US$ 180 mil (R$ 855 mil) por ano em financiamento público para manutenção e realização de atividades. Ações de vandalismo nos espaços passam a ser investigadas pela polícia federal.
A escolha da data para a assinatura do monumento é simbólica: esta terça-feira marca o 82º aniversário de nascimento de Emmett Till. O adolescente foi morto aos 14 anos após ser sequestrado e linchado no Mississippi quatro dias depois que uma mulher branca o acusou de assédio.
Till foi torturado por Roy Bryant e JW Milam, respectivamente marido e meio-irmão de Carolyn Bryant Donham, mulher que o acusou de assobiar para ela. Após levarem o adolescente sob a mira de uma arma até um celeiro, eles atiraram em sua cabeça, desconfiguraram seu corpo e o jogaram em um rio.
O corpo de Till foi posteriormente jogado em um rio. Sua mãe, Mamie, ao recuperá-lo, exigiu que o filho fosse velado com o caixão aberto, para que todos pudessem ver a imagem do corpo mutilado e irreconhecível, forma de denúncia do racismo e da violência.
Mamie apenas conseguiu identificar o corpo do filho por um anel. “Toda a nação deve testemunhar isso, eles tinham que ver o que eu tinha visto”, escreveu ela em seu livro de memórias. Mamie se tornou ativista pelos direitos civis nos EUA e morreu em 2003.
O caso foi a julgamento, mas um júri formado por homens brancos absolveu os dois criminosos que, anos depois, confessaram publicamente ter assassinato Emmett Till. Eles morreram em liberdade.
Ao assinar o documento ao lado de pessoas que lideram o Instituto Emmett Till e Mamie Till-Mobley -voltado para ações de educação, pesquisa e defesa da justiça social–, Biden defendeu o debate racial. “O negacionismo pode esconder muita coisa, mas não apaga nada”, afirmou, segundo a agência Reuters.
Os EUA assistem à proliferação de políticas que buscam limitar o debate racial, a exemplo de diversos estados que já baniram ou tentam banir conversas sobre a teoria crítica da raça -estudo que explica como o racismo está permeado na lógica das instituições- em sala de aula.
Na semana passada, por exemplo, novas diretrizes educacionais emitidas no estado da Flórida sob a chancela do governador Ron DeSantis pedem aos professores do ensino médio que, ao falar sobre a escravidão, digam que homens e mulheres escravizados teriam desenvolvido “habilidades úteis” durante o período. DeSantis disputa a candidatura republicana à Presidência, ainda que sua campanha enfrente dificuldades recentes.
“Hoje, há alguns em nosso país que preferem apagar ou reescrever as partes feias de nosso passado, que tentam ensinar que os escravos se beneficiaram da escravidão”, disse a vice-presidente Kamala Harris nesta terça-feira, ainda que sem mencionar diretamente o líder da Flórida. “Como patriotas, sabemos que devemos ensinar toda a nossa história, mesmo quando ela é dolorosa.”
Redação / Folhapress