Bolsonaro diz sem citar Cid que irá à Justiça contra qualquer manifestação caluniosa

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) disse nesta quinta-feira (21) que ele não compactuou com medidas sem respaldo na lei tampouco tomou atitudes neste sentido. Para isso, usou um bordão repetido por ele durante todo o mandato, de que atuou “dentro das quatro linhas da Constituição”.

Ao contrário do que diz a nota, Bolsonaro teve uma série gestos golpistas ao longo de seu mandato (2019-2022), como ataques e ameaças a outro Poderes, elogios aos abusos da ditadura militar (1964-1985) e falas nas quais colocava em dúvida o cumprimento de ordens judiciais e a realização das eleições.

Na mesma nota desta quinta-feira, os advogados afirmaram ainda que vão adotar medidas judiciais contra eventuais calúnias em delação premiada, sem citar diretamente o ex-ajudante de ordens, tenente-coronel Mauro Cid.

Reportagens do UOL e do jornal O Globo divulgadas nesta quinta, e confirmadas pela Folha de S.Paulo, mostram que o militar disse, em delação à Polícia Federal que, logo após a disputa do segundo turno do ano passado, o então presidente recebeu de um assessor uma minuta de decreto para convocar novas eleições, que incluía a prisão de adversários.

A nota divulgada pela defesa de Bolsonaro não faz referência ao encontro em si, mas nega que ele tenha tomado ações golpistas.

“Durante todo o seu governo jamais compactuou com qualquer movimento ou projeto que não tivesse respaldo em lei, ou seja, sempre jogou dentro das quatro linhas da Constituição Federal”, disse. “Jamais tomou qualquer atitude que afrontasse os limites e garantias estabelecidas pela Constituição e, via de efeito, o Estado Democrático de Direito”, completou.

“Reitera que adotará as medidas judiciais cabíveis contra toda e qualquer manifestação caluniosa, que porventura extrapolem o conteúdo de uma colaboração que corre em segredo de Justiça, e que a defesa sequer ainda teve acesso”, afirmou o texto.

A nota é assinada pelos advogados Paulo Cunha Bueno, Daniel Tesser e Fábio Wajngarten.

Em junho passado, Bolsonaro foi declarado inelegível por 8 anos pelo TSE após mentiras e ataques ao sistema eleitoral. O ex-presidente, que tem 68 anos, só estará apto a se candidatar novamente em 2030, aos 75 anos, ficando afastado portanto de três eleições até lá (sendo uma delas a nacional de 2026).

O ex-chefe do Executivo adotou silêncio e se deprimiu após as eleições, que ele não esperava perder. Ficou recluso no Palácio da Alvorada e se reuniu com alguns poucos auxiliares próximos. Nos primeiros dias após a derrota, se encontrou duas vezes com o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, e teve reuniões com os comandantes das três forças.

Aliados dizem que ele aguardava retorno sobre o relatório de unas eletrônicas, que o Exército estava fazendo. Relatório este que nunca foi publicado, mas cujo cerne levou à inelegibilidade de Bolsonaro meses depois.

A delação de Cid, se confirmada, apresenta uma nova versão a esses encontros: a discussão de uma suposta minuta de golpe.

Saudosista da ditadura, Bolsonaro reiterou ao longo de anos sua tendência autoritária e seu desapreço pelo regime democrático. Ele já negou a existência de ditadura no Brasil e se disse favorável a “um regime de exceção”, afirmando que “através do voto você não vai mudar nada nesse país”.

Em uma entrevista em 1999 quando ainda era deputado, o político disse expressamente que, se fosse presidente, fecharia o Congresso. “Não há menor dúvida, daria golpe no mesmo dia! Não funciona! E tenho certeza de que pelo menos 90% da população ia fazer festa, ia bater palma, porque não funciona”, afirmou.

Já na Presidência, em 2021, ele deu a entender que não poderia fazer tudo o que gostaria por causa dos pilares democráticos: “Se tudo tivesse que depender de mim, não seria este o regime que nós estaríamos vivendo. E apesar de tudo eu represento a democracia no Brasil”.

Antes disso, ao longo de 2020, Bolsonaro participou de manifestações que defendiam golpe militar —o ex-presidente é um entusiasta da ditadura militar e de seus torturadores.

No 7 de Setembro de 2021, em discursos diante de milhares de apoiadores em Brasília e em São Paulo, Bolsonaro fez ameaças golpistas contra o STF (Supremo Tribunal Federal), exortou desobediência a decisões da Justiça e disse que só sairá morto da Presidência da República.

Já no 7 de Setembro de 2022, diante de milhares de apoiadores na Esplanada dos Ministérios, discursou em tom de ameaça contra outros Poderes, com citação crítica ao STF e elogios à primeira-dama, Michelle Bolsonaro.

Em dezembro de 2022, pouco mais de três horas após a diplomação de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Bolsonaro cumprimentou manifestantes que gritavam frases de teor golpista, fez uma oração e abraçou crianças em frente ao Palácio da Alvorada.

No governo, Bolsonaro deixou mostras de desacordo com a Constituição, embora usasse com frequência a ideia de que atuava “dentro das quatro linhas” do texto.

Sempre que outros Poderes, especialmente o Judiciário, agiam para assegurar o respeito à Carta Magna e contrariavam interesses do ex-presidente, ele afirmava que as instituições atuavam fora dos limites constitucionais.

Uma série de medidas tomadas ao longo do mandato de Bolsonaro enfraqueceu a democracia brasileira, desde a fragilização de organismos de participação da sociedade em decisões sobre políticas públicas até ações que desvirtuaram órgãos de diferentes áreas, com sufocamento orçamentário e perseguições a servidores.

Houve ainda emparedamento da imprensa, retrocessos em transparência e nomeação de aliados para chefiarem a Procuradoria-Geral da República e a Polícia Federal.

Bolsonaro mantinha desde a campanha de 2018 um discurso em que, sem nenhuma prova, colocava dúvidas sobre o sistema eleitoral brasileiro. Em várias ocasiões ele deu a entender que não aceitaria outro resultado que não fosse a sua vitória em outubro.

MARIANNA HOLANDA / Folhapress

COMPARTILHAR:

Participe do grupo e receba as principais notícias de Campinas e região na palma da sua mão.

Ao entrar você está ciente e de acordo com os termos de uso e privacidade do WhatsApp.

NOTÍCIAS RELACIONADAS