SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Pessoas com sintomas de Covid de longa duração apresentam padrões de alterações no cérebro que são diferentes dos pacientes que estão totalmente recuperados ou que daqueles que nunca tiveram diagnóstico da infecção.
É o que mostra uma pesquisa apresentada em reunião anual da Sociedade Radiológica da América do Norte (RSNA), que acontece até o próxima quarta (29), em Chicago (EUA). É o primeiro estudo comparativo com esses três grupos distintos, segundo os autores.
Após a infecção por Covid-19, até 25% dos pacientes podem desenvolver uma condição comumente chamada de “Covid longa”, que inclui uma grande variedade de sintomas, como fadiga, dificuldade de concentração (“névoa cerebral”), alteração no olfato ou paladar, dores articulares ou musculares, falta de ar, sintomas digestivos, entre outros.
Esses sintomas podem persistir durante semanas, meses ou até anos após a infecção, conforme vários trabalhos têm demonstrado.
Em outubro, um outro estudo, publicado no periódico Cell, propôs uma outra explicação para alguns casos de Covid longa, com base em descobertas de que os níveis de serotonina estavam mais baixos em pessoas com a condição.
Pesquisadores da Universidade da Pensilvânia sugeriram que a redução da serotonina é desencadeada por resquícios do vírus que persistem no intestino. A diminuição da serotonina poderia explicar especialmente problemas de memória e alguns sintomas neurológicos e cognitivos da Covid longa.
Porém, a base dessa condição é ainda mal compreendida. Segundo os autores do estudo apresentado em Chicago, a imagem de microestrutura por difusão (DMI), uma nova técnica de ressonância magnética, pode ser uma abordagem promissora para avançar nesse campo.
O DMI analisa o movimento das moléculas de água nos tecidos. Ao estudar como as moléculas de água se movem em diferentes direções e velocidades, o DMI pode fornecer informações detalhadas sobre a microestrutura do cérebro.
Segundo Alexander Rau, um dos autores do estudo e médico residente nos Departamentos de Neurorradiologia e Radiologia Diagnóstica e Intervencionista do Hospital Universitário Freiburg (Alemanha), a técnica pode detectar até mesmo alterações muito pequenas no cérebro, não detectáveis pela ressonância magnética convencional.
Rau e os colegas compararam exames de ressonância magnética cerebral de três grupos: 89 pacientes com Covid longa, 38 pacientes que contraíram Covid-19, mas que não relataram sintomas subjetivos de longo prazo, e 46 pacientes saudáveis sem histórico de Covid-19.
Os pesquisadores primeiro compararam a macroestrutura cerebral desses três grupos para testar atrofia ou qualquer outra anormalidade. Em seguida, eles usaram o DMI para obter uma visão mais profunda do cérebro.
Os três grupos se submetaram a análises de todo o cérebro para avaliar a distribuição espacial de eventuais alterações e associações com dados clínicos, incluindo sintomas de Covid de longa duração, como fadiga, comprometimento cognitivo ou do olfato.
Os resultados não mostraram perda de volume cerebral ou quaisquer outras lesões que pudessem explicar os sintomas da Covid longa. No entanto, a infecção por Covid-19 induziu um padrão específico de alterações microestruturais em várias regiões do cérebro, e esse padrão diferiu entre aqueles que tiveram Covid de longa duração e aqueles que não manifestaram sintomas.
“Este estudo permite uma visão in vivo sobre o impacto do Covid-19 no cérebro”, disse Rau, durante a apresentação.
As descobertas revelaram uma correlação entre alterações microestruturais e redes cerebrais específicas de sintomas associadas a problemas de cognição, olfato e fadiga.
“A expressão de sintomas pós-Covid foi associada a redes cerebrais afetadas específicas, sugerindo uma base fisiopatológica desta síndrome”, disse Rau.
Os pesquisadores esperam reexaminar os pacientes no futuro, registrando tanto os sintomas clínicos quanto as alterações na microestrutura do cérebro.
Apesar dos resultados, ainda não está claro por que algumas pessoas desenvolvem Covid longa e outras não, embora estudos anteriores tenham identificado fatores de risco, incluindo sexo feminino, idade avançada, índice de massa corporal mais elevado, tabagismo, comorbidades preexistentes e hospitalização ou cuidados intensivos anteriores.
CLÁUDIA COLLUCCI / Folhapress