Produtor gaúcho de azeite adota método ultraintensivo para colher em larga escala

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Quem está familiarizado com o visual dos olivais brasileiros pode estranhar a Vivenda Scapini, propriedade de 580 hectares em Viamão, na Grande Porto Alegre (RS).

Ali não se veem oliveiras frondosas salpicadas pelo terreno –o proprietário, o engenheiro Roger Scapini, é o primeiro no Brasil a adotar a olivicultura superintensiva.

Desenvolvida no fim dos anos 1990 pela Agromillora, gigante produtora de mudas com sede na Espanha, a olivicultura superintensiva quebra alguns paradigmas. O principal deles é o espaçamento entre árvores.

No sistema tradicional, aqui no Brasil, ele costuma ser de 7 metros, tanto entre árvores quanto entre linhas. O superintensivo faz diferente. Põe as plantas coladas umas às outras, formando filas contínuas, com espaçamento de 4 metros entre as fileiras.

Esses muros verdes são mantidos a 2,5 metros de altura, com 80 centímetros de largura, medida exata para que a colheitadeira Braud 11.90X Multi, com capacidade para colher duas toneladas de azeitonas por hora, deslize sobre as copas das árvores.

O equipamento, fabricado pela New Holland, veio da França e, no modelo completo (com dois tanques e piloto automático), custa US$ 750 mil (R$ 3,77 milhões). Segundo Roberto Jonker, gerente de produto da marca, é a primeira a vir para o Brasil.

Scapini até começou o plantio pelo método tradicional. Chegou a plantar 30 mil árvores, mas logo concluiu que a rentabilidade ficaria muito aquém do que esperava.

“Dez trabalhadores, ao longo de oito horas, colhem 500 quilos de azeitonas. Uma área tão grande não pode rentabilizar tão pouco. Já pensava em remover as oliveiras e vendê-las para paisagismo, quando descobri o superintensivo.”

Desde 2019, Scapini plantou 210 mil oliveiras ao todo. Aquelas primeiras 30 mil ficaram, mas foram adaptadas ao novo modelo –mais duas árvores foram fincadas em cada espaço, formando as filas. As demais já seguiram o esquema das fileiras contínuas.

Ele está otimista e defende que a olivicultura superintensiva é a única capaz de ajudar o país a reduzir a dependência da importação de azeite –embora seja o segundo maior consumidor do mundo, o Brasil produz menos de 1% do azeite que consome.

“O modelo tradicional é poético, encantador, mas quantas pessoas suportam pagar R$ 120 por uma garrafa de azeite? Precisamos furar essa bolha”, defende o produtor.

A concentração de árvores, que pode passar de 1.400 unidades por hectare, somada à mecanização de todos os processos, incluindo plantio, poda, pulverização de fungicidas e colheita, permite que o método superintensivo alcance uma escala inédita no país.

Em fevereiro de 2025, Scapini prevê que sua primeira colheita comercial, que ainda será modesta devido à pouca idade das árvores, passe de uma tonelada de azeitonas.

Com o olho no futuro, ele providenciou um lagar capaz de processar 2.400 quilos de frutos por hora –a obra está pronta, à espera dos equipamentos Pieralisi, que chegam em julho. “Será o maior do Brasil, porque o superintensivo não lida com caixas, mas com caminhões de azeitonas”, justifica.

Não é qualquer oliveira que se adapta ao sistema. Espécies de estrutura frondosa, como Frantoio, Manzanilla, Coratina e Picual, extrapolam rapidamente o tamanho da colheitadeira. Já a Arbequina e a Arbosana são mais contidas e exigem menos podas.

A Agromillora também vende mudas especialmente desenvolvidas para esse modelo: as variedades Sikitita e Lecciana, desenvolvidas através de cruzamentos pelo Instituto de Investigación y Formación Agraria y Pesquera de Andalucia, em parceria com a Universidade de Córdoba.

No exterior, a olivicultura superintensiva está consolidada em países tradicionais na produção de azeite, como Espanha, Portugal, Itália, França, Marrocos, Chile e Tunísia. Quase todos os produtores iniciaram a experiência entre 1998 e 2005.

Nos Estados Unidos, duas empresas –o California Olive Ranch e a Corto Olive Company– ambas adeptas do superintensivo, respondem por 80% da produção do país.

No vídeo de divulgação do método, produzido pela Agromillora, Manuel Parras, professor de economia da Universidade de Córdoba, arrisca que, até 2030, 20% dos olivais do mundo serão superintensivos.

Mas ainda é cedo para afirmar que a olivicultura superintensiva será o futuro do Brasil. A própria Agromillora, que mantém alguns campos experimentais por aqui, está cautelosa.

“Já existem 400 mil hectares de olivais superintensivos no mundo, mas ainda não sabemos se vai dar certo no Brasil”, afirma Tiago Macedo, representante técnico da empresa espanhola.

A equipe da Embrapa Clima Temperado, que se dedica à olivicultura, não põe fé no sistema. Segundo o pesquisador Rogério Oliveira Jorge, os testes feitos até agora não deram bons resultados.

“Constatamos que até as variedades de porte menor, quando trazidas para nossa condição de muita chuva e insolação, crescem demais. Não se consegue controlar o desenvolvimento e, ao fechar a copa, as doenças fúngicas se instalam”, afirma Jorge. “A gente, como Embrapa, já desistiu do superintensivo. Não apostamos as fichas, nem recomendamos.”

Em outros países, os resultados superlativos são proporcionais às polêmicas envolvendo esse modelo de olivicultura. No vídeo da Agromillora, não faltam testemunhos de produtores sobre a resistência que enfrentaram. O francês Jean Michel Bourgeaud, da Finca La Barjole, na Provence, chega a mencionar “uma certa animosidade” dos vizinhos.

Scapini admite que muita gente tem duvidado do sucesso de sua empreitada. A frase que ele mais tem escutado é “vocês nunca vão conseguir controlar o crescimento e manter a sanidade das plantas”. Mas o produtor diz estar confiante. “Acho essa resistência normal para uma cultura tão nova e um modelo tão audacioso.”

FLÁVIA G. PINHO / Folhapress

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