Dinamarca autoriza uso de F-16 doados contra alvos na Rússia

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Dinamarca vai autorizar o uso de seus caças F-16 doados para Kiev para ataques contra alvos militares em solo russo, aumentando a pressão sobre os Estados Unidos e a aliança militar Otan para escalar a participação na Guerra da Ucrânia.

“Isso não é uma carta branca para que a Ucrânia use os F-16 para fazer ataques arbitrários dentro da Rússia. Estamos falando de uma oportunidade e enfraquecer o agressor ao atacar instalações militares”, afirmou nesta quinta (30) o ministro da Defesa dinamarquês, Lars Lokke Rasmussen.

O país nórdico é o fundador da chamada “coalizão dos caças”, e prometeu dar 19 de seus 44 F-16 a partir do fim deste ano para os ucranianos. Se comprometeram a fazer o mesmo a Bélgica, com 30 de seus 53 aviões, a Noruega, com 22 de suas unidades já aposentadas, e a Holanda, com 24 dos 42 modelos que ainda opera.

É uma frota obsoleta, de aviões com condições incertas que estão sendo substituídos em seus países pelo moderno F-35 americano, mas superior em qualidade aos 124 modelos operados então pela Ucrânia.

Não é um processo rápido, mas para alguns anos, não menos porque inclui o treinamento de pilotos habituados a voar aparelhos soviéticos como o MiG-29 e o Su-27. Especialistas duvidam do impacto real na guerra de forma imediata, mas do ponto de vista simbólico é um salto antes impensável.

O anúncio de Rasmussen vem após a Suécia, o mais recente membro da Otan, anunciar a doação de seus dois aviões-radar que poderão integrar o trabalho dos F-16, algo inaudito para Kiev.

Até aqui, só Polônia e Eslováquia doaram um número incerto de MiG-29 que operavam para Kiev, com o compromisso do uso dentro do território ucraniano. A Holanda sugeriu que suas armas poderiam ser usadas contra solo russo, mas não falou sobre os caças, enquanto a Bélgica disse vetar tal emprego.

Com isso, cresce o momento de reação europeia aos avanços da Rússia, que derrotou a contraofensiva ucraniana de 2023 e neste ano passou a tomar territórios de forma mais rápida, abrindo uma nova frente no norte do país que não só está tomando cidades, mas enfraquecendo as forças de Kiev.

Nesta semana, o presidente Volodimir Zelenski voltou de um giro europeu com promessa de envio de quase R$ 19 bilhões em ajuda militar por parte da Espanha, Bélgica e Suécia.

França e Reino Unido são, até aqui, os mais poderosos membros da Otan a defender ataques diretos contra a Rússia. Na terça (28), o presidente francês, Emmanuel Macron, falou algo semelhante a Rasmussen, defendendo o ataque a instalações militares.

Antes, Macron defendera o envio de tropas ocidentais à Ucrânia, uma linha vermelha que apenas países do Leste Europeu integrantes da Otan haviam cogitado cruzar. Até aqui, Kiev diz que instrutores militares de Paris deverão visitar seus centros de treinamento.

No quesito emprego de armamentos, deram aval a Kiev também os três Estados Bálticos, a República Tcheca e o Canadá.

Os olhos se voltam para os EUA, maior potência militar do mundo e principal apoiador da Ucrânia. Autoridades americanas têm insinuado cada vez mais uma mudança na política de veto a qualquer ataque a território de Vladimir Putin, determinada desde o início da guerra em 2022 pelo presidente Joe Biden.

Neste mês, o secretário de Estado, Antony Blinken, havia dito que tal ação era desaconselhável, mas ao fim cabia a Kiev decidir. Na quarta (29), instado a ser mais direto, afirmou que a diretriz de Washington está “sofrendo ajustes”, sem se comprometer a dizer quais.

Os EUA já liberaram o envio dos F-16 europeus, que são aviões feitos pela americana Lockheed Martin e precisam de autorização para doação a terceiros. Mas não há sinal de que Biden irá permitir o uso de qualquer um dos quase mil F-16 que ainda opera.

Há também expectativa acerca da posição alemã, segunda maior doadora militar para a Ucrânia. Na mesma entrevista em que Macron falou em ataque aos russos, o primeiro-ministro Olaf Scholz afirmou que achava estranho o questionamento do direito de Kiev de se defender “dentro da lei internacional”.

Ao mesmo tempo, Berlim tem sido criticada por reiteradamente negar o envio de mísseis de cruzeiro Taurus, uma poderosa arma de longa de distância. França e Reino Unido são os únicos a doar tal tipo de armamento até aqui aos ucranianos, enquanto americanos têm aumentado o alcance dos foguetes balísticos fornecidos.

Nesta quinta, a Otan sedia uma reunião de chanceleres dos seus 32 membros para discutir essa e outras questões, em Praga. Seu secretário-geral, o norueguês Jens Stoltenberg, repetiu antes do encontro a defesa que já fizera da revisão das restrições a ataques aos russos.

Adotando o mantra de Rasmussen, afirmou que se o alvo for militar, tudo bem. Moscou, por óbvio, não concorda com isso, e nas últimas semanas Putin e autoridades russas têm dito abertamente que tal ação levará a uma escalada imprevisível da guerra.

O presidente russo, comentando a posição de Macron, disse que a Otan arrisca uma guerra nuclear. Depois, determinou exercícios com ogivas atômicas táticas, para uso em campo de batalha restrito, em resposta ao que chamou de provocações de líderes ocidentais. E o Kremlin anunciou que atacaria alvo britânicos se mísseis doados por Londres caíssem na Rússia.

Até aqui, sempre que sacou a carta nuclear, Putin conseguiu retardar o apoio dos EUA e aliados a Kiev. A realidade em solo no país invadido parece ter mudado os ânimos dos europeus, que também temem ficar isolados no caso de Biden ser derrotado pelo ex-presidente Donald Trump na disputa de novembro pela Casa Branca.

Uma volta do republicano, que já sinalizou que vai deixar de apoiar Zelenski e é visto como um admirador de Putin, pode trazer de volta a política de rompimento com a Otan que marcou seu mandato de 2017 a 2021.

Naquele período, Trump criticava abertamente a aliança, cobrando maior dispêndio militar de seus integrantes. Isso acabou ocorrendo pela realidade geopolítica da guerra: se em 2014 apenas 3 dos então 28 membros cumpriam a meta de gastar 2% do PIB com defesa, hoje são 18 dos seus agora 32 integrantes.

IGOR GIELOW / Folhapress

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