Sintoniza e transforma: conheça o projeto que redefine o futuro de jovens em Campinas

Israel Moreira
Israel Moreira
Israel Moreira é jornalista com passagens pelo Correio Popular, Rádio Central e Jovem Pan.
Integrantes do projeto, dentre eles Adriel, nas aulas de fotografia e audiovisual. Foto: Divulgação

Entre montes de papelão, garrafas plásticas e alumínio, Adriel Modesto Gonçalves Lima, de 24 anos, refletia sobre como sua vida havia sido, até aquele momento, semelhante àqueles materiais: algo que a sociedade havia descartado. No entanto, no trabalho de reciclagem, ele começava a enxergar o que antes parecia impossível – a possibilidade de transformação.

“Aos 14 anos, eu achava que o crime era a única opção”, relembra Adriel, que cresceu no Jardim São Marcos, na periferia de Campinas. Seu envolvimento no tráfico de drogas o levou a ser preso diversas vezes, passando grande parte da adolescência recluso na Fundação Casa. “Por muito tempo, eu não enxergava saída. Mas, então, a COMEC me mostrou que, assim como os materiais que eu reciclava, eu também podia me transformar.”

O projeto Sintonizando na TransformAção foi o divisor de águas para Adriel e tantos outros jovens que, após cumprirem medidas socioeducativas, se viram de volta à sociedade, mas sem apoio suficiente para reconstruir suas vidas. Criado pelo Centro de Orientação ao Adolescente de Campinas (COMEC) e financiado pela Fundação FEAC, o projeto se propõe a transformar essas trajetórias, oferecendo oportunidades por meio de atividades culturais, tecnológicas e profissionais.

Impacto social do projeto Sintonizando Na Transformação no período de 24 meses (nov/2022 a jan/2025). Dados: Fundação Feac

A jornada de Adriel: da reclusão à esperança

Inicialmente, Adriel rejeitou a ajuda da COMEC. Mesmo após deixar a Fundação Casa, ele acreditava que poderia seguir sozinho. Mas, quando começou a trabalhar com reciclagem na Unicamp em 2024, algo mudou. “Eu estava perdido, mas o projeto veio na hora certa. Dessa vez, resolvi aceitar a ajuda que antes eu negava.”

O Sintonizando na TransformAção ofereceu mais do que apenas cursos profissionais, como o de gastronomia que Adriel concluiu recentemente. O projeto também trouxe suporte emocional e resgatou sua autoestima. “Eu não acreditava mais em mim, mas eles acreditaram. Agora, quero ser educador social e ajudar outros jovens que passaram pelo que eu passei.”

A trajetória de Adriel é apenas uma das muitas transformações promovidas pelo projeto. Por meio de oficinas de arte, música, fotografia e conteúdo digital, os adolescentes têm a oportunidade de expressar suas experiências e reimaginar seu futuro. Além disso, as batalhas de rap, como a “Batalha do Cálice”, e o documentário “Pixo e Grafite: Mão na Lata”, são exemplos de como a cultura é usada como ferramenta de reintegração social.

Adriel e orgulho da sua formação em gastronomia. “Agora, quero ser educador social e ajudar outros jovens que passaram pelo que eu passei.”

A maturidade trazida pelo projeto

Para Bryan Miguel, ex-aluno do Sintonizando na TransformAção e atual mobilizador social, o projeto foi fundamental para o desenvolvimento de sua maturidade. “Eu aprendi a ter mais maturidade. O projeto me ensinou a nunca desistir das pessoas. Ele nunca desistiu de mim”, afirma Bryan, destacando o papel do projeto na construção de uma visão de futuro mais positiva e inclusiva.

Esses relatos mostram que o projeto vai além da simples capacitação; ele toca vidas de maneira profunda, resgatando a dignidade e a autoconfiança dos jovens envolvidos.

O trabalho desenvolvido pela COMEC não apenas oferece uma nova perspectiva para os adolescentes, mas também busca criar um impacto duradouro em suas comunidades. Ao promover a expressão artística e o desenvolvimento de habilidades técnicas, o projeto incentiva os jovens a se tornarem mobilizadores sociais, atuando como exemplos de transformação.

Vitor Mafra, técnico e gestor do projeto, destaca a importância da arte e da cultura na ressignificação das vidas desses adolescentes. “Quando eles veem o próprio trabalho exposto, percebem que têm algo a dizer, que são parte de uma narrativa maior”, afirma.

Além da expressão artística, a capacitação profissional também tem sido uma ferramenta crucial. “Queremos que os jovens se vejam capazes de alcançar a autonomia, seja no mercado de trabalho ou como líderes comunitários”, completa Mafra.

Vitor Mafra, gestor técnico do Sintonizando e alunos do projeto. Foto: Divulgação

Desafios e lacunas no apoio institucional

Embora o projeto esteja alcançando resultados significativos, o desafio de oferecer um acompanhamento contínuo aos jovens após o cumprimento das medidas socioeducativas permanece. “Muitos adolescentes voltam às suas comunidades sem suporte suficiente, o que aumenta a probabilidade de reincidência no crime”, explica Ocimar Alavarse, professor da Faculdade de Educação da USP, que estuda políticas de ressocialização.

O Sintonizando na TransformAção está constantemente buscando novas formas de expandir seu alcance e criar uma rede de apoio mais sólida para os jovens, mas sua continuidade também depende da ampliação de políticas públicas mais eficazes.

O apoio da Fundação FEAC e as expectativas futuras

A Fundação FEAC tem sido uma parceira central, não apenas no financiamento do projeto, mas também na formulação de políticas sociais voltadas para adolescentes em situação de vulnerabilidade. “Nosso compromisso é garantir que esses jovens encontrem meios para romper com a violência e a marginalização”, afirma Natália Cristina Valente, analista de projetos da FEAC.

O objetivo é que o projeto se torne uma referência, inspirando a criação de políticas públicas mais eficazes e estruturadas em todo o estado de São Paulo. “Queremos que esses jovens não apenas evitem o crime, mas se tornem agentes de transformação em suas comunidades”, conclui Valente.

O projeto, em parceria com a COMEC e a Fundação FEAC, não apenas reintegra os adolescentes à sociedade, mas os capacita para serem protagonistas de suas próprias histórias. Foto: Divulgação

Um futuro de esperança e oportunidade

Adriel, assim como Bryan e tantos outros, encontrou no Sintonizando na TransformAção uma nova identidade, longe da marginalização e da violência. O projeto, em parceria com a COMEC e a Fundação FEAC, não apenas reintegra os adolescentes à sociedade, mas os capacita para serem protagonistas de suas próprias histórias.

Ao transformar a realidade desses jovens, o projeto mostra que, assim como os materiais recicláveis com os quais Adriel trabalhava, sempre há uma nova chance de recomeçar. Cada jovem impactado pela iniciativa se torna uma prova viva de que é possível reescrever futuros e construir uma sociedade mais justa e inclusiva.

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