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Paulo Henriques Britto: poesia que pensa, palavra que permanece

Fabrício Correia
Fabrício Correia
Fabrício Correia é jornalista, escritor, professor universitário, especialista em Acessibilidade, Diversidade e Inclusão. É crítico de cinema, membro da Academia Brasileira de Cinema e apresenta o programa “Vale Night” na TV Thathi SBT.
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A eleição de Paulo Henriques Britto para a Academia Brasileira de Letras é um gesto de inteligência histórica. Um poeta que sempre recusou os holofotes fáceis, que construiu sua trajetória com rigor estético e ética intelectual, finalmente é chamado a ocupar o lugar que sempre lhe pertenceu: aquele onde a língua, a literatura e o pensamento se encontram com dignidade.

A obra de Britto é uma das mais consistentes da poesia brasileira contemporânea. Em livros como “Trovar Claro”, “Macau e Tarde”, sua escrita se caracteriza por uma precisão quase matemática, mas nunca fria. Seus versos são densos, repletos de camadas, construídos como quem sabe que o mundo só pode ser dito com exatidão e espanto. Ele maneja o ritmo como um ourives da métrica moderna, e, ao mesmo tempo, injeta em seus poemas uma inteligência aguda, muitas vezes irônica, que desmonta clichês e interroga o próprio ato de escrever.

Mas não é só como poeta que Britto se impõe. Como tradutor, ele é referência. Trouxe para o português autores complexos como Wallace Stevens, Elizabeth Bishop, Frank O’Hara, além de prosadores como Henry James e Thomas Pynchon — tarefa para poucos. Suas traduções vão além de traslados técnicos, tornaram-se recriações sensíveis, obras paralelas de quem conhece profundamente a literatura e respeita os dois idiomas como territórios sagrados. São traduções que pensam o original, que o escutam, que dialogam com ele. A tradução, em Britto, não é servidão: é convívio.

Admiro Britto há muitos anos. Primeiro como leitor, depois como alguém que acompanha com atenção os rumos da literatura brasileira. Sua presença discreta, mas firme, sua recusa ao ruído e ao espetáculo, sua fidelidade à palavra bem pensada e ao pensamento bem escrito sempre me impressionaram. Ele representa um tipo raro de intelectual: aquele que sabe que forma é conteúdo, que estilo é ética, que o poema é também uma forma de pensar o mundo.

A escolha da ABL reconhece um grande escritor e afirma, num momento tão carente de referências sólidas, que ainda é possível escolher com critério, com responsabilidade literária, com compromisso cultural. Ao levar Britto para a cadeira 30, a Academia acolhe não só um autor, mas uma obra que já estava consolidada no coração da poesia brasileira. É a linguagem quem agradece.

Paulo Henriques Britto, com seu verso limpo e cerebral, com sua tradução viva e refinada, com seus ensaios lúcidos sobre o fazer poético, sempre representou um outro tempo — o tempo da permanência. Sua entrada na ABL é, portanto, não um prêmio tardio, mas o reconhecimento necessário de quem já era imortal pela obra, e agora o é também por direito.

Celebrar Britto é reafirmar que a literatura não é ornamento, é fundamento. E que, em tempos de redes sociais e informações ininterruptas, ela ainda pode — e deve — ser escrita com silêncio, precisão e grandeza.

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