‘Barbie’ usa ironia como vitrine para vender um feminismo plastificado

Rrdação

Depois de muito burburinho, o mundo cor-de-rosa de ‘Barbie’ chega aos cinemas pronto para ser desbravado pelo seu público-alvo —e vender bolsas, sapatos e maquiagens em tons de pink. São os adultos, não as crianças, que vão aproveitar o lançamento de Greta Gerwig, diretora antes indicada ao Oscar pelo doce “Lady Bird”, de 2017.

Isso porque o longa-metragem feito por atores de carne e osso é, antes de mais nada, um aceno nostálgico àqueles que brincaram com a loira plástica em seu auge, no século passado.

Hoje, a Barbie não é mais unanimidade. Antes imagem máxima de um “american way of life” cor-de-rosa, ela chega para as novas gerações como símbolo do fascismo e do consumismo, como coloca Sasha, adolescente com a qual a Barbie Estereotipada vivida por Margot Robbie topa no mundo real no longa de Gerwig.

A diretora, escritora de diálogos afiados desde “Frances Ha”, de 2012, pinta uma comédia histérica, com forte comentário social. O ponto de partida é a jornada da Barbie ao mundo real, onde busca consertar seus pés, agora chatos.

O desafio, tanto de Barbie quanto de Gerwig, era empacotar a loira de uma forma que ela caiba —em toda sua perfeição, mais padrão impossível— em um mundo que clama por diversidade.

O resultado, porém, é uma jogada caríssima de marketing que engrossa a pilha de odes à nostalgia. Passa longe de ser um filme memorável, para além de sua deliciosa paleta pastel.

No visual, é um acerto em cheio. O filme parece envolver o espectador em um furacão de algodão doce. A começar pelos cabelos e maquiagens, dignos de prêmio —não que fosse difícil embelezar o elenco, como a narração faz questão de mencionar.

“Barbie”, inclusive, ganha pontos pelos arroubos metalinguísticos, que enriquecem a produção. A casa da protagonista, por exemplo, é uma versão literal daquela habitada por bonecas, com piscinas falsas e geladeiras sem fundo, num aceno à arquitetura de plástico.

Na seara das roupas, o filme parece realizar os sonhos de quem um dia brincou com as bonecas. O espectador é bombardeado com roupinhas Chanel em cinquenta tons de rosa enquanto as Barbies dançam ao som de Dua Lipa, em uma das festas perfeitas na Casa dos Sonhos da Barbie. Parte da toada cômica, inclusive, é repetir à exaustão os nomes reais dos produtos.

É, também, um lembrete, irônico, de que toda aquela brincadeira está saindo do bolso da Mattel, companhia dona da boneca.

Esse ar brincalhão com a qual o patrocínio é tratado até arranca algumas gargalhadas no começo, como na cena em que vemos a mesa de reuniões dos chefões da empresa, todos homens. O horror diante da aparição de bonecas descontinuadas e a memória escancarada —e proposital— de alguns itens de colecionador também são um brinde aos fãs das Barbies vintage.

Mas propaganda, mesmo feita com ironia, ainda é propaganda. “Barbie” desanda quando desvia do humor escrachado e do mundinho cor-de-rosa para suas mensagens mais densas.

A ironia usada para fazer críticas mordazes à marca e à própria boneca cai por terra quando se torna uma muleta para discursos rasos de empoderamento feminino.

Tenta-se um mea culpa desengonçado pelo reforço ao estereótipo impossível de feminilidade que a loira representa, mas que se perde no discurso feminista. Ele é mastigado em diálogos literais, envolto no melodrama sobre as dores de ser uma mulher no mundo real e o papel do brinquedo em conectar pessoas.

Até pode vazar uma lágrima ou outra, mas é escancarada a intenção marketeira.

Longe de ser rentável, a experiência feminina real mais se parece com a vivida pelo Ken de Ryan Gosling, que se esconde no conversível da Barbie para acompanhá-la em suas aventuras. Mesmo assim, ele não tem direito nem a uma carona no banco da frente.

BARBIE

Avaliação Bom

Quando Estreia nesta quinta (20) nos cinemas

Classificação 12 anos

Elenco Margot Robbie, Ryan Gosling e Will Ferrell

Produção Estados Unidos, 2023

– Direção Greta Gerwig

BÁRBARA BLUM

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