PORTO ALEGRE, RS, E RIBEIRÃO PRETO, SP (FOLHAPRESS) – A celebração do Corpus Christi nesta quinta-feira (30) foi marcada por ruas de dezenas de cidades brasileiras enfeitadas com tapetes coloridos alusivos à data e pela lembrança aos atingidos pela tragédia ambiental do Rio Grande do Sul, além de campanhas de doações para famílias gaúchas.
A tragédia, que completou um mês nesta quarta-feira (29), foi lembrada em atos ligados à Igreja Católica no Rio Grande do Sul, além de em estados como São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul e Santa Catarina.
O Corpus Christi, ou Corpo de Cristo, comemora o sacramento da eucaristia no qual católicos acreditam ocorrer a transformação do pão e do vinho em corpo e sangue de Jesus Cristo e é celebrada em vários países de tradição cristã.
Por isso, igrejas e comunidades católicas espalhadas pelo país preparam tapetes coloridos para decorar as procissões que marcam a data. Entre os materiais usados nos tapetes estão serragem, areia, folhas, flores e dolomita espécie de calcário tingido nas cores desejadas.
Na Serra Gaúcha, foram feitas homenagens às vítimas das chuvas e enchentes. Além dos tradicionais tapetes de serragem colorida que enfeitam as ruas das cidades, fiéis e organizadores dos eventos incentivaram a arrecadação de donativos para os mais de 2 milhões de afetados pela calamidade em todo o estado.
A praça central de Flores da Cunha foi contornada por 54 tapetes temáticos que exibiam imagens sacras, mensagens de apoio ao povo do Rio Grande do Sul e ilustrações de danças gaúchas, cenas de natureza e agricultura vitivinícola. A região é a maior produtora de vinhos e sucos de uva no Brasil.
Segundo informações da prefeitura, foram cerca de 500 voluntários envolvidos na confecção dos tapetes.
O prefeito de Flores da Cunha, César Ulian (PP), disse que houve dúvidas se a festividade aconteceria diante do desastre climático, mas foi decidido manter o evento e reformular as atrações para focar na mensagem de fé e reconstrução.
“Todos que vierem a Flores da Cunha e verem o amor, carinho, e dedicação que os voluntários botaram nesses tapetes certamente receberão também uma injeção de ânimo, de esperança, que com certeza irá fortalecer muito esse espírito de solidariedade”, disse.
Segundo Ulian, a construção “passo a passo” dos tapetes deve servir de inspiração para os gaúchos.
“Ontem a gente podia perceber no início uma partezinha, depois ia ganhando forma, ia encorpando e ia ficando as obras de artes prontas”, disse o prefeito. “Da mesma forma, a gente entende que um pouco de cada um vai reconstruir o nosso Rio Grande”.
Os tapetes de serragem são um dos principais atrativos turísticos de Flores da Cunha, tradição feita anualmente há seis décadas. A expectativa é que a presença de visitantes na cidade aumente o sucesso da campanha de arrecadação.
Um ponto de coleta de doações de alimentos não perecíveis, itens de higiene pessoal e limpeza foi montado na praça central próximo ao monumento Apóstolo Pedro.
Além disso, o campanário da igreja Sagrado Coração de Jesus, um dos principais pontos históricos do município, foi aberto à visitação com passeio guiado até o topo da estrutura. Cada ingresso custa R$ 25, e o valor obtido será destinado aos atingidos pelos temporais.
Essa é a terceira edição do Corpus Christi Solidário, idealizado durante a pandemia de Covid-19. O evento se encerra neste domingo (2).
Na cidade de Carlos Barbosa, a decoração colorida nas ruas foi impossibilitada pela falta do material, fabricado em Porto Alegre.
“O nosso fornecedor da anilina para tingimento da serragem ficou inundado e nós não conseguimos o produto”, explica Eliseu Demari, presidente da Proarte (Fundação de Cultura e Arte) de Carlos Barbosa.
Apesar do problema, os grupos que fariam a confecção dos tapetes transformaram seu interesse em ajudar os atingidos pelas enchentes em uma ação diferente.
“Nós abrimos mão dos tapetes e fizemos um percurso de doações. Onde haveria um tapete, a gente dispôs caixas ao longo de uma quadra, de modo que a procissão circulou pelos donativos”, conta Demari.
Ele lamenta que as circunstâncias impediram a confecção dos tapetes de serragem, mas comemora que o engajamento da comunidade trouxe bons resultados. Ao longo do dia, aproximadamente 5 toneladas de donativos foram arrecadadas.
“Tivemos êxito em trabalhar a procissão, não da forma como a gente queria artisticamente falando, mas nessa pegada solidária que a gente sabe o quanto é importante”, disse Demari.
Para o próximo ano, ele torce que a tradição seja retomada, e que as lembranças da tragédia possam ficar no passado. “Por mais que seja muito bonito alcançar esses donativos, a gente realmente espera que nunca mais precise realizar isso, e que nunca mais aconteça uma calamidade a esse ponto”.
Em Garibaldi, a comunidade optou por fazer um tapete solidário dentro da igreja São Pedro para que o público possa deixar doações. Para receber os fiéis, foi montado um mosaico em frente ao altar com pacotes de farinha, óleo de cozinha e outros alimentos não perecíveis.
A paróquia também pede a doação de roupas de inverno, cobertores, calçados, travesseiros, edredons e produtos de higiene e limpeza.
A procissão em Garibaldi incluiu no trajeto locais que serviram de apoio a vítimas das enchentes, como o Hospital Beneficente São Pedro e a União de Moços Católicos.
No santuário de Caravaggio, em Farroupilha, tapetes de serragem não são a única atração. Fiéis poderão ver de perto uma relíquia do beato Carlo Acutis, em vias de se tornar o primeiro santo millennial.
A relíquia, fios de cabelo do jovem que deve ser canonizado após a atribuição de um segundo milagre pelo papa Francisco, foi presenteada à paróquia em 2022.
Em nota, o padre Ricardo Fontana disse que a ocasião será uma oportunidade de fazer preces pelos jovens e adolescentes, e também uma “união de preces por todos aqueles que foram atingidos pelas fortes chuvas em nosso querido Rio Grande nesses dias”.
HOMENAGENS EM OUTROS ESTADOS
Em Minas Gerais, a avenida Afonso Pena, no centro de Belo Horizonte, foi palco da montagem dos tapetes desde a noite desta quarta, para a procissão marcada para as 18h desta quinta sairá da Igreja Nossa Senhora da Boa Viagem rumo ao Santuário Arquidiocesano São José.
Um dos tapetes foi confeccionado com os dizeres “RS – Unidos aos nossos irmãos”, com desenhos de pessoas dando as mãos umas às outras.
No Rio, estudantes do Colégio Imaculado Coração de Maria fizeram um “tapete solidário”, com alimentos que serão encaminhados a famílias carentes, inclusive gaúchas. A Arquidiocese do Rio incentivou a doação de mantimentos para destinar às famílias necessitadas.
Já em Mato Grosso do Sul, as doações estão sendo feitas por fiéis desde o início da manhã. Até o fim do dia, a expectativa é que as arrecadações sejam suficientes para encher oito caminhões de doações para serem enviadas ao Rio Grande do Sul.
Em Siderópolis (SC), o ponto de arrecadação desde o início da manhã desta quinta foi a Igreja Matriz Paróquia Nossa Senhora Aparecida, onde os tapetes alusivos a Corpus Christi foram confeccionados.
Os atingidos pelas enchentes no Sul do país também foram lembrados pelo arcebispo de Aparecida (SP), dom Orlando Brandes, em missa nesta quinta. O religioso disse na celebração enviar palavras de consolação e força aos gaúchos.
TONELADAS DE MATERIAIS ENFEITAM RUAS
Em Matão, no interior paulista, a programação da prefeitura para celebrar a 76ª edição da festa de Corpus Christi conta com apresentações de corais desde as 9h, que segue à tarde com DJs e um pocket show com batalha de MCs.
Iniciada nesta quarta-feira (29), a programação na cidade deve receber 50 mil pessoas, segundo a prefeitura, especialmente fiéis para a procissão desta quinta, que conta com 12 quarteirões enfeitados e acontecerá às 17h no entorno da Igreja Matriz do Senhor Bom Jesus.
Para deixar tudo pronto a tempo, cerca de 500 voluntários começaram a montagem dos tapetes ainda durante a madrugada, com a utilização de aproximadamente 70 toneladas de dolomita em pó, que ganha vida com as mãos dos artistas que preparam os tapetes religiosos.
Também tradicional, o tapete de Corpus Christi no centro histórico de Santana de Parnaíba, na Grande SP, teve 850 m de extensão com 60 obras representadas.
A previsão é que a cidade receba nesta quinta um total de 30 mil visitantes no entorno da Igreja Matriz Santa Ana, na região central.
Também houve celebração com tapetes em locais como Itu, Pirapora do Bom Jesus, Itapecerica da Serra e Embu das Artes.
Na região metropolitana de São Paulo, São Bernardo do Campo e Santo André também optaram por promover arrecadação de alimentos, roupas, produtos de higiene e cobertores para serem doados a famílias necessitadas nos municípios.
No Paraná, as ruas foram enfeitadas em cidades como Foz do Iguaçu e Maringá.
CARLOS VILLELA E MARCELO TOLEDO / Folhapress
