De narração a análise de recordes, Paris-2024 será a Olimpíada da inteligência artificial

PARIS, FRANÇA (FOLHAPRESS) – Imagine ouvir a voz inconfundível de Galvão Bueno narrando os melhores momentos dos Jogos Olímpicos de Paris 2024, mesmo ele já tendo abandonado as narrações ao vivo. Nos Estados Unidos, algo semelhante está prestes a acontecer com Al Michaels, um dos locutores esportivos mais icônicos do país.

A NBC, emissora oficial dos Jogos nos EUA, está utilizando IA (inteligência artificial) para recriar a voz de Michaels em resumos diários personalizados para os espectadores.

O narrador de 79 anos aposentou-se há três anos e aprovou o chatbot (programa que reproduz a linguagem natural) da NBC. “Ficou a 2% da perfeição”, avaliou.

Esse talvez seja o exemplo mais chamativo das aplicações da inteligência artificial que terão como vitrine o megaevento de Paris. Mas está longe de ser o único. A IA já está sendo usada na detecção de atletas, na melhoria do desempenho esportivo, no enriquecimento da experiência dos torcedores e na gestão de grandes competições.

O tema preocupa tanto o Comitê Olímpico Internacional (COI) que a entidade lançou em abril passado uma “Agenda Olímpica para a IA”, em um evento em Londres com representantes do setor de tecnologia, dos atletas e de dirigentes.

No seminário, foram discutidos os diversos usos possíveis da IA no esporte e apresentados casos concretos. Um laboratório belga de inteligência artificial ajudou a projetar uma bicicleta aerodinâmica para a afegã Masomah Ali Zada, integrante da equipe olímpica de refugiados. Modelos de “aprendizado profundo” do grupo chinês Alibaba estão restaurando filmes de Jogos Olímpicos do passado. Já está em testes o uso de IA para dar notas às acrobacias da ginástica artística, evitando o chamado “viés do collant”, a tendência do jurado humano a dar uma nota distorcida em função do país do atleta.

“Os Jogos são o evento mais importante do mundo, e a IA pode trazer um catálogo completo de usos muito concretos”, afirma Sarah Vickers, diretora do programa olímpico e paralímpico da Intel, gigante do setor de chips de computador.

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IA NAS OLIMPÍADAS

– Detecção de atletas

– Melhoria de desempenho esportivo

– Gestão de competições

– Narração

– Câmeras de vigilância

– Restauração de vídeos de Jogos passados

– Interação com torcedores

– Orientação de atletas paralímpicos

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A Intel e seus concorrentes na fabricação de chips, como a AMD e a Nvidia, estão entre os maiores interessados no desenvolvimento da IA, que depende de grande capacidade de processamento. Em meados de junho, a Nvidia chegou a ser por alguns dias a empresa cotada em bolsa mais valorizada do mundo, desbancando a Apple e a Microsoft. Seu valor de mercado ultrapassou US$ 3,3 trilhões (cerca de R$ 18 trilhões).

Tecnologia da Intel foi usada para detectar novos talentos no Senegal, país que vai sediar os Jogos Olímpicos da Juventude em 2026. Um programa de inteligência artificial submeteu mil adolescentes a testes de aptidão física e selecionou 40 com talento para esportes específicos. O objetivo é que pelo menos um deles ganhe medalha daqui a dois anos.

Durante os Jogos de Paris, um quiosque instalado no Stade de France, sede das provas de atletismo, permitirá a espectadores comuns servirem de cobaia para o sistema. Depois de testes simples de reflexos, velocidade e resistência, o computador apontará, dentre dez esportes olímpicos, para qual o torcedor tem mais talento.

Os atletas olímpicos e paralímpicos terão acesso pelo celular a um aplicativo de chatbot, alimentado com informações do COI. Nele, poderão tirar dúvidas comuns ao longo da competição, como horários de acesso a ginásios de treinamento e regras de funcionamento da vila dos atletas.

As transmissões de TV usarão outros recursos de IA além da narração artificial da NBC. Em 14 modalidades olímpicas, as emissoras detentoras de direitos poderão criar clipes de melhores momentos gerados automaticamente, específicos sobre um atleta ou um país. A IA levará em conta fatores como o barulho da torcida ou o placar da competição para selecionar as imagens. Tecnologias de captação de movimento permitirão gerar gráficos inéditos de análise de desempenho nos saltos ornamentais.

Nos Jogos Paralímpicos, uma das principais demonstrações das possibilidades da IA ocorrerá no centro de alta performance que o comitê dos EUA utilizará em Eaubonne, 18 km ao norte de Paris. Um app de celular ajudará em tempo real os deficientes visuais a se deslocarem pelas instalações sem esbarrar em obstáculos.

A segurança dos Jogos também utilizará a IA. Uma lei aprovada no ano passado pelo parlamento francês autorizou em caráter excepcional “tratamentos algorítmicos” para análise das câmeras de vigilância durante o evento. Entidades como a Anistia Internacional apontaram o risco que isso representa à privacidade dos espectadores. O governo francês garante que não vai armazenar dados individuais.

É possível imaginar outros usos para a IA artificial no esporte, como a redação de textos jornalísticos. A reportagem alimentou um dos chamados “grandes modelos de linguagem”, sistemas que geram textos em linguagem natural, com a apuração para esta reportagem e o seguinte prompt (instrução):

“Escreva uma matéria jornalística em português do Brasil, sobre o uso crescente da IA no esporte, com base nas informações do arquivo anexo, e com ênfase nos Jogos Olímpicos como vitrine. Abra falando do caso da NBC com Al Michaels e pedindo ao leitor que imagine o mesmo no Brasil, com Galvão Bueno (que estará, porém, presente aos Jogos).”

O texto resultante ficou um tanto pomposo, mas, feitas pequenas correções, seria perfeitamente publicável. Começava assim:

“Imagine ouvir a voz inconfundível de Galvão Bueno narrando os melhores momentos dos Jogos Olímpicos de Paris 2024, mesmo quando ele não está comentando ao vivo. Nos Estados Unidos…”

ANDRÉ FONTENELLE / Folhapress

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