Petrobras deve continuar extraindo petróleo, mas falta plano de longo prazo, diz Parente

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Pedro Parente, 71, presidiu a Petrobras durante o governo de Michel Temer (MDB), entre 2016 e 2018, prometendo diminuir a ingerência política na empresa. Foi a gestão dele a responsável por introduzir o preço de paridade de importação, conhecido como PPI, que virou alvo de questionamentos do governo Lula (PT).

Desde então, viu a petroleira trocar de presidentes sucessivamente —foram oito nos últimos oito anos. A última troca se concretizou na semana passada, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva demitiu Jean Paul Prates sob pressão dos ministros da Casa Civil, Rui Costa, e de Minas e Energia, Alexandre Silveira.

A última demissão se deu em meio a divergências sobre o papel da empresa na transição energética do país, tema sobre o qual Parente conversou com a Folha de S.Paulo, no evento Converge Capital Conference, em São Paulo, que discutiu soluções climáticas e energéticas para o país.

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Pergunta – Qual é o papel da Petrobras na transição energética do Brasil?

Pedro Parente – Todas as empresas de óleo e gás têm um problema super-relevante, que é o da continuidade dos seus negócios. Talvez a principal obrigação dos líderes de qualquer empresa seja pensar nesta continuidade.

Não há nenhuma dúvida de que os combustíveis fósseis e a extração de óleo e gás de poços, especialmente os mais profundos, um dia vão acabar. O problema é que isso não será tão cedo e há uma discussão muito grande sobre quando vai acontecer. Quando eu cheguei à Petrobras, dizia-se que era no final da década de 2050, depois passou para o final da década de 2040, depois década de 2030 e agora já há questionamento.

Mas todas [as empresas] têm esse desafio e é muito difícil você encontrar um único negócio, uma única fonte de energia, pelo que se vê hoje, que possa reproduzir o volume de receitas que óleo e gás produzem hoje para indústrias como a Petrobras e a Shell. É um desafio que está um pouco longe, mas isso não quer dizer que não se tenha que tomar medidas imediatas.

P. – Quais seriam elas?

P. P. – No longo prazo, a Petrobras tem a característica de ser uma empresa estatal. Não que isto obrigatoriamente leve a este problema, mas no Brasil leva, que é descontinuidade. A gente está vendo quatro presidentes em dois anos.

Quando eu estava na Petrobras, junto com a diretoria e o próprio conselho, a gente desenvolveu um planejamento estratégico que não pensava só no curto prazo, houvesse problemas de curto prazo para resolver, como o endividamento e temas ligados à segurança de pessoas e do ambiente.

Mas o problema básico é como fazer projetos de longo prazo se você muda com frequência a gestão. O meu sucessor foi o Ivan Monteiro e o sucessor dele foi o [Roberto] Castello Branco, que tinha uma visão completamente diferente. O que ele quis fazer foi concentrar a Petrobras na obtenção de resultados de curto prazo, abandonando completamente esse desenvolvimento de um planejamento estratégico de mais longo prazo. Então, a Petrobras sofre um grande problema por essa descontinuidade.

P. – Isso devido à pressão política?

P. P. – Me parece meio evidente.

P. – Há uma linha de pensamento que defende que a posição da Petrobras na transição energética deva vir do destino de seus dividendos e não necessariamente da mudança de petrolífera para empresa de energia. Essa também é a sua visão?

P. P. – São coisas diferentes. A Petrobras tem que desenvolver a sua capacidade de continuar fazendo seus negócios no futuro, mesmo que o óleo e o gás percam a relevância que tem hoje. Isso é fundamental, é obrigação de qualquer gestor de empresa.

Outro aspecto é a discussão de políticas públicas e do orçamento do governo federal, onde ele olha de um lado os recursos disponíveis e de outro vê quais são as políticas públicas que fazem sentido. Dividendos da Petrobras que vão para o governo são uma receita do orçamento fiscal, então, é óbvio que eles podem ser utilizados para essa finalidade, mas isso tem que ser visto no conjunto das necessidades que devem ser atendidas pelo orçamento fiscal.

Então, não é que são alternativas ou que são coisas que são mutuamente excludentes. Uma coisa é o que a Petrobras vai fazer para assegurar que ela tenha um futuro de continuidade dos seus negócios. E para isso ela precisa pensar em fontes alternativas de receita. Isso significa mudar de área ou setor? Acho que não deveria.

P. – Seria viável o governo aumentar a taxação de dividendos de acionistas da empresa para garantir que esse recurso fosse para o financiamento da transição energética, como defendeu recentemente o ministro da Economia da Noruega?

P. P. – Você não pode usar a política tributária de maneira a diferenciar contribuintes com a mesma receita. Você pode dizer, por exemplo, que lucros acima de X bilhões, ou acima de tantos por cento do seu capital, ou acima de qualquer grandeza, para todas as empresas terão uma sobretaxa. Agora, existem contribuições econômicas que, eventualmente, podem ser criadas, mas sobre todas as empresas de controle, não só sobre a Petrobras.

O objetivo não é tanto arrecadatório, mas sim regular um determinado setor. Então, por exemplo, vamos usar recursos da Petrobras para pagar um subsídio ao diesel.

P. – A sua gestão foi a responsável por estabelecer o preço de paridade de importação, bastante criticado pelo governo Lula e extinto pela gestão de Jean Prates. O sr. continua achando esse o melhor mecanismo?

P. P. – Aqui tem uma primeira discussão que é sobre a obrigação legal da Petrobras, a obrigação que consta na lei que a criou ou na lei que a regula hoje em dia. [A obrigação dela] é garantir o abastecimento de combustível em todo o território nacional, não é garantir preço bom, qualquer que seja a sua definição de preço bom.

Um tema relevante para o país é o fato de que ele importa uma grande quantidade de derivados e, para que a empresa possa continuar fazendo essa importação, ela precisa ter preços com a paridade de importação, ou seja, quanto custa para ela trazer um litro de diesel colocado dentro do Brasil.

Então, não era um capricho, era uma recomendação, uma determinação de que ela precisa segurar o abastecimento em todo o território nacional. Se ela não praticar os preços adequadamente, pode haver falta de diesel em mercados onde não há bases próximas.

P. – Mas caberia ao governo, por meio de subsídios ou corte de impostos, garantir o ajuste do preço dos combustíveis?

P. P. – Não. Em nenhum país sério e desenvolvido o governo tem a obrigação de garantir preços de petróleo. Isso não existe, está certo? Nos Estados Unidos, o preço sobe e desce de acordo com o aumento de preços internacionais e ninguém acusa o governo, ninguém sai xingando o governo. Na Europa, o preço do combustível ainda é muito mais caro que no Brasil. Isso é derivado direto da lei da oferta e da procura.

P. – Como o sr. avalia a gestão do Prates na Petrobras?

P. P. – Eu acho que tem pouco tempo para julgar, não dá para avaliar ainda. Ele acabou de sair, e os resultados de uma política são conhecidos não imediatamente, mas após algum tempo. Quando nós entramos na Petrobras, a empresa valia cerca de US$ 30 bilhões, e quando nós saímos ela valia mais de US$ 100 bilhões, então aí você já tem a condição de fazer uma avaliação.

P. – E a Magda é um bom nome para a função?

P. P. – Eu tive alguns contatos com ela quando ela era presidente da ANP. Eu estava, se não me engano, como presidente da Unica, para falar do tema de preços de etanol, e meus contatos com ela sempre foram bastante profissionais. Então, não tem nenhuma razão para fazer qualquer comentário negativo a respeito dela.

RAIO-X | PEDRO PARENTE, 71

Presidiu a Petrobras durante o governo de Michel Temer (MDB), entre 2016 e 2018. Antes disso, foi ministro da Casa Civil do governo Fernando Henrique Cardoso, entre 1999 2 2002, sendo que em 2001 comandou o comitê responsável por administrar a crise energética e organizar as regras do racionamento em todo o país. É sócio-fundador da eB Capital, gestora de investimentos em Private Equity.

PEDRO LOVISI / Folhapress

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