PT isola Rui Costa em Salvador, e aliado de ministro desiste de concorrer a prefeitura

SALVADOR, BA (FOLHAPRESS) – Aliado do ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), o ex-vereador José Trindade (PSB) desistiu concorrer à prefeitura de Salvador em 2024, movimento que expôs uma tensão interna da cúpula do partido com o homem-forte do governo Lula (PT).

A desistência acontece uma semana depois de PT referendar o deputado estadual Robinson Almeida como pré-candidato à prefeitura de Salvador, decisão que foi celebrada pela cúpula do partido, irritou legendas aliadas e aprofundou o isolamento de Rui no PT da Bahia.

O deputado foi indicado em reunião do diretório municipal do partido na última quinta-feira (24). No dia seguinte, a escolha foi validada pelo diretório estadual em ato com a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, que apoiou a decisão.

A indicação foi aprovada por unanimidade, revertendo uma divisão interna consolidada nos últimos meses e opunha aliados de Rui Costa e do senador Jaques Wagner. Ambos divergem na estratégia para enfrentar o prefeito e pré-candidato à reeleição Bruno Reis (União Brasil).

A decisão final caberá ao governador Jerônimo Rodrigues (PT), que defende uma candidatura unificada e vai arbitrar os interesses conflitantes dos aliados. A escolha deve ser feita até outubro, quando faltará um ano para as eleições.

Nesta sexta-feira, em conversa com a reportagem, Trindade alegou problemas de saúde para desistir da candidatura – ele recentemente passou por uma cirurgia cardíaca para colocar três stents para restaurar o fluxo sanguíneo na artéria coronária.

“Vou priorizar minha saúde, a campanha para prefeito é muito desgastante e eu não preciso ser candidato para ajudar Salvador”, disse Trindade, confirmando a desistência.

Em cargo no centro nervoso do governo Lula (PT), Rui Costa tem evitado falar sobre a eleição em Salvador. Mas vinha sinalizando a aliados sua preferência pela pré-candidatura de José Trindade (PSB), presidente da Conder, estatal do governo estadual responsável por obras de infraestrutura.

Aliados do ministro viam como favorável o cenário de uma candidatura ligada mais ao centro e a setores da classe média. Trindade é engenheiro, e foi dirigente do sindicato patronal do setor de combustíveis. Foi vereador entre 2013 e 2020, período em que se aproximou de Rui Costa.

A entrada de Trindade no jogo da sucessão foi vista pela base como uma tentativa de demonstração de força do ministro, movimento que passa pelas eleições de 2026, quando seu plano é concorrer a uma vaga ao Senado. Setores do PT criticam o ministro por não desapegar de questões paroquiais da Bahia.

O maior ponto de tensão aconteceu quando foi iniciada uma operação política para filiar José Trindade ao PT para concorrer à prefeitura. Mas a estratégia sofreu resistência intensa dos petistas, que passaram a defender um nome orgânico da legenda em caso de candidatura própria.

O primeiro recado interno veio em abril, quando o diretório municipal sinalizou candidatura em Salvador e apresentou como pré-candidatos Robinson Almeida, a socióloga Vilma Reis e vereadora licenciada Maria Marighella.

As duas últimas perderam força ao assumirem cargos federais fora de Salvador – Vilma Reis se tornou assessora nos Correios em Brasília e Maria Marighella assumiu o comando da Funarte, no Rio de Janeiro. Coube a Robinson encarnar o desejo da militância por um candidato próprio.

“Defendo que o PT precisa renovar suas lideranças para construir um novo ciclo em Salvador. Apresentei meu nome e vamos sentar na mesa para conversar com os aliados” disse Robinson Almeida à Folha de S.Paulo.

Deputado estadual em segundo mandato, Robinson Almeida foi secretário de Comunicação entre 2007 e 2014 na gestão Jaques Wagner, de quem é aliado. Dentro do PT, faz parte da tendência minoritária Democracia Socialista.

O deputado não teve apoio público de Wagner, mas foi estimulado a apresentar seu nome para a disputa. Publicamente, o senador tem dito que a condução da sucessão cabe ao governador e defende que o PT se mantenha aberto a apoiar candidatos de outros partidos.

No entorno do senador, contudo, há uma avaliação de que uma candidatura do PT teria mais condições de dar voz um programa alinhado com governador Jerônimo Rodrigues, o que reposicionaria o partido em Salvador e reforçaria uma oposição mais ideológica ao prefeito Bruno Reis.

Seria um movimento visando não repetir as eleições de 2016 e 2020, quando não houve um acúmulo de forças para as eleições seguintes.

Na última eleição, o partido acatou a indicação do então governador Rui Costa e apostou em uma outsider: a policial militar Denice Santiago. Quatro anos antes, a candidata foi a deputada federal Alice Portugal (PC do B). Foram derrotados no primeiro turno nas duas oportunidades.

Desta vez, o PT tem mostrado relutância em aceitar um nome imposto de cima para baixo. Um cenário que deixa o ministro Rui Costa isolado dentro do próprio partido, mesmo com forte influência dentro da base aliada na Bahia.

Por outro lado, a disposição do PT em concorrer mais uma vez em Salvador irritou partidos aliados, que veem uma postura de hegemonia dos petistas. Com exceção de 2016, o partido disputou todas as eleições municiais na capital baiana desde a redemocratização em 1985.

Nos partidos aliados de Jerônimo, também despontam para disputar a prefeitura nomes como o vice-governador Geraldo Júnior (MDB) e a deputada estadual Olívia Santana (PC do B) e o vereador Silvio Humberto (PSB).

O emedebista foi vereador em Salvador por quatro mandatos e foi presidente da Câmara Municipal. Era aliado do prefeito Bruno Reis e do ex-prefeito ACM Neto (União Brasil), mas rompeu com ambos para se unir ao PT na sucessão estadual do ano passado.

Sua força vinha do apoio dos vereadores e de parcela do empresariado. Mas ele sofreu um revés na última semana ao ver sucessor da presidência da Câmara, vereador Carlos Muniz (PSDB), anunciar seu apoio à reeleição do prefeito.

Geraldo também enfrenta resistências de uma parcela do PT, sobretudo aliados mais próximos aRui Costa. Ainda assim, o MDB aposta no vice-governador como candidato de unidade.

“Vamos trabalhar por um projeto que fortalece a todos ou apenas um partido? Essa é a questão. Se for apenas para cumprir tabela, melhor cada partido apresentar seu candidato”, afirma o ex-deputado Lúcio Vieira Lima, presidente de honra do MDB da Bahia.

Olívia Santana foi a deputada estadual mais votada em Salvador nas eleições de 2022, mas não tem o respaldo da cúpula governista. Nas últimas semanas, fez críticas à gestão da segurança pública na Bahia, sobretudo em relação à letalidade policial, a mais alta dentre os estados brasileiros.

Na base de Jerônimo, a expectativa é de uma eleição difícil contra o prefeito Bruno Reis. Diz o deputado federal Bacelar (PV): “Vamos enfrentar um grupo político que é muito forte, mas não é imbatível. Se chegarmos unidos, temos chances de vencer.”

JOÃO PEDRO PITOMBO / Folhapress

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