São Paulo – Nomes reconhecidos entre o empresariado brasileiro, de diferentes setores da economia, estão descobrindo um gosto em comum e desbravando um mercado bastante diferente de seus negócios de origem.
Aos poucos, a produção de vinhos tem atraído um rol de nomes pesos-pesados da economia brasileira, que estão levando a sério o novo empreendimento e profissionalizando a produção. O principal alvo tem sido Portugal, que já recebeu investimentos de Rubens Menin, dono da MRV, e de André Esteves, do BTG Pactual.
Menin passou a investir na região do Douro, conhecida pela qualidade da produção dos vinhos, em 2018. Antes disso, Esteves, do BTG, já havia decidido apostar nas vinhas portuguesas desde o fim de 2012.
“Este interesse de aquisição de vinícolas por parte de empresários brasileiros está muito relacionado com o prestígio que os vinhos portugueses têm no Brasil. Acreditamos que a imagem dos vinhos de Portugal no Brasil começa a ser prestigiada e atrai investidores brasileiros”, afirma o presidente da Vini Portugal, Frederico Falcão.
Hoje, Portugal é o 9.º exportador mundial de vinhos e o 11.º maior produtor mundial, mas há também quem esteja buscando oportunidades aqui na América do Sul. A família do empresário Benjamin Steinbruch, presidente da siderúrgica CSN, criou um vinhedo em seu haras na região de Solís de Mataojo, no Uruguai.
Já o ex-secretário do Tesouro Nacional, Carlos Kawall, decidiu sair da direção do Asa Bank para tirar um ano sabático e cuidar da sua vinícola na região de Mendoza, na Argentina.
Os investimentos pesados feitos pelos brasileiros refletem uma paixão crescente pela bebida no Brasil, reforçada durante a pandemia.
Depois de um salto em 2020, o consumo de vinhos finos no Brasil no ano passado foi de 27 milhões de litros, aumento de 11,4% em relação ao ano anterior, de acordo com dados da União Brasileira da Vitivinicultura (Uvibra). Segundo especialistas e os próprios empresários investidores, ainda há um espaço enorme para crescer.
OS EMPRESÁRIOS DO VINHO
Rubens Menin, presidente do conselho da MRV
Menin quer construir uma experiência de vinhos em Portugal
Há tempos o empresário Rubens Menin decidiu enveredar por outros caminhos além da construção, setor em que criou a MRV, a maior construtora da América Latina. Dono desde banco até emissora de televisão, Menin tem dois negócios que acabam também sendo um hobby: o investimento em seu time de coração, o Atlético Mineiro, e a Menin Wine Company (MWC). E isso não quer dizer que os investimentos foram pequenos. O empresário, que começou no negócio de vinhos em 2018, já investiu mais de 30 milhões de euros (cerca de R$ 180 milhões) em 140 hectares de terra na região do Douro, no norte de Portugal. Com vinhos que chegam a custar R$ 2 mil, a produção atual da MWC bateu 240 mil garrafas em 2021. Nos próximos anos, Menin fará mais um aporte de 30 milhões de euros para construir um resort na região do Douro e uma infraestrutura de turismo. Além disso, também serão compradas novas vinícolas.
O presidente do conselho e fundador da MRV diz que está otimista com os lucros futuros na região. Por isso, quer ampliar sua produção para 360 mil litros até 2025. “Portugal, hoje, é um país muito barato e com muito potencial em comparação a regiões como França e Itália.”
Alberto Weisser, ex-presidente da Bunge
Depois da aposentadoria, investimento em uma antiga paixão
Ex-presidente da gigante do setor de alimentos Bunge, Alberto Weisser afirma que sua paixão por vinhos é bastante antiga. No entanto, sua entrada no negócio ocorreu somente em 2015, quando se aposentou, aos 58 anos. Nessa época, bateu o martelo e comprou a Herdade dos Coelheiros, localizada em Alentejo, região próxima a Lisboa. O empresário diz que o negócio ainda não está no azul, mas que logo chegará lá. “Quem investe em vinho é por paixão. Dois terços (da produção) não dão lucro”, diz Weisser. Hoje, ele ainda tem presença no mundo executivo, como membro de três conselhos de administração (Bayer, Linde e PepsiCo) e consultor no fundo de private equity Temasek. Mesmo assim, Weisser diz que agora consegue equilibrar as agendas a partir de Portugal. Além da vida nos conselhos, Weisser utiliza os conhecimentos adquiridos ao longo da vida executiva em sua vinícola. Por lá, tornou a produção orgânica e focou no mercado premium. Com isso, as 400 mil garrafas que eram produzidas anualmente caíram para 100 mil. No Brasil, as garrafas da Herdade dos Coelheiros podem ser encontradas em restaurantes famosos, em lojas especializadas e no Pão de Açúcar. Na Mistral, as garrafas vão de R$ 250 a R$ 1,1 mil.
Vicente Donini, ex-presidente e acionista da Marisol
Aos 79 anos, o ‘aposentado’ Donini trabalha todos os dias
Após passar décadas tocando os negócios da Marisol, uma das maiores indústrias de roupas infantis do Brasil, dona de marcas como Lilica Ripilica, Tigor T. Tigre e a própria Marisol, o empresário Vicente Donini não queria ficar apenas nos quatro conselhos de administração em que atua. Ao mesmo tempo, sabia que não poderia ficar se metendo nos negócios após o processo de sucessão. Decidiu, então, partir para o mundo dos vinhos.
“Do alto dos meus 79 anos, continuo trabalhando todo dia e o dia todo, só faço o que gosto e gosto de tudo o que faço”, afirma Donini. A entrada no mercado ocorreu em 2015. O empresário escolheu a serra catarinense, mais precisamente a cidade de São Joaquim, e comprou a Vinícola Vivalti, para a qual planejou investimentos na ordem de R$ 10 milhões. Atualmente, a Vivalti conta com uma área de 16 hectares de vinhedos, sendo 12 com uvas plantadas. A vinícola produziu 32,5 mil garrafas de vinho em 2021 e espera chegar a 36 mil neste ano. Porém, o empresário admite que ainda se trata de um negócio em que o retorno é incerto. Mesmo assim, sua meta é transformar a companhia sustentável nos aspectos econômico, social e ambiental. Prevê chegar às 100 mil garrafas na safra de 2029.
Carlos Kawall, ex-secretário do Tesouro Nacional
Um período sabático regado a vinho argentino
Até fevereiro, o economista Carlos Kawall era sempre procurado para dar sua visão sobre os dados da economia brasileira. Porém, Kawall decidiu sair do cargo de diretor da gestora Asa Bank e tirar um período sabático. O economista, no entanto, não vai ficar totalmente parado: sua atenção será voltada para o rótulo de vinho Gomez Kawall, criado com a sua esposa Priscila, em 2012. Ao contrário de outros empresários, Kawall não comprou terras extensas. Ele utiliza a estrutura do The Vines of Mendoza, no sul da Argentina, que é um espaço que reúne um resort de luxo e um vinhedo para apaixonados que querem um vinho para chamar de seu. O The Vines auxilia em todo o processo, desde a plantação até a exportação. O negócio começou como hobby, mas o economista quer escalar. Ele se baseia no consumo por litro no Brasil em comparação a outros mercados. Apesar da alta com a pandemia, os brasileiros bebem, em média, 2,8 litros de vinho por ano – os argentinos, por exemplo, consomem 27,6 litros. “O potencial do vinho é muito grande e é um horizonte de médio a longo prazos”, diz. Por ora, o economista acredita que a sua produção de 3,5 mil garrafas ao ano atende à demanda atual, mas tem a capacidade para chegar a 5 mil.
André Manz, presidente da Manz Wine
Do mercado fitness à uva rara em vila portuguesa
Vivendo há mais de 30 anos em Portugal, o primeiro negócio de André Manz foi no mercado esportivo: no fim da década de 1980, ele levou a aeróbica coreografada para a Europa. O investimento em vinho, já nos anos 2000, ocorreu sem planejamento, no quintal de onde seria sua casa, em Chelheiros. No começo dos anos 2000, já com seu negócio no mercado fitness e de eventos consolidado, Manz comprou um vinhedo próximo à sua casa e investiu em maquinário, inicialmente pensando no consumo próprio. Mas o negócio foi crescendo. Na primeira colheita, foram encontrados dois tipos de uvas: Castelão tinto e uma uva branca, que enólogos tiveram dificuldade em identificar. Tratava-se da uva Jampal, espécie portuguesa quase extinta e que garantiu fama e prêmios à vinícola. Hoje, a produção chega a 500 mil garrafas por ano, que no Brasil são facilmente encontradas em restaurantes “classe A”. Exportando para 28 países, a chegada de Manz ao mercado nacional não foi das mais simples, pois teve de enfrentar preconceito do público que rejeitava o vinho produzido por um brasileiro. “Foi difícil encontrar importadores para levar nossos vinhos para o Brasil”, diz.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.