SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O governo da Argentina anunciou neste domingo (14) um pacote de medidas para tentar conter a inflação acima de 100% e estabilizar o peso frente ao dólar. Entre as principais iniciativas, está o aumento da taxa básica de juros, que vai passar de 91% para 97% ao ano.
Em um cenário no qual a taxa Selic do Brasil paga um rendimento de 13,75% ao ano, a remuneração oferecida pelos títulos argentinos chama a atenção de investidores em busca de oportunidades na renda fixa.
Especialistas de mercado ressaltam, contudo, que quanto maior o retorno oferecido, maior o nível de risco que o aplicador assume ao fazer o investimento.
Não é diferente no caso da Argentina. Economista-chefe da Mirae Asset Wealth Management, Julio Hegedus Netto diz que o maior risco de investir no título argentino é de o Tesouro do país simplesmente não pagar o investidor. “Isso porque a chance de a Argentina pedir moratória da sua dívida novamente é grande”, afirma Hegedus Netto.
Em março, a agência Fitch rebaixou o rating da dívida soberana em moeda estrangeira da Argentina para refletir sua visão de que um calote da dívida é iminente.
O economista-chefe da Mirae Asset acrescenta que o CDS (Credit Default Swap), indicador que mede o risco de um determinado país ou empresa ficar insolvente, é negociado em patamar bastante elevado, ao redor dos 1,3 mil pontos no caso da Argentina. Como comparação, o CDS do Brasil roda atualmente ao redor dos 230 pontos.
“O CDS está nas alturas. Ou seja, o mercado acredita que o calote é cada dia mais possível”, afirma Hegedus Netto. Ele lembra que não tem muito tempo, em meados 2020, a Argentina já deixou de honrar o pagamento de juros no valor de US$ 500 milhões. “Tem que ter muito sangue frio [para investir na Argentina]. Eu não recomendo para pessoa física.”
Coordenador do Centro de Estudos em Finanças da Fundação Getulio Vargas (FGVcef), William Eid Junior afirma que o investimento em títulos de Argentina se trata de uma aposta de alto risco que tende a adicionar volatilidade para a carteira dos investidores.
Ele acrescenta que, para aquelas pessoas de elevado patrimônio, destinar uma pequena parcela para um investimento de risco alto, com a chance de ter um retorno também elevado, pode até fazer algum sentido. Mas que, para quem não dispõe de grandes quantias para aplicar no mercado, o investimento em dívida da Argentina não é recomendável.
“Acho que não faz sentido para a pessoa física se arriscar tanto”, diz o especialista.
ACESSAR INVESTIMENTO
Além de se tratar de um investimento de risco bastante elevado, o acesso aos títulos de dívida da Argentina não é simples.
Os títulos do país vizinho não são negociados diretamente no mercado brasileiro, diz Eid Junior. Por isso, para aqueles com estômago para aguentar o vai e vem dos papéis argentinos, prossegue o coordenador da FGV, uma alternativa é abrir uma conta internacional, oferecida pelas áreas de private banking dos grandes bancos, em que o investidor tem acesso ao mercado dos Estados Unidos, que faz a negociação desses títulos.
Economista e sócio fundador da consultora de planejamento financeiro Sarfin, Bruno Mori afirma que, para operar títulos de divida dos Tesouros nacionais, o mais comum é ter conta em moeda corrente do país em questão.
“Essa operação é feita via corretora, da mesma forma como compramos e vendemos títulos do Tesouro brasileiro”, afirma Mori. Ele acrescenta que o investidor pessoa física precisa ter conta em pesos em algum banco ou corretora da Argentina, fazer o câmbio de reais para pesos argentinos e selecionar o título com base no prazo e juros oferecidos.
“A questão envolve vários riscos. Os dois principais são a variação cambial e o risco de crédito do Tesouro argentino”, diz o planejador. “O investidor deve mapear todos os riscos envolvidos e avaliar se a operação faz sentido de acordo com o próprio perfil de risco”, afirma Mori.
LUCAS BOMBANA / Folhapress