“Cadê meu celular? Vou ligar pro 180.” A frase virou grito. Virou denúncia. Virou coragem. A música “Maria da Vila Matilde (Porque Se a Da Penha é Brava, Imagina a da Vila Matilde)”, lançada por Elza Soares no monumental álbum A Mulher do Fim do Mundo, ultrapassou os limites da arte para se tornar um dos maiores símbolos de enfrentamento à violência contra a mulher no país.
Elza, que transformou sua própria história de dor em potência, emprestou voz a milhões de mulheres brasileiras que, diariamente, convivem com o medo dentro de casa o lugar onde, ironicamente, deveriam se sentir mais protegidas. A canção fala sobre a mulher que não aceita mais o ciclo de violência e decide romper o silêncio, chamando ajuda, exigindo respeito, reivindicando sua vida.
Durante anos, campanhas de combate ao feminicídio utilizaram a frase do refrão como forma de instrução e incentivo. De forma direta e urgente, Elza fez aquilo que poucos artistas conseguem: traduzir estatísticas em carne, sangue e poesia. O 180 canal nacional de denúncia tornou-se mais conhecido entre jovens e mulheres graças à força dessa música.

A potência da obra reside também no sarcasmo afiado: Elza canta a dor com ironia, canta o desespero com revolta, canta a violência com resistência. O humor ácido confronta o agressor e empodera a vítima. É arte como reação, arte como arma, arte como sobrevivência.
Num país onde, segundo dados recentes, uma mulher é vítima de feminicídio a cada seis horas, Elza Soares permanece mais atual do que nunca. Sua música continua ecoando em movimentos sociais, em salas de aula, em rodas de conversa, em páginas de jornal.
E sempre que uma mulher, em algum canto do Brasil, decide pegar o celular e ligar — para pedir ajuda, para romper o ciclo, para viver — a voz de Elza está ali, soprando coragem no seu ouvido.



