“Se emocionalmente o atleta estiver desestruturado, não adianta nada ele estar completamente condicionado”, afirma especialista em autoconhecimento

Renato Troglo, especialista em autoconhecimento e o mesatenista Israel Stroh, que contratou o treinador em janeiro deste ano para treiná-lo, visando os Jogos Paralímpicos de Paris/ Créditos: Arquivo Renato Troglo Divulgação

A realização dos Jogos Olímpicos de Paris, entre 26 de julho e 11 de agosto deste ano, mexe com todos, em especial com os atletas que estarão nesta competição poliesportiva. A mente, portanto, tem de estar ainda mais preparada do que o próprio físico.

“Os Jogos Olímpicos acontecem a cada quatro anos. Por essa razão, o impacto emocional, a qualidade e o que é gerado de valor para esse evento é enorme. É por isso que, muitas vezes, a gente, o nosso sistema nervoso, nossa mente, nosso cérebro, se boicota, tentando nos precaver e tornando-nos mais ansiosos, pela valência emocional que o evento possui. Temos que estar bem preparados para não entendermos desta forma e não reagirmos”, explica o especialista em autoconhecimento, Renato Troglo.

Com cursos no currículo de Inteligência Emocional, Neurociência do Comportamento, Constelação Familiar, Medicina Germânica, Linguagem Corporal, Hipnose, entre outros, o ex-professor de Educação Física traça a diferença entre um atleta amador e um de alta performance, mas com um componente que tem de ser igual.

“O que diferencia é justamente o dom, o preparo, a constância. A mente tem de estar muito mais condicionada do que a preparação física porque tudo do meio externo vem primeiro no nosso cérebro, não importando se o atleta está com a melhor preparação física. Se emocionalmente ele estiver desestruturado, não adianta nada ele estar completamente condicionado”, afirma.

A aplicação dos conceitos envolvendo autoconhecimento para atletas, segundo Troglo, é definida apenas se o esporte é individual ou coletivo. E não varia para treinos e competições. “O que separa o treino da competição é só o valor emocional de como aquilo é recebido pelo sistema nervoso. Todo treinamento mental e reestruturação das memórias é feita bem antes. Ou seja, todo condicionamento é feito na preparação”, detalha.

O roteiro da busca pelo autoconhecimento geralmente acontece nos piores momentos. E com o atleta não é diferente, lembra o especialista. “Infelizmente, a gente só reconhece o problema quando é gerada uma dor, uma causa, um impacto. Só aí a gente tem clareza de que a gente necessita de alguma busca e resolução”, afirma.

Dentro de um esporte coletivo, o futebol tem suas particularidades fora de campo. Renato Troglo trata muitos atletas da modalidade e as diferenças vão muito além do que se possa imaginar, provocadas em especial pelo lado financeiro.

“A quantidade de recursos e dinheiro que são conquistados é muito grande. A partir do momento que eu tenho um salário alto, não tenho porque eu achar e acreditar que o culpado seja a minha mente. O dinheiro faz a gente visualizar e boicotar muita coisa na nossa vida, burlando e camuflando os nossos erros. Passamos a acreditar que somos um super-homem ou, simplesmente, que a gente é o cara, é perfeito”, analisa.

O especialista afirma que os atletas, em especial os brasileiros, não estão preparados para essa mudança causada pelos ganhos estratosféricos proporcionados pelo futebol. O motivo está justamente na origem humilde da maioria, que pode gerar sérias e tristes consequências no futuro.

“O padrão fisiológico mental tem outro condicionamento porque eles vêm muito de baixo. A mente deles está condicionada ao sofrimento e ao erro. Quando ele ganha esse valor exorbitante e muda de vida, desestrutura e, muitas vezes, o atleta acaba indo para o álcool ou para alguma coisa pior porque o atleta de futebol, principalmente, é muito solitário. E a pior doença do mundo é a solidão. Então, ele precisa suprir com algo para fazer a vida dele melhorar e se boicota com argumentos, situações em que ele possa favorecer esse estado de solidão dele”, revela.

Exemplos e tendências

A busca por autoconhecimento – e os resultados obtidos – tem feito a diferença na carreira de atletas de várias modalidades atendidos por Troglo.

No futebol, o especialista citou dois jogadores surgidos no Santos: o goleiro Felipe, de 36 anos, atualmente no Tombense, de Minas Gerais, e o meia Gabriel Pirani, de 22 anos, que defende o DC United, do Estados Unidos, e também figura em convocações para a seleção brasileira.

“O Felipe faz um trabalho comigo há uns dois, três anos. Uma simples reportagem causou danos morais, físicos e psicológicos. Ele foi considerado por vezes seguidas o melhor goleiro do Campeonato Mineiro, dentro de uma ascensão esportiva que o Tombense teve, porque eu reestruturei as informações negativas dele”, explica Troglo.

No caso de Pirani, fraturas provocaram sérias consequências emocionais, corrigidas pelo trabalho do especialista. “O pai dele havia me relatado que ele não entrava nos lances de bola. E fui conversar com o jogador. Quando ele estava no Cuiabá (em 2022), tinha fraturado um tornozelo. Quando estava melhorando para voltar para o Santos (estava emprestado), fraturou o outro. Isso gerou um impacto emocional muito forte no sistema nervoso dele. Em duas sessões, a gente mudou essa reação fisiológica por intermédio de técnicas e analogias. Hoje, ele é um atleta totalmente diferente”, detalha.

Campeão brasileiro de 2019, o surfista de São Sebastião, Igor Moraes, também superou um trauma depois das sessões com Renato Troglo. “Há três anos, o Igor fez duas sessões comigo. Ele não dava mais aéreos (manobra do surfe), algo que ele mais gostava, em razão de uma fratura em um dos tornozelos. Tirei essa reação do sistema nervoso dele, que voltou a fazer os aéreos com excelência”, conta.

Prata em Paralimpíada e em Jogos Parapan-Americanos, o mesatenista Israel Stroh contratou o especialista em autoconhecimento em janeiro deste ano para treiná-lo, visando os Jogos Paralímpicos de Paris. E os resultados já vieram em março, com o título de duplas MD14 no Aberto Paralímpico Fa20 da Polônia, com o espanhol Jordi Morales.

“Ele se mostrava completamente nervoso e desestruturado quando ocasiões saíam da linha de raciocínio que não fosse a dele. Então, a gente já trabalhou essas reações, tornando-se muito mais calmo, por intermédio do sistema nervoso parassimpático. Sendo assim, ele está entendendo melhor as situações de jogo e as estratégias, sagrando-se campeão na Europa”, detalha.

Embora o atleta atualmente tenha mais consciência da necessidade do autoconhecimento, Renato Troglo lamenta que o Brasil ainda esteja muito atrás dos outros continentes no assunto e que, somente agora, está sendo dado valor à parte emocional.

“Se você perceber, nos campeonatos americanos e europeus, tem sempre alguém ligado à mente, indiferentemente da posição que tem, seja um psicólogo, um coach ou um terapeuta, que sempre alinha junto com o treinador. Até porque, naquele momento, é necessário esse profissional. É ele que vai conduzir a mente do atleta totalmente desestruturada porque ele está em fase de jogo, de competição, para alinhar melhor as estratégias e conduzi-lo melhor, seja em uma partida, em um evento ou competição. Infelizmente, a gente está muito atrás ainda. E quem está começando a entender isso, está saindo na frente”, finaliza.

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