Homem – Massa

Mais uma vez volto ao filósofo espanhol Ortega y Gasset e o seu conceito de  homem – massa, aquele sujeito que quer impor suas convicções, não por elas serem as melhores, mas por elas serem medíocres. O homem massa é aquele que nutre a ignorância, a boçalidade, a incapacidade de reflexão, o não uso do bom senso e a não aceitação do contraditório. Retrato fiel disso pode ser constatado nas reações espetacularmente ridículas dos fanáticos apoiadores do presidente Bolsonaro, derrotado, democraticamente, nas últimas eleições.

Acredito, certamente, que são poucos, embora estridentes e orgânicos. Não julgo e nem generalizo os que votaram no atual presidente. Muitos deles o fizeram por ato antipetista, inaceitação de um governo de ideias gastas e populistas. Creio também que um outro tanto nutria o desejo de ver prosperar um governo de direita, alinhado com os preceitos neoliberais que a sociedade moderna requer.

No entanto, o que temos visto está muito longe das construções ideológicas e bem perto do caos humano. Pior derrotado não é aquele que perde, mas aquele que não aceita a perda. Ele vampiriza o espaço, desdobra a sua obsessão doentia, desafia a lógica, resgata o esgoto e faz imperar o asco e o nojo. São párias de um descombro social. Pululam pelas artérias infeccionadas do corpo da sociedade. Vomitam e defecam a sordidez com naturalidade.

A impossibilidade de reconhecer a negação da vontade alheia é o instrumento mais poderoso do arbítrio descompensado. Refazer-se é o segredo da evolução. Buscar o conhecimento do ato falho, recompor peças, reestruturar estratégias, incentivar o moral, sair das cinzas como fênix é a trilha da sabedoria.

Aquele que perde um pleito precisa aprender a respirar sem a necessidade do balão de oxigênio. É um exercício diário de nascer e nascer, tantas vezes quantas forem necessárias. As ideias não morrem nas datas, mas sim no seu abandono. Nunca há destruição de quem perdeu no voto democrático, há sim um incentivo para a retomada, para outro instante, para outra jornada.

Querer decidir no tapete das artimanhas, no braço e na ponta da espada é assumir a derrota eterna. Perdedores agem assim, jamais os vitoriosos. É preciso entender que, se injustiças aconteceram, se houve arbitrariedade na disputa, tudo isso precisa ser pautado, avaliado, cobrado e não imposto pelos canhões da ignorância.

Democracia é um ato de constante aprendizagem. A luta é cotidiana. Trata-se de uma circunferência, em que estamos no alto um dia e noutro ocupamos a parte de baixo. Depois haverá a troca. Isso é lição de vida. Nada justifica a violência. Ninguém impõe nada pelo barbarismo, apenas marca um átimo de tempo, mas desmorona porque não tem raiz, alicerce.

As manifestações vão passar, os que as provocaram talvez saiam ilesos, mas temo pelos que simplesmente retumbaram sem refletir. Esses serão pisoteados e sucumbidos pelo ressentimento, pela frustração e pela falta de embasamento ideológico. Serão homens – massa. Nada mais. Pena.

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