Quem foi Pagu? A revolucionária que sacudiu o Brasil com arte, política e ousadia

Imagine uma mulher de smoking e cigarro entre os dedos, discursando em comícios comunistas nos anos 1930. Ou uma jornalista publicando críticas ferinas à burguesia em plena Era Vargas. Ou ainda uma artista que ousou escrever o primeiro romance proletário do Brasil, desafiando cânones literários e morais.

Essa mulher existiu: Patrícia Galvão, a Pagu – figura tão fascinante que parece personagem de ficção. Sua vida foi um turbilhão de arte, rebeldia, prisões, exílios e paixões. Mais do que uma musa do Modernismo, ela foi uma das vozes mais radicais de seu tempo.

Infância e primeiras revoltas
Nascida em 9 de junho de 1910, em São João da Boa Vista (SP), em família abastada, Patrícia Rehder Galvão, conhecida como Pagu, mostrou desde cedo seu espírito rebelde que marcaria toda sua trajetória.

Aos 15 anos, quando a maioria das jovens de sua classe social se preocupava com bailes e casamentos, Pagu já escrevia textos críticos em jornais estudantis questionando o papel da mulher na sociedade. Recusava-se veementemente a seguir o comportamento esperado das “moças de família”, preferindo discussões sobre literatura e política.

A entrada no cenário modernista
Sua mudança para São Paulo, em 1928, a colocou no coração do Movimento Modernista. Com apenas 18 anos, frequentava a elite intelectual paulistana, destacando-se por sua inteligência afiada e comportamento desafiador.

O casamento escandaloso
Em 1930, Pagu causou frisson ao casar-se no Cemitério da Consolação com Oswald de Andrade, 23 anos mais velho, líder do movimento antropofágico. O escândalo foi duplo: além da cerimônia macabra diante do jazigo da família do noivo, Pagu assumia publicamente um relacionamento que começara como um triângulo amoroso com Tarsila do Amaral, então esposa de Oswald.

Pagu ao lado de Oswald e do filho Rudá, no início da década de 1930 – Foto: Acervo Lúcia Teixeira/ Centro Pagu Unisanta

O casal tornou-se símbolo da boemia intelectual, frequentando bares onde Pagu fumava, bebia e discutia política com uma liberdade até então inédita para mulheres. Juntos, criaram o polêmico jornal “O Homem do Povo”, cheio de sátiras à burguesia que lhes rendeu inimizades e admiração. Dessa união nasceu Rudá de Andrade, mas o casamento turbulento terminou em 1934.

A conversão ao comunismo
Em 1931, Pagu deu um passo decisivo ao filiar-se ao Partido Comunista Brasileiro. Sua militância a levou a distribuir panfletos em fábricas, organizar greves e, consequentemente, ser presa.

Durante a Intentona Comunista de 1935, Pagu foi brutalmente torturada pela polícia de Getúlio Vargas. Mesmo sob tortura, não delatou companheiros, mostrando uma coragem que lhe rendeu respeito até entre adversários políticos.

Passou cinco anos entre prisões e clandestinidade, incluindo uma temporada na União Soviética. Essa experiência marcou seu afastamento gradual do Partido Comunista, embora nunca tenha abandonado suas ideias revolucionárias.

De volta ao país, dedicou-se ao jornalismo combativo em A Tribuna de Santos, sob o pseudônimo King Shelter. Suas crônicas afiadas criticavam governos e hipocrisias sociais, mantendo vivo seu espírito contestador.

Legado revolucionário
Em 1933, Pagu publicou “Parque Industrial”, considerado o primeiro romance proletário brasileiro. A obra, que retratava cruamente a exploração de operárias paulistanas, foi censurada e só seria relançada décadas depois, confirmando seu caráter visionário.

Pagu morreu em 12 de dezembro de 1962, vítima de câncer, mas seu legado permanece vivo. Precursora do feminismo no Brasil, símbolo da resistência política e da liberdade artística, sua vida foi um manifesto contra as convenções.

Sua história desafia-nos a perguntar: quantas outras Pagus ainda precisamos redescobrir? Quantas vozes revolucionárias seguem silenciadas? Pagu vive não apenas na memória, mas na luta de todas que ousam desafiar seu tempo.

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