Por que ‘O Barão de Jaguara’ foi tão importante para Campinas?

Sidney Rocha
Sidney Rocha
Professor de história e geografia, nascido e criado em Campinas e apaixonado pela cidade. Com uma formação acadêmica complementada pela vivência nos diversos estratos sociais que compõem nossa rica região, gosto de contar histórias que encantem e levem à reflexão em busca de um mundo mais saudável para todos os aspectos da experiência humana. Convido você a acreditar que conhecer os fatos do passado faz parte da nossa jornada pela vida, afinal recordar é viver.

Iniciou-se o ano de 1889 com grande pompa e estilo na cidade de Campinas. O grande teatro São Carlos, ponto de encontro da elite campineira serviu de palco para as apresentações que anunciavam a chegada de um ano novo cheio de expectativas e novidades. Os bailes daquele início de ano foram inesquecíveis também no Teatro Rink, onde se juntavam as pessoas menos abastadas da cidade.

Meses antes, a abolição da escravidão havia enchido de alegria as ruas e as páginas dos jornais da época, em especial o Diário de Campinas que, dirigido pelo jornalista Alberto Sarmento e seus irmãos, continuava seu trabalho incansável de bradar por justiça social e melhorias para os habitantes de Campinas.

Ainda não se sabia disso, mas neste mesmo ano D.Pedro II e toda sua família seriam expulsos do Brasil para dar lugar à República, sob comando do Marechal Deodoro da Fonseca, nosso primeiro presidente. Aquele, de fato era um ano que prometia novidades.

Um campineiro despontava no horizonte como transformador de seu tempo, Francisco Gliicério, o advogado que se tornara um dos pilares do partido republicano no Brasil.

Mas Campinas naquele tempo ainda nutria um ar provinciano, com verdadeiros descasos com hábitos de higiene precários que podiam ser notados por qualquer pessoa que passasse por aqui.

Por este tempo, já como referência econômica para a Província de São Paulo, a cidade dos cafeicultores empregava traços medievais para os cuidados diários da coletividade.

Os poços de água, por exemplo, não ficavam longe( ficavam bem perto na verdade) dos locais de despejo das latrinas. Os chiqueiros nos quais se criavam porcos, também ficavam muito próximos das águas que serviam às casas.

Foi no verão daquele ano que o ar bucólico e tranquilo da cidade de Campinas começou a mudar. Assim, sem mais explicações, circulou pela cidade a notícia de um ou dois falecimentos ocorridos na rua que hoje chamamos de Campos Sales.

Segundo o dr. Eduardo Guimarães, médico de renome na época, eram casos clássicos de febre amarela.

Deste ponto em diante, prezado leitor, tente imaginar uma cidade em pânico, sem comércio de portas abertas, sem farmácias, sem médicos, sem medicamentos e com pobres passando as mais diversas necessidades.

Aqueles que possuiam mais condições financeiras, trataram de fugir para os arredores onde a praga não os alcançasse.

Em uma população que foi reduzida para cerca de 5 mil pessoas, os cemitérios chegavam a receber até perto de 50 corpos por dia. Tente imaginar isso.

À primeira vista, claro, a disseminação da febre amarela em Campinas deu-se por causa da contaminação da água. Essa era, pelo menos, a avaliação de todos os especialistas da época. Ainda não se sabia que o verdadeiro causador de tanto mal era um mosquito, que transmitia a doença de uma pessoa para outra.

Contam-nos os livros, que verdadeiros heróis se destacaram em Campinas no combate à epidemia que flagelava tanto ricos quanto pobres.

Contam-nos também os livros, que corpos chegaram a ficar insepultos, atraindo ainda mais horrores a quem observasse aquele cenário de dor.

Por vezes, as pessoas eram encontradas falecidas dentro de suas casas, fechadas por dentro, já que os moradores nutriam um medo ferrenho de sair e ter contato com outras pessoas.

Em um momento como esses, levantaram-se grandes homens que despojaram-se de si mesmos em favor de muitos.

Em ocasião oportunda daremos espaço para suas honoráveis memórias.

Por ora, parece ser suficiente se nos atentarmos para a importância da rua Direita. Quer dizer, a rua de Cima.

Era este o nome da rua que hoje chamamos de Barão de Jaguara.

Local privilegiado na cidade, foi no seu entorno que a primeira missa foi rezada, inaugurando nosso município, foi também ali que funcionaram o paço municipal e a cadeia pública.

Em franco estado de morte em nossa cidade, ate mesmo as autoridades fugiram, deixando o povo sem seus protetores. Foi este o caso da maior parte dos médicos e vereadores. Exceção, é claro, de José Paulino Nogueira que ficou e pediu insistentemente ajuda para as demais esferas de administração do país.

E a ajuda veio.

Pelas mãos do então presidente da Província de São Paulo, cargo que hoje chamamos de governador do estado, chegou uma junta de médicos junto com diversos outros recursos.

Antonio Pinheiro de Ulhôa Cintra, investido da autoridade máxima da província fez questão de vir até nossa Campinas e andar pelas ruas da cidade a fim de tomar conhecimento da real situação em que nossos antepassados se encontravam.

Este gesto de cuidado com Campinas, repetiu-se mais uma vez, tendo ele vindo visitar nossa cidade por duas vezes. Ficou pouquíssino tempo no cargo, talvez por isso não tenha vindo mais vezes.

Não fosse Antonio, ou melhor dizendo, o Barão de Jaguara, Campinas talvez nem mesmo existisse atualmente tamanha a força da febre amarela e tão grande foi sua ajuda para debelar este mal.

A justa homenagem que coube ao nosso benemérito ajudador, foi honrá-lo com o nome da rua mais importante para Campinas naquele momento.

Ah, ele era irmão de Delfino Cintra, que também é nome de rua, mas isso é ainda uma outra história.

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