Do que eram feitas as casas de antigamente?

Sidney Rocha
Sidney Rocha
Professor de história e geografia, nascido e criado em Campinas e apaixonado pela cidade. Com uma formação acadêmica complementada pela vivência nos diversos estratos sociais que compõem nossa rica região, gosto de contar histórias que encantem e levem à reflexão em busca de um mundo mais saudável para todos os aspectos da experiência humana. Convido você a acreditar que conhecer os fatos do passado faz parte da nossa jornada pela vida, afinal recordar é viver.

A história de nossa cidade bem pode ser dividida por épocas. Se pensarmos na Campinas do século 18, lá no tempo em que os tropeiros ainda faziam parada para descansar e reabastecer antes de continuar a viagem atrás do ouro de Goiás, vamos ver aqui não muito mais do que um bairro rodeado de mata atlântica e animais silvestres povoando a densa floresta.

Neste contexto, seria de se esperar que as construções fossem feitas ainda da maneira mais primitiva possível, utilizando-se para isso de matéria prima que estivesse à mão e as técnicas conhecidas naquele tempo, como as construções de madeira e as construções de taipa.

Ainda resiste em Campinas pelo menos uma amostra deste tempo, na Antiga sesmaria que deu origem ao Jardim Proença. Cuidadosamente recuperada para ser preservada pelo saudoso Antonio da Costa Santos, permanece ainda de pé uma construção provavelmente feita na última década dos anos 1700(século 18).

O contraste entre essas construções, feitas de barro e sangue de boi misturado à palha e muitas vezes reforçado com madeira trançada ao meio, tudo socado entre duas tábuas e as enormes construções de concreto da atualidade chega a impressionar.

E como teria se dado a transição entre essas duas cidades, esses dois modelos de habitação? Em qual momento e em qual contexto se teria decidido mudar as construções do primitivo pau a pique para os modernos tijolos queimados?

Bem, para entender isso, antes é necessário compreender os contextos do desenvolvimento em Campinas.

A primeira vocação de nossa cidade, como se sabe, foi a produção de cana de açúcar, sucedida pela produção de café. Note-se que na bandeira de nosso município encontram-se ramos destas duas plantas ladeando uma ave mitológica sob um fundo branco.

Já no tempo da produção do açúcar, Campinas localizava-se economicamente como um importante polo produtor na Capitania de São Paulo, fazendo parte inclusive do famoso Quadrilátero do açúcar.

Por esta época, era comum que os senhores de engenho vivessem em suas fazendas, que requeriam muito de sua presença. Vir à cidade era uma aventura necessária para as festas religiosas e para tratar de assuntos dos quais não se poderiam fugir, como as convocações das autoridades, por exemplo. No século XIX, sob os auspícios da produção de café, que segundo Joaquim Correa de Melo começou a ser cultivado de maneira massiva e sistemática nos idos de 1835, a presença do cafeicultor era indispensável na cidade dada a dinâmica própria do comércio cafeeiro. Provas de qualidade, problemas com mão de obra, a periodicidade dos insumos e uma diversidade de particularidades desta nova planta atraiam os cafeicultores para a região do centro da cidade. Era inevitável, portanto que surgissem as construções dos sobrados, que passaram a ornar a região mais central da cidade.

A notícia que se tem do primeiro sobrado de Campinas, nos leva até a esquina das ruas barão de Jaguara e General Osório onde hoje se eleva um alto edifício. Depois, outros sobrados vão aparecendo ainda na primeira metade do século XIX, tudo graças ao café, que obrigava o dono da fazenda a procurar meios de estar mais próximo das notícias, que levavam dias para vir de são paulo até aqui e semanas para chegar do Europa.
Foi neste contexto, de riqueza e urbanização, que os sobrados começaram a ganhar espaço, ainda que com uso de tecnologia bem similar à utilizada no século 18. Desta grande aventura transicional entre o antigo e o moderno, restam poucos exemplos, como a antiga residência do Barão de Itapura, que por muito tempo foi ocupada pela Pontifícia Universidade Católica, a PUCC. Resta também o sobrado que conhecemos como Palácio dos azulejos, que já foi morada do Barão de Ibitinga e sede da prefeitura municipal, hoje sedia o Museu da Imagem e do Som da cidade. O solar do Visconde de Indaiatuba na esquina das ruas barão de Jaguara e General Osório também ostenta ainda a beleza daquela época. Para finalizar nossa lista, falemos também da residência do Barão de Ataliba Nogueira, que resiste ao tempo e passa despercebida por quem frequenta o centro da cidade. Ali, este belo sobrado fica escondido sobre os comércios da rua Campos Sales esquina com Regente Feijó.
A novidade da época ficou por conta da grande invenção : O tijolo.
A primeira olaria de Campinas surgiu em Dezembro de 1867, abrindo espaço para um novo tipo de construção ainda desconhecido por estas paragens. Poucos anos depois, já havia mais de 10 olarias na cidade, prova de que o tijolo agradou aos construtores. Nota-se nestes sobrados, aos poucos, a mudança de um modo de construir para outro, já que é possível encontrar a transição da Taipa de Pilão com suas variações, para o tijolo nas mesmas construções, como é o caso por exemplo do Palácio dos Azulejos.

É ainda do final do século 19 o surgimento das primeiras indústrias de Campinas, a começar pela fábrica dos irmãos Bierrembach, na rua Major Solon e pelas famosas Mac Hard e Lidgerwood, que deram início a uma nova figura transitando pela cidade: A figura do operário. Esses novos personagens na cidade, que não eram escravos, nem libertos, nem cidadãos, nem barões, precisavam de lugares dignos para sua instalação. Eis aí o surgimento dos bairros, cada vez mais afastados da região central.

O restante desta história vai acontecendo aos poucos durante os séculos seguintes, com ocupações cada vez mais intensas até que atingimos a marca de mais de 1 milhão de moradores. E essa cidade, que também não dorme, continua a crescer…

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